quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

O Direito da Criança ao MEDO Parte III

O Direito da Criança ao MEDO. Parte III E outro amigo, esse de velha data, também portador de rara capacidade intelectual, meus amigos são especiais para mim, me indagou sobre uma recomendação que encontrou: “as Crianças não devem sentar no colo do Papai Noel”. E acrescentou a pergunta: Não é um exagero, Ana? Ao que respondi que, lamentavelmente, não é exagero. É muito difícil atribuir ao “bom velhinho” a suspeita de um comportamento deplorável com a Criança. Infelizmente, são numerosos os relatos de adultos que tiveram uma experiência marcada pelo Medo e pela Repulsa daquele “bom velhinho”, que habitava o imaginário infantil. Na lenda ele passava o ano todo fabricando os brinquedos para distribuir no Natal. Um ser de bondade, uma figura paterna que aparece uma vez por ano para dar presentes, concentra a maior fantasia de acolhimento e generosidade. Como pode ser mau? Faz-se necessário esclarecer um pouco o “colo” de alguns Papais Noés. Precisamos ter um olhar mais ingênuo, infantil, de pensar que a roupa faz a pessoa. Alguns homens se aproveitam, exatamente, da roupa para esconder sua perversão e no meio daquela calça larga ocorre uma ereção que toca a Criança. Também ao segurar a Criança, as mãos por baixo e por trás das roupinhas dela tocam partes que não são permitidas aos toques. Essas manobras são vividas por esses homens como um triunfo enorme, porque é o prazer do Poder o que mais os atrai. Ou seja, conseguir em meio à multidão tocar o corpo da Criança, mesmo que seja por segundos, ou ter uma ereção que consegue camuflar na roupa, deixa para ele uma sensação de Absoluto Poder, que é seu maior prazer. Foi a partir da constatação de que esse era um lugar de sonho transformado por alguns em pesadelo para a Criança, que se chegou à determinação para as lojas de um lugar físico para a Criança sentar. Uma poltrona mais larga que deixa o espaço suficiente para a Criança ficar ao lado do bom velhinho, ou o banquinho da Criança, colocado ao lado dele. A prevenção é a proteção para a Criança. Não é todo Papai Noel que é um abusador. Do mesmo jeito que sempre repetimos que não é todo pai que abusa dos seus filhos. Longe disso. Há homens exemplares em suas funções, de pai ou de Papai Noel. Não é o Papai Noel que é mau. É um homem mau que se camufla de Papai Noel. Assim como o homem mau se camufla de treinador de natação, ou de ginástica olímpica, de futebol, de professor, de tio, de avô, de padrasto, de pai. São máscaras que servem de esconderijo para seu desvio de caráter. Quantas vezes nós pais insistimos e até forçamos uma Criança pequena a dar um beijinho, ou sentar no colo de um adulto a quem ela está rejeitando? Em nome de uma pretensa sociabilidade, obrigamos a Criança a ter um contato próximo quando ela, firmemente, se recusa. Não respeitamos a razão da Criança, e, com facilidade, ainda a qualificamos de “bicho do mato”. Algumas Crianças, principalmente, as menores, têm medo da figura do Papai Noel. Choram e tentam se esquivar, mas nem sempre conseguem. Sob o equívoco de que o MEDO tem que ser enfrentado para acabar com ele, com argumentos do tipo “para de ser frouxo, ele é bonzinho”, comete-se o mesmo erro da ordem do “engole o choro”. Crianças são obrigadas por adultos familiares e, depois, por agentes de justiça a conviverem de perto com alguém que lhes causa medo. Precisamos resgatar as boas lembranças da nossa infância, protege-las para que escorram pelo ralo dos malvados, e mantê-las para os pequenos de hoje. O Natal do Papai Noel, da confraternização das famílias, mesmo que haja uma briguinha aqui e outra ali, é a celebração do Amor. Minha irmã, Lúcia, me enviou um vídeo da decoração das ruas e praças de Recife. Lindo! Milhares e milhares de luzinhas, fazendo desenhos, Crianças e adultos por entre aqueles pontos brilhantes em alegria que transborda. E, além de me emocionar, me trouxe as imagens que guardo para sempre da Noite de Natal. Depois das cartinhas para o Papai Noel, entregues em mãos numa loja de departamento, chegava finalmente o grande momento. Éramos 4 filhos e mais o pai e a mãe, só nós morávamos lá. À noite, vestíamos roupas novas, costuradas pela nossa mãe e saíamos para ver as árvores de Natal nas águas dos dois rios que cortam a cidade. Comecei a prestar atenção que sempre acontecia da minha mãe dizer para o meu pai que achava que tinha esquecido alguma janela aberta, pedindo para ele verificar. Ela nos mantinha no portão da casa enquanto ele entrava por alguns minutos e logo voltava. Mesmo feita por lâmpadas comuns, era lindo! Todas aquelas cores brilhando na água dos rios, eu sempre ficava intrigada como não dava choque nos homens que as armavam. As pessoas desconhecidas e alegres desejando Feliz Natal. Depois de algum tempo de passeio, voltávamos. E lá estavam nossos presentes que o nosso Papai Noel deixou no pé de nossa árvore. Cada Criança tem o seu Papai Noel. Ceávamos, e depois fazíamos a música. Minha irmã no piano, minha mãe no violino, meus irmãos e eu cantávamos, meu pai escutava. Músicas de Natal. A todos que me leem, um Feliz Natal de Criança com o compromisso de proporcionar um bom Natal com mais cuidado com os pequenos.

sábado, 16 de dezembro de 2023

O Direito da Criança ao MEDO. Parte II

O Direito da Criança ao MEDO. Parte II “Ana, achei o tema fantástico, então, o MEDO é bom para a Criança?” Recebi essa pergunta de um grande amigo, professor de Geopolítica em Escolas Superiores. Respondi o que vou escrever aqui hoje. O Medo cumpre uma função importante na Formação Humana. Assim, ele não deve ser negado, nem tão pouco incentivado, não deve ser um desafio de enfrentamento a qualquer custo, mas deve ser um instrumento de amadurecimento. É o MEDO que detém a chave do alerta de risco. O ser humano sofreu por 4 angústias primitivas que fizeram com que ele buscasse solução descobrindo o conhecimento. A saber: a angústia da fome, a angústia do frio, a angústia da dor, e a angústia do medo. Esta última é a única que não tem solução. Quando o homem se fixou na terra e descobriu o plantio, ele solucionou a fome. Isso não é uma verdade totalizada porque, até hoje, temos pessoas que vivem, em diferentes pontos do planeta em insegurança alimentar, de leve a severa. Para o frio descobrimos as peles dos animais e, logo a seguir, a arte de tecer fios tirados dessas peles. Também falhamos até hoje ao não conseguir contemplar a todos, alguns muitos ainda morrem de frio, mas as razões são outras, aliás, as mesmas da fome que persiste. A dor teve o benefício da Medicina, da Pesquisa Científica, e hoje até da Ciência Específica intitulada Medicina da Dor, com técnicas de alta precisão. Também não alcança todos, mas, não por ignorância que nos subjuga ao incômodo da dor, e, sim, por inacessibilidade para alguns muitos. No entanto, a angústia do MEDO nós não resolvemos e não iremos resolver. Ele é necessário para o desenvolvimento do sistema de alarme que anuncia o perigo a uma das nossas indispensáveis integridades. Aqui cabe a integridade física que zela pela manutenção da vida, a integridade psicológica que alimenta nossa segurança como pessoa, e nossa afetividade. O medo do estranho que surge em torno dos 6, 8 meses, é o primeiro treinamento que fazemos para não cair em mãos erradas. Crianças que não experimentam esse medo se tornam presas mais vulneráveis ainda para pessoas com intenções perversas. O MEDO parece estar ligado ao sistema límbico, sistema cerebral que é responsável por avaliar e dar respostas de defesa diante de ameaças, as mais variadas. A preservação da vida, em todos os seus níveis, portanto, depende do MEDO, do bom e saudável exercício do MEDO. O sentir MEDO aponta para a capacidade de dimensionar todos os estímulos e todas as experiências que uma Criança tem, desde bebê. Ela vem munida de curiosidade, de impulso explorador do mundo ao seu redor. A Criança é, naturalmente, epistemofílica. E essa busca incessante por conhecimento, do mais básico ao mais abstrato depois da adolescência, a empurra para um explorar e descobrir sem parar. À medida que a Criança vai crescendo e se habilitando em novas competências cognitivas, motoras, linguísticas, o MEDO vai deixando de ser concreto, tangível, e vai se fixando em estímulos, ainda concretos, mas menos perceptivos. Uma Criança que é vítima de violência física desenvolve um sistema de alerta pelo Medo sentido, nem sempre associado à figura daquele que o espanca. Para se defender e cumprir o pacto do silêncio exigido pelo agressor, a Criança desvia da figura principal e toma como objeto fobogênico um detalhe do ambiente, um móvel do ambiente, a luminosidade, um som, ou ruído específico. Agressores de Criança muitas vezes querem manter a aparente impressão de que são pessoas boas, “acima de qualquer suspeita”, empurrando, assim a sua vítima para o conluio com ele, fazendo com que ninguém desconfie de seu verdadeiro perfil de violência. E ter MEDO de seu agressor fica proibido por ele. Forçada a não expressar o MEDO daquele agressor, esse MEDO precisa tomar outros caminhos, se deslocar para outros espaços ou figuras que são difíceis de detectar. Pode também acontecer que a Criança tente se autoconvencer de que não tem MEDO de nada, já que não pode sentir MEDO daquele que a agride. Essa Criança passa a ser forte candidata à Criança de alto risco. São aqueles pequenos que estão sempre machucados, fraturados, porque pulam de alturas que estão acima do que poderiam pular, se jogam em cursos d’água sem saber se a altura permite, se aproximam de adultos estranhos, ou seja, são Crianças que não medem os perigos, pois esvaziam o pote de MEDO saudável, enquanto um organizador do auto sistema de proteção. O MEDO do adulto que não viveu, saudavelmente, essa função protetora, pode aparecer exatamente pegando uma carona no MEDO da Criança. Desfazer da emoção de apreensão e temor que a Criança está sentindo é uma das estratégias dos “grandes” camuflarem seu próprio MEDO. Não reconhecer a vulnerabilidade que precisa de apoio e não de deboche ou negação, é contribuir para um adoecimento que poderia ter deixado de existir. A função do MEDO é protetora, mas também não deve ser utilizada por adultos para mostrar Poder sobre pequenos. Esse é um apelo sempre abraçado pelos fracos, tripudiar em cima de um vulnerável.

sábado, 9 de dezembro de 2023

O Direito da Criança ao MEDO. Parte I

O Direito da Criança ao MEDO. Parte I Aquela frase que vem sendo combatida, “homem não chora, engole o choro!”, não só não tem tido muita eficácia para os meninos, porque o modelo “machão” continua vivo na estrutura da diferença de gênero. Essa é uma escadinha oculta da homofobia. É um caminho escuro, tortuoso nos disfarces, mas que tem por objetivo desvalorizar a emoção, o sentimento, o afeto. Há uma pressão para esfriar afetos, e o choro entra nesse espaço. Por que ter medo da Criança ter medo? A primeira resposta que me ocorre é que ficar perto de uma Criança com medo nos contamina. E acorda nossos medos infantis. O medo é muito importante e necessário à saúde mental e corporal, quando é bem processado. Todos os medos, os referentes a um elemento concreto, ou os medos de situações subjetivas, por vezes fluidas, sem contorno, mas todos imprimem uma parada abruptas porque são recheados de impotência. O objeto do medo, concreto ou abstrato, tem como elemento primeiro a impotência. As fobias, por exemplo de animais pequenos carecem, absolutamente, de qualquer vestígio de lógica. Mas a realidade não consegue se impor diante de uma barata para quem tem fobia desse inseto. A barata não ataca os humanos, não morde, não é peçonhenta, para alguns nojenta, com razão pelo seu modo de vida e sua alimentação, enfim, tem um tamanho ínfimo em relação aos humanos, mas pode causar um pânico com fuga desvairada. Nenhuma lógica, um desvio da função do medo. Sim, o medo tem uma função muito importante no desenvolvimento da Criança. Há uma sequência que contribui para o amadurecimento e, sobretudo para a aprendizagem da preservação da vida. É o medo que dá o alerta para o perigo. No início, o medo de perder a mãe quando ela sai de seu campo de visão, é logo acompanhado do medo do estranho, seguido do medo de espaços grandes vazios, depois de animais pequenos. Na sequência aparece o medo dos grandes animais. Cada um deles deixa, gradualmente, como resultado, uma segurança em relação a lidar com aquilo que está ameaçando. No entanto, é preciso respeitar o tempo necessário à Criança para, e querer que a Criança “perca o medo” por uma exposição “curativa”. Ou seja, não se “cura” um medo de água jogando a Criança numa piscina. Não se “cura” um medo de barata, trancando a pessoa num espaço cheio de baratas. Este tipo de estratégia, alimentada de crueldade e sadismo, só potencializa o trauma existente. A exposição a um objeto fobogênico promove o aprofundamento da dor psíquica da impotência opressora. E, quanto mais nova é a pessoa, mais nocivo é. A Criança não deve ser exposta ao que tem medo sob pena de danificar sua mente ainda em desenvolvimento e, assim, trazer danos permanentes à sua formação. Enquanto ser em desenvolvimento, a Criança dispõe de poucos recursos mentais, em estado ainda de precariedade, portanto, o estrago de uma exposição é uma revitimização com todas as consequências que dela advêm. Não tem cabimento o que tem sido feito com Crianças que, em consequência de uma denúncia de inadequação, maus tratos, ou abusos sexuais que ela, a Criança, apontou seu genitor, passam a ser obrigadas a conviver com essa pessoa que as agrediu sem que seu tempo de regeneração psíquica seja respeitado. Obrigar, judicialmente, uma Criança a gostar de seu agressor é atroz. Dirão alguns defensores de afirmações, totalmente, improváveis, “mas a Criança mente, mente, mente”, e as mães são “inconformadas com a separação”. O que vemos todos os dias é que homens, inconformados com o término do relacionamento cometem Feminicídios. São 4 por dia. E a Criança tem a falta de filtro na sinceridade, na verdade que fala. Sua espontaneidade é incontestável. Para escapar da bronca e da decepção ou de ouvir aquela frase “fiquei triste”, ela nega que pegou o chocolate mesmo que a boca esteja lambuzada. Negar, sim, mentir, não. Além disso, vou me repetir, sua cognição durante a infância até os 11 anos, só se processa em raciocínio concreto. Sua memória necessita da EXPERIÊNCIA para armazenar. Dizer que ela está mentindo ou, ainda pior, que ela está repetindo o que foi implantado pela mãe “alienadora”, (de alta periculosidade?), para soltar a falácia das falsas memórias, é menosprezar nossa capacidade de raciocínio, já ampliada, incluindo as abstrações que completam o pensamento hipotético dedutivo, o pensamento lógico que segue critérios científicos, considerando, também, a experiência da vivência. É, no mínimo, primitivo querer que alguém tenha um bom afeto por alguém que praticou violência física ou sexual. Mas a alegada violência psicológica, argumento que tenta apoiar a pseudo tese de alienação, essa é penalizada a ferro e fogo. Como obrigar a gostar de quem tem medo? E, ainda, por onde passa a lógica de que ralando bastante uma ferida você vai recuperar o tecido danificado? Ralando a Criança no seu medo, que ela sente desse genitor, ela vai passar amá-lo, trocando medo por amor. Magicamente?

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

A Responsabilidade dos pais com filhos, observando passarinhos e humanos. Parte V.

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte V Aumento de 250% nas taxas de Feminicídio em Brasília! Os índices de violência contra a Mulher, em todas as suas formas, todos, crescem. As campanhas estão ativas. Denuncie, denuncie, denuncie. Mas sabemos que há uma importante subnotificação por motivos em torno do ciclo da opressão. Medo, constrangimento, vergonha social, dependência afetiva, dependência financeira, encarceramento em promessas de melhoria do agressor. São muitos os motivos da não denúncia. Hoje, acrescentamos mais uma: a trama da lei de alienação parental. Quando a denúncia se refere a abusos sexuais, o medo ressurge. Medo de perder a guarda do filho. Pode parecer distante, mas a lei de alienação parental é a melhor blindagem para os crimes de abusos sexuais incestuosos. Essa foi uma instrução dada pelo inventor desse termo, Gardner. Como ele era defensor da Pedofilia, que entendia como benéfica à Criança, Gardner embasou a lei de alienação parental, usada, em sua melhor eficiência, como o primeiro e único argumento circular nos casos de denúncias. É uma lei tipo “lei testosterona”, a voz de hormônio masculino é o suficiente para pregar a tarja preta de “alienadora”, não carece de comprovação, mesmo sendo um termo não científico. Arraigado, firmemente, na mente de um enorme número de pessoas, que se iludem com a frase do lobby que espalhou com o propósito de dogmatizar um termo que não tem existência científica nem clínica. Mas segue com um dogma. No midiático caso de uma apresentadora de televisão, muito conhecida pela função de denunciar e publicar casos de violência contra a mulher, já se pronuncia o termo alienação parental. Cumprindo seu objetivo escrito por seu inventor Gardner, a lei de alienação parental já está sendo alegada como defesa daquele que está sendo apontado como agressor. Lançam-se dúvidas sobre a vítima que divulgava vítimas do mesmo tipo de violência. O filho de 9 anos não foi poupado, como acontece sempre. Se a violência é doméstica, ela ocorre, claro, dentro de casa, portanto, em meio às Crianças, que têm assistido, inclusive, a Feminicídios de suas mães. Seria preciso que se estudasse, ou pelo menos, se contasse, estatisticamente, a quantidade e a qualidade dos Maternicídios, (termo cunhado por Hélia Braga, com precisão). Quantas Crianças presenciaram o assassinato de suas mães, de que idade eram na ocasião do Feminicídio, o que foi feito dessas Crianças? Será que o Estado se responsabilizou por elas? Pergunta sem resposta, eu sei. Não penso numa pensão, essa indispensável, mas do cuidado, que se faz com o acompanhamento responsável, a prestação de serviços básicos e fundamentais para que seu desenvolvimento seja menos prejudicado. A despeito de arbitrariedades de “sentenças” induzidas por perícias que determinam a mães que denunciaram abusos intrafamiliares, tratamentos psicológicos e psiquiátricos, com ingestão até de medicação controlada, compulsórios. Sim, é compulsório, e ainda com controle de Relatórios Periódicos dos profissionais que se submetem a essa violação, está garantido por Lei que a pessoa tem que permitir qualquer tratamento que lhe seja oferecido. Assim, podemos observar a violação sumária da Lei dessa garantia de autorização de tratamentos. Mas não há nenhuma iniciativa para se praticar, efetivamente, a Responsabilização após a falha e falência do exercício da cidadania. Mãe morta, genitor matador dela preso, e filhos desamparados. Quando são entregues a algum familiar, não há orientação para esse acolhimento que carregará sempre a mágoa do assassinato, um potencial de revitimização das Crianças. Hoje, um homem invadiu a casa da mãe da mulher que ali foi procurar abrigo, e atirou nela enquanto amamentava o filho bebê. Mãe amamentando, Criança mamando aconchegada. E tiros que encerram para sempre essa relação. Essa Criança, como vai sobreviver? Mas a culpa é da mulher. Temos casos em que Peritas afirmam que a culpa do Feminicídio, do Maternicídio, era dela porque ela praticava alienação parental e isso perturbou o genitor. Ele só perdeu a cabeça. Só. O pedido de divórcio embasado na Lei Maria da Penha, posto que houve uma agressão física constatada em Exame de Corpo de Delito, foi negado. Interpretada como uma “animosidade” que surgiu entre o casal, a violência sumiu, o crime foi reduzido. E esvaziado em sua efetividade. Assim foi o entendimento, com encaminhamento do processo à Vara de Família. Possivelmente, acreditando numa mediação, não possível, para se tornar uma reconciliação de retorno à família margarina. Enquanto isso, a Mãe que ainda não foi morta no corpo, recebe a instrução do advogado: não pode chorar, incomoda a juíza. Ninguém quer saber ali naquela sala que há 3 anos ela não vê o filho, perdeu a guarda 2 meses depois que denunciou os abusos sexuais perpetrados pelo genitor. E que isso dói muito. Reivindicando uma “visitação”, é possível que consiga um regime de 2 vezes por mês, por algumas horas. Mas não poderá ficar sozinha com a Criança por nem 1 só minuto, dando a impressão de uma altíssima periculosidade. Será que vai trucida-lo em alguns minutos? Assisti ao enaltecimento de uma seita, que é divulgada como curativa, até, de doenças mentais permanentes. Um castelo de mentiras. De verdade, encontrei de novo com a D. Luci, aquela senhora que vende canetinhas nas calçadas. Comprei outra caneta e um remédio para ela. Somos responsáveis pela D. Luci, puxando aquele carrinho de feira pesado, pelo bebê que teve a mamada interrompida por tiros que mataram a sua mãe, pelas Crianças entregues a seus abusadores, pela mãe espancada que começou a subir seu calvário no risco de perder a guarda do filho, já anunciada, somos responsáveis como pais com filhos.

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte IV. Os pequenos passarinhos são agora adolescentes. Um deles se foi, o outro volta com a mãe para visitar a antiga moradia, chegam a se aconchegar no ninho, aproveitando para comer um pouco da comidinha que passamos a deixar num lugar protegido, depois vão. A mãe, apesar do filhote estar quase de seu tamanho, continua a ter a atitude protetora e cuidadosa com o filho. Avisa de pronto para que voe para mais longe se algum barulho ou ameaça acontece. Chama a minha atenção uma cena de selvageria na TV. Antes de começar um jogo, cercado por uma rivalidade que já ultrapassou, há muito, a competição esportiva, homens se espancam movidos pela cor da camisa do outro. Por alguns minutos, essa barbárie corre solta, quando chegam agentes da instituição que deveria garantir a segurança de todas as “camisas”, e tentam tomar o protagonismo. Sem nenhum plano de contenção da multidão já enfurecida, batem forte com seus cacetetes, esses legalizados. Mas, eis que surgem Crianças. Muitas. Vi até um bebê de colo, portando apena a sua fraldinha, e me pergunto atônita com a imagem do bebê: o que ele está fazendo ali naquela hora da noite? Por que não está dormindo no seu bercinho? Muitas razões podem ser levantadas, mas ele não vai gostar mais nem menos de futebol por ter ido “assistir” esse jogo quente em vários sentidos. As emoções sentidas pela sua mãe, pelo seu pai, pelas pessoas do entorno, pelas 70 mil pessoas que lotavam o estádio, não podem ainda ser bem processadas por ele. Com seus 9 ou 10 meses, era o que aparentava, o grito da torcida de um ou de outro time, baterá forte em intensas vibrações no seu estômago. Tenho certeza que aquela mãe e aquele pai, não têm a menor ideia do que estão oferecendo para seu filho. A escolaridade é cada vez mais precária. A escola é falha e fraca. Não ensina a estudar, ensina a fazer prova. Não provoca a curiosidade sobre o conhecimento, as telinhas vêm substituindo os livros. É cada vez mais frequente ouvir “tinha trago” ou “tinha chego” ferindo os ouvidos. Na linguagem oral não tem o famoso corretor do google, que também pode mudar uma palavra por conta própria, desvirtuando a linha de pensamento. Não sei se igual ou pior, há um roubo semântico e um roubo de ideias e argumentos. Pessoas vão perdendo o escrúpulo e invertem um detalhe lhe surrupiando o que você fala e, com as mesmas palavras ou conceitos, dizem o exato contrário. Essa semana vi alguém que reina nas acusações de alienação parental, “explicar’ que a apresentadora que sofreu violência doméstica na presença do filho criança, era mesmo violência e não era alienação parental. Será esse um indício que esse termo vai cair mesmo? A Violência Doméstica praticada pelo genitor contra a mãe, acontece na presença das Crianças em bem mais da metade dos casos. O Feminicídio também é assistido pelas Crianças. Há alguns anos tivemos um caso emblemático. A Juíza assassinada pelo ex marido, genitor das 3 filhas que estavam junto e tentaram proteger a mãe das 16 facadas desferidas por ele. Claro que as Crianças assistem a essa barbaridade. E isso é violência contra a Criança. Dói nela muito. Vendo ao vivo, ou vendo a mãe com o olho roxo e chorando de dor nas costelas, e assim permanecendo por alguns dias, a Criança foi espancada também. Não existe um único corpo que abriga um marido violento e um pai ótimo. Bater na mãe é bater na família. É só raciocinar se colocando no lugar da Criança em toda a sua vulnerabilidade. E a Escola segue fazendo falta. Políticas diminuem o conteúdo para camuflar a falência da proposta pedagógica. Os professores são desautorizados e desvalorizados. Cresce na adolescência, a delinquência familiar e de pequeno âmbito que, hoje, se ganhar um minuto na internet, muda de dimensão, assumindo tamanhos gigantescos e permanentes, quando destrói as meninas. Esse é o ensaio geral que praticam nas escolas para a escalada de violência da vida adulta. Nas Políticas Públicas, onde o seu contraponto não existe na sua frente, vemos a barbárie em todas os lugares sociais. A violência contra a Mulher/Mãe se tornou muito sofisticada. Formas novas e distantes dos espancamentos ao corpo, hoje é a alma que é espancada. Coagida, intimidada, acuada, a Mãe/Mulher é oprimida ao proteger seu filho. Os influenciadores e influenciadoras, são motivo de orgulho e exposição de seus seguidores e seguidoras, as antigas chamadas de “maria vai com as outras”, servindo também para o masculino. O fanatismo, substantivo relativo à figura de fã, não tem limite. E, muitas vezes, é só um pequeno passo que é dado para trocar um roqueiro ou uma cantora pop para dar continuidade ao fanatismo em outra esfera. Um “chefe”, um guru, surge e passa a dominar aquele adolescente. Hoje vi das nuvens aquelas imagens que modificam, plasticamente, a realidade do chão. Primeiro, uma colcha de retalhos formada pelos telhados das comunidades. E, a seguir, as formas geométricas de uma grande variedade de verdes. Fui convidada pelo CNS para participar de uma Reunião de grupos de trabalho sobre um termo de psico- ciência. Voz isolada em meio a tantas maravilhas ditas sobre essa seita, praticada no SUS, e em outros lugares que sobram para os habitantes da colcha de retalhos, percebi que no silêncio das pessoas que estavam ali, havia um interesse que foi se desenhando e se pronunciou em perguntas e comentários lúcidos. Consistente o suficiente em meio a esse onda de mentiras teóricas e mentiras afetivas. Seita aplicada em Mulheres/Mães que são submetidas sob mais uma forma sofisticada de violência. A Revitimização com humilhação, em postura exigida de submissão pois seu inventor afirmava que a mulher é subalterna ao homem, é negada. E a Criança está ali. Assiste, sofre, ou cria uma casca para não sentir a dor da mãe. E, lhe resta no processo da identificação, que faz parte de seu desenvolvimento, uma escolha adoecedora: se identificar com a mãe e instalar o aparato do oprimido para a vida dele, ou se identificar com o agressor, minimizar a dor da Mãe, e trilhar o caminho do opressor. Afinal, essa situação traumática continuada não lhe deixa a liberdade de construir seu próprio caminha. Impregnado pela ausência de Responsabilidade Parental, do genitor que agride, da Mãe que não reage, iludida pela ideia de que assim seria melhor para o filho. Será?

terça-feira, 21 de novembro de 2023

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte III.

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte III E os dois filhotes criaram penas e se arriscaram a pequenos voos, sob o olhar da mãe passarinha. Começaram por explorar o jardim do entorno, e, no dia seguinte, o ninho foi deixado para trás pela família. Mãe e pai, mesmo sem ter a consciência de suas responsabilidades, cumpriram com qualidade a determinação da Natureza. A mãe passarinha cuidou com compromisso dos dois ovinhos que se tornaram dois passarinhos. Voaram. A última imagem que tenho deles é em cima do aparelho de ar condicionado, o pequeno ainda ensaiando o bater as asas e a mãe ao lado. O ninho ficou vazio, mas repleto da história de dois vulneráveis que receberam um cuidado exemplar. E conquistaram a boa autonomia. A simplicidade da vida dos passarinhos é invejável. A eficiência dos cuidados maternos e da proteção paterna, também invejáveis. Somos confrontados com uma questão: por que uma dita evolução traz tanto retrocesso? Por que nós humanos temos a capacidade da crueldade com nossos filhotes? A guerra no oriente, uma das 19 guerras que acontecem atualmente, está matando com tanta perversidade Crianças. E nossa voz não é escutada. Matamos com bombas e tiros, por aqui quase todos os dias, e matamos com a fome, a sede, o desamparo, até então, inimaginável. Mas também matamos quando não conseguimos garantir uma convivência saudável dentro de nossas casas. O conceito de saudável inscrito no Artigo 227 da Constituição Federal, aqui como lá, abrange a vivência do respeito ao outro, a vivência da solidariedade, a vivência de uma organização social, para proporcionar a condição necessária à vivência afetiva. No entanto, o que encontramos é o desrespeito a regras básicas e fundamentais de convivência. Crianças não vão à guerra, não podem ser alvos de bombardeios e crimes de guerra, assim como crianças/adolescentes não podem “matar” colegas pela internet. Ninguém desconfiou que divulgar adulterar e divulgar imagens desnudas de colegas, não pode. Como nas situações de bullying, omissos se alinharam com os autores, e, não fosse, um único menino discordar e levar ao conhecimento de alguns adultos, possivelmente, essas meninas nuas estariam circulando até agora. Algumas coisas já foram faladas. O Pediatra dr. Daniel Becker se pronunciou de maneira precisa. Mas gostaria de acrescentar à sua fala, que concordo, que aponta para a necessidade dos pais fiscalizarem o uso da internet pelos seus filhos, e sugere o uso de ferramentas virtuais limitantes. Ele lembra com toda a pertinência que a responsabilização criminal recai sobre os pais dos meninos infratores. Contudo, quero me debruçar sobre os meninos infratores. Neste episódio eles evidenciaram pontos importantes e lamentáveis. Derrubaram o mito de que a pobreza ou a negritude geram infratores. Esse é um mito que, por vezes, tenta, com sucesso, obscurecer as razões mais profundas da tendência à delinquência. Nasce aqui uma pretensa “justificativa” para o uso da violência contra essas Crianças e Adolescentes. E, vale lembrar que os pais deveriam se dedicar ao convívio saudável que prevê conversas, parcerias, discussões, cuidados entre filhos e pais. E sabemos que os pais, exceto os que exercem a profissão de T.I., vão sempre ficar atrás dos filhos no novo da tecnologia. Devemos olhar mais para o antes. A fiscalização é a posteriori. Já foi. Mas, o crime de divulgação de nus de meninas mediante uso da inteligência artificial, não veio de nenhuma comunidade, não veio de um grupo em vulnerabilidade social. O grupo que praticou esse crime é um grupo em vulnerabilidade de caráter. Talvez, não possamos usar o conceito de vulnerabilidade porque vemos mais o conceito de ausência de caráter. Não há vestígio de algum código de Ética, ou código moral, ou algum traço de Empatia. Muito me preocupa um foco desse tipo em meio a uma comunidade bem desenvolvida, com boa cognição, com capacidade e curiosidade tecnológica, mas zerado de princípios. Poderíamos pensar que são adolescentes que, mesmo morando em condomínios e mansões, bem instalados, foram abandonados no ambiente intrafamiliar. Quantas vezes vemos Crianças bem pequenas que, incomodando o ambiente, ganham o celular da mãe ou do pai para brincar. E ainda são tidos como quase “gênios” porque deslizam o dedinho na tela, quando estão no tempo de desenvolver a habilidade motora da preensão do lápis pela oposição do polegar ao indicador. Essa habilidade lhe permitir segurar o lápis para a alfabetização e depois para a escrita, para segurar o pincel e produzir arte, para segurar o bisturi e a agulha para tratar uma doença. Estamos falhando enquanto sociedade. O imediatismo, que foi muito aguçado pela presteza da internet, a aparente facilidade do ponto de vista raso, todos passaram a “saber” tudo sem nenhum esforço, sem estudar, sem ler um só livro, e o conversar se evaporou. Não precisa nem comentar sobre isso. Não é raro que filhos mandem mensagens para a mãe, quando ambos estão dentro de casa. As emoções, os sentimentos, os afetos, saíram de cena porque é tudo rapidinho e superficial. Nesse esgarçamento afetivo do núcleo familiar, não cabem princípios, valores, reflexões. Durante meu desenvolvimento, minha mãe e meu pai sempre criticaram o se deixar influenciar por outra pessoa, estimulando minhas próprias posições e convicções. Não sei bem como, mas abrimos um espaço para figuras que ganharam o título de “influencers”. E fizeram dessa postura virtual uma profissão, até mesmo remunerada. Ser influenciado agora é algo aceito, naturalmente, pela sociedade. A influenciadora, e o influenciador, não precisam ter estudado, ter um conhecimento consistente. São fábricas de opiniões monetizadas. Esses meninos são responsáveis pelo que fizeram. Seus pais são responsáveis pelo que esses meninos fizeram. Mas todos nós somos responsáveis pela descoloração do conceito de verdade, pela depreciação do afeto, pela propagação da mentira com pinceladas de maquiagem. Desde quando deixamos de enxergar “o que não pode” para não ter trabalho. É mais fácil dar um celular nas mãozinhas do pequeno e se iludir falando que o filho é um gênio porque desliza um dedinho e olha as imagens corridas. A compreensão e o pensamento não importam. Vulneráveis são presas fáceis. Os meninos do colégio religioso famoso ficaram na esquina entre vítimas e algozes. Penso que estamos usando nossos vulneráveis para exalar violência em formas cada vez mais sofisticadas. A vulnerabilidade negada, é a violência naturalizada. A família de passarinhos do jardim do meu trabalho me deixou duas lições: uma sobre a importância da qualidade do cuidado com os pequenos, e outra, que podemos voar sem saber para onde, mas com suas próprias asas, sem seguir as “instruções” de um influencer.

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte II

A responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte II. Nos raros momentos em que a mamãe passarinho voa para se alimentar, já é possível ver que os ovinhos, 2 ou 3, já deram início aos filhotes. Ainda sem plumagem, estátuas, aconchegados um ao outro, ou aos outros, não dá para saber se são dois ou três, apenas um, hoje, conseguiu abrir os olhos. Mas, imóveis, recebiam a cobertor da mãe imóvel também, por quase todo o tempo. Estou descrevendo o que venho acompanhando no ninho de passarinhos que foi construído, magistralmente, no jardim do meu trabalho. E, enquanto testemunho, um privilégio, as leis da Natureza serem seguidas, mesmo que intemperes do clima, chuvas fortes, rajadas de ventos, calor acima da média, tenham assolado aquela aparente frágil moradia, nada mudou o curso daqueles filhotes e pais passarinhos. Pais que assumiram a responsabilidade da proteção de seus filhos. Enquanto isso, nossos filhos são assassinados em mais uma estúpida guerra. São 19 guerras que acontecem no mundo hoje. A quem interessa? As narrativas buscam “justificativas” torpes como sendo por um deus, ou por um território, como se algum deus se interessasse por uma supremacia que pisa em cadáveres. E agora, preferencialmente, em cadáveres de Crianças. Não é desumano matar, mutilar e soterrar Crianças. Estamos diante e vivendo uma crise de barbarismo que mesmo os quadrúpedes ou pássaros não promovem. Essa é uma barbárie sub-animal. Imagens grotescas circulam com atrocidades contra Crianças. Fake News? Pode ser, mas só o fato de montar a atrocidade fake, já é uma barbárie pela intenção de uma manipulação em massa, usando a imagem de uma Criança. Mas, para além da mentira, que venceu a verdade relativizada nos nossos dias, as Crianças estão sendo alvo de uma violência nunca antes vista depois da história de Herodes. Desarruma a mente assistir um vídeo de um grupo de Crianças, com um porta-voz que lê um papel pedindo para viver. Talvez pudéssemos substituir aquele porta-voz palestino/israelense, por uma Criança ucraniana, ou por uma Criança Yanomami, ou por uma Criança de uma favela do Rio de Janeiro, ou por uma Criança da Etiópia ou da Somália. Essas outras Crianças, atualmente, não têm Voz. A mídia escolhe um só grupo. Talvez porque nossa mente não esteja preparada para suportar todas essas dores dos sofrimentos de Crianças. E, ainda, se incluirmos a violência sexual e a violência física, ambas do âmbito familiar, o excesso faz com que os agressores sejam beneficiados porque ficam subnotificadas e subfaladas. A Vulnerabilidade do Ser Criança parece funcionar como um ímã para os gananciosos por Poder. Criança não consegue se defender de violências ferozes, sendo, portanto, presa fácil para quem busca o prazer do triunfo pela opressão de um frágil. É da nossa Responsabilidade a Proteção Integral de TODAS as Crianças. Enquanto sociedade, somos pai e mãe não só de nossos filhos biológicos e afetivos, como de cada Criança que está nessa guerra alimentada por ódios mútuos seculares e injustificáveis, que são patrocinados por interesses financeiros, e resultando em no eixo opressor x oprimido. Medir força e Poder usando Crianças é, além de tudo, vergonhoso. Ou deveria ser. Lamentavelmente, as Crianças abatidas parecem se tornar uma espécie de medida de Força e Poder: pequenos cadáveres a metro. Pela sua condição de Vulnerabilidade, Criança não pode ser soldado nem escudo, Criança não pode ser a medida que atribui o vencedor de uma guerra, Criança não pode ser explorada para o trabalho lícito, menos ainda para o ilícito, Criança não pode ser explorada sexualmente, Criança não pode ser mãe. Criança não pode ser torturada. E a guerra é um estado de tortura continuada. Criança não pode participar da morte da família por causa de uma bomba, assim como não pode assistir o espancamento ou o Feminicídio da mãe pelo genitor. Criança não pode dar uma coletiva de imprensa pedindo para que seja permitida a vida para ela. Onde estamos? Por que os passarinhos conseguem proteger seus filhotes e nós, humanos, não conseguimos. Se avançamos em conhecimento, não melhoramos no que deveria ser a nossa humanicidade. E seguimos destruindo até mesmo os nossos próprios avanços de saberes diversos. Recentemente, um grupo de meninos, alunos de um colégio conceituado em ensino e valores religiosos, fez uso de uma ferramenta da inteligência artificial para exibir o machismo, a misoginia, o preconceito, a depredação de meninas, colegas, sem nenhum limite de alguma razoabilidade. Gostaria de voltar a esse tema na próxima semana porque discordo da culpabilização dos pais dos infratores. Sabemos que muitos não tomam conta da vida tecnológica paralela de seus filhos, dá muito trabalho, mas precisamos refletir sobre a nossa falha enquanto pais de todos, enquanto sociedade que já não cultiva a verdade, as regras e os valores sociais, os compromissos afetivos. Somos todos responsáveis por mais esse desastre da humanicidade.

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

A Responsabilidade dos Pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte I

A responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte I No meu local de trabalho, tenho um jardim. Muito verde, flores, orquídeas e três pés de jabuticaba. Num deles, por cima de um tufo de uma mini orquídea, foi construído um ninho. Um lar. Esse é um espaço frequentado por seres da Natureza. E o casal trabalhou duro por um dia, gravetos grandes pendurados, em seus bicos pequenos, foram sendo tecidos como se uma concha frágil se equilibrasse naquela bifurcação de galhos da jabuticabeira. Incansáveis, os dois, prepararam o ninho. Ela botou os ovos, não sei se 2 ou 3, e ficou ali, chocando, parecendo uma estátua. Dias e dias, talvez 7 ou 9, e aquela mãe não saía, fazia sol ou fazia chuva, ela permanecia aquecendo seus ovinhos. O pai aparecia e por algumas vezes revezava com ela que voava, certamente para se alimentar. O pai mais arisco, a mãe mais acostumada com nossas olhadas pelo vidro da porta de acesso. Em todos esses dias, só hoje consegui capturar uma foto que tirei de longe quando os pais estavam trocando de turno. Se eu trabalho com conteúdos psicológicos e corporais tão dolorosos e sofridos, em recipiente mental dos piores conteúdos de perversidade dos causadores dessas dores, aquela mãe e aquele pai que voam e que têm um sistema nervoso dos mais simples e rudimentares, me despertaram para uma indagação. Acompanho Crianças e Adolescentes, irresponsavelmente, agredidos por seus pais e mães. Como pode ser que dois passarinhos que não foram à escola, que ninguém lhes disse como deveriam fazer quando chegasse o tempo da Responsabilidade Parental, e todo o processo fosse cumprido? Aquele pai passarinho não abandona a família porque nasceu um filho com microcefalia. Entre os humanos, cerca de 69% abandonou o filho, a filha portador de microcefalia por sequela do Zika Vírus. Aquela mãe passarinha não abandona seu filhote porque a chuva está forte. Eles não estão submetidos a nenhum sistema judiciário, não há punição porque não há transgressão. Talvez esteja parecendo que estou simplificando e vendo o comportamento de humanos como passíveis de um olhar comparativo com o comportamento de passarinhos. Afinal, somos animais superiores. Somos mesmo? Para que serve todo esse aparato intelectual, resultante de milhões e milhões de sinapses? Para que serve o Conhecimento acumulado, de todas as Ciências, se o simples não faz parte do repertório de conduta social? Aliás, as Ciências estão sendo cada vez mais utilizadas para o “aprimoramento de precisões” de alvos, sempre os vulneráveis. O casal de passarinhos nem sabe que está praticando uma lei da Natureza, recepcionando a vida. Não sabem que são pais e filhos, mas cumprem plenamente essas funções com a melhor qualidade. E nós, humanos, perdemos cada vez mais a capacidade de sentir Empatia pelo outro. Enquanto eles garantem a PROTEÇÃO de seus filhotes, sem necessitar de leis nem fiscais, estamos a assassinar os nossos com a estupidez de 19 guerras, que ocorrem no momento atual. E escolhemos a última da vez para fazer posições de torcidas de times que passam a usar a violência criticada de lá para aplica-la aqui, uns contra os outros. São as Crianças as protagonistas do número de cadáveres. Se a guerra, com toda a sua estupidez, ocupa o espaço midiático, a Paz, mesmo que pronunciada todo o tempo, parece que fica para depois. Um depois que carregará uma falha na população pelos assassinatos das Crianças. Mas, da mesma maneira que o convencimento dos riscos de danos ao planeta, causados, por exemplo, pelos plásticos nos mares, ou os desmatamentos e as queimadas, não são acreditados como responsáveis pelos fenômenos climáticos extremos, o ambiente intrafamiliar, muitas vezes, fica longe do ninho dos passarinhos do outro lado do vidro da porta do jardim. O lar dos humanos, ao contrário do que a mídia propaga, pode ser o lugar mais perigoso para Mulheres e Crianças. Pelo Dossiê Mulher os números alarmantes de Feminicídio, tivemos em 2022, no Estado do Rio de Janeiro, 125 mil mulheres que sofreram algum tipo de violência: 14 por hora! E, 82% dos agressores: companheiros ou ex-companheiros. Não é difícil entender que 17 Crianças assistiram o Feminicídio da Mãe, entre as 11 Mulheres que foram vítimas desse crime. Não podemos esquecer que é comprovada a subnotificação desse crime doméstico e familiar. E o crime é continuado quando surge o “mito”, totalmente infundado, de que um homem pode ser “um péssimo marido, mas um ótimo pai”. Isso cai no absurdo de imaginar que uma mesma pessoa pode ter dois pedaços antagônicos, considerando que a Criança é uma idiota e não sofre com as dores da mãe. Além do que, esse é um estímulo à identificação com o agressor que é a única saída para a Criança. Talvez estejamos precisando voltar à simplicidade, e aprender com os passarinhos. Resgatar Princípios e Valores que já foram óbvios e hoje sumiram em meio a qualquer jogo de palavras que tentam justificar a barbárie.

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Amor de Vó!

Amor de vó! Amor de vó? Amor de vô! Neto é a única coisa na vida que começa ótima e cada dia fica melhor! Para a avó, o neto é a oportunidade de fazer uma nova edição revisada da maternagem. Isso também é válido para o avô, que pode reeditar a sua função de pai. A dose de responsabilidade é menor do que foi na maternidade, e na paternidade, mas continua existindo, mesmo assim. É preciso dar limites, é preciso dar cuidados de qualidade, é preciso, sobretudo, amar. Se a responsabilidade diminui, a paciência aumenta muito. É possível esperar para que aquele neto gaste muitos minutos para recolher uma folhinha no chão que ele quer oferecer para a vovó, como se fosse um buquê de lindas rosas. Ou esperar pelas brincadeiras com seus bichinhos num banho que, por ele, não precisava ter fim. Ou atender os pedidos seguidos de repetir a mesma brincadeira do vô que provoca aquela gargalhada gostosa. E o avô repete, pacientemente. Quantas vezes os avós escutam aquela reclamação, “comigo você não deixava”, ou “comigo não era mole assim”. Os excessos de exigências dos pais com os filhos correm por conta de uma fantasia que vão acertar em tudo, que vão ter filhos exemplares. Não há lugar para os pequenos erros, as pequenas falhas, tão necessários para que os filhos queiram se tornar pais para “corrigir” essas falhas. Uma mãe ou um pai perfeitos não deixariam o espaço para os filhos terem o desejo de ser mãe ou pai. Muito movidos pela ilusão de que não vão falhar como seus pais, conseguimos nos tornar pais, repetindo muito mais do que havíamos projetado. Repetimos as falhas com pequenos ajustes, e isso é saudável também, porque é o possível. Apesar do estigma de que avó e avô estragam os netos, há um espaço que se inicia e que reconhece a função importante da função avoenga. Faz-se necessário entender que uma dose de um certo afrouxamento de alguma regra, deve ser vista como um estímulo para a Criança lidar com diferenças, com sistemas que têm pequenas diferenças de uma maneira enriquecedora, se for afastada, claro, a competição entre as duas gerações. A Criança, pode lançar essa pegadinha, “você é minha mãe, mas minha avó é sua mãe, ela é que manda mais”, tentando alguma vantagem na crença de que a avó é mais mole na disciplina, como é mais comum. Se para os pais dos pais surge essa possibilidade de reeditar o laço afetivo primário, o fundamental, para a Criança, a presença e o afeto da avó e do avô é o atestado que aquela vó, aquele vô são as pessoas mais confiáveis no mundo e competentes, porquanto eles criaram sua mãe ou seu pai. Isso traz uma carga de esperança e confiança para os netos, pois, afinal, vale a pena vivenciar esse afeto de outro patamar de maturidade. Essa escala de tempo que vem de um passado inacessível à Criança, quando seu pai e sua mãe foram Crianças, é possível apreciar, mesmo que sem saber direito que está apreciando, a linha do tempo de gerações sucessivas. O tempo é uma noção de difícil aquisição para a Criança. Não é concreta, como ela necessita na infância, para que ela consiga formatar uma noção de antes e depois, de dimensão temporal para se localizar nesse tempo, esse elemento tão fluido. Todos já ouvimos aquela Criança, na fase que está tentando aprender os advérbios de tempo, relatar “amanhã eu fui no cinema com a mamãe”. O tempo é difícil. Ontem, fui arrebatada por um novo neto. Que sentimento forte, que afeto direto. Aquela pessoa, nasceu grande, mas é pequeno, e já é uma pessoa, que se entrega no meu colo e dorme tranquilo. Essa dependência absoluta, que deve ser tratada com responsabilidade, igualmente, absoluta suscita um enternecimento de difícil tradução. É sentida, não falada. Nunca. As palavras corrompem os afetos puros. Vó coruja? Com orgulho. Vi esse pequeno adormecer e viver sensações que arrisco afirmar, eram sensações e expressões de sonhos. Eram sorrisos acompanhados de suspiros que relaxavam a expressão do rosto, e se seguiam de novos sorrisos. Se tinham essa conotação ou se seriam interpretados por alguns como movimentos faciais espasmódicos, a mim, pouco importa. Afirmo que estava sonhando com o que nunca saberemos, e sorrindo. A satisfação era inegável. Todas as Crianças precisavam ter um colo de vó, um olhar de vó. Uma companhia de vô. Todas. É pura saúde. Cada novo neto, é uma nova experiência afetiva única. Hoje eu agradeço a essa pessoinha luminosa que chegou e me arrebatou de maneira doce com uma alegria imensa. Aos meus netos muito queridos.

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada. Parte III

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada Parte III As Crianças são atraentes como fonte do Prazer Opressor. A opressão é um comportamento característico entre pessoas fracas, inseguras, medrosas, que é alimentado por uma artéria de grosso calibre de violência, como mecanismo compensatório. Buscar um vulnerável, portanto, é o propósito do opressor. O entorno se omite. A família, a mais próxima e a extensa, a escola, os amigos, os vizinhos, os desconhecidos que jugam condenando a vítima, os operadores de justiça, quase todos fazem o movimento do mecanismo de defesa da identificação com o agressor. Aquele antigo ditado nuca foi tão atual: se não pode com o inimigo, junte-se a ele. O opressor é forte, esmaga a Mulher e a Criança, para a Criança, principalmente por sua imaturidade, o opressor é idealizado. E logo seguido. A violência exibida de maneira explícita ou velada, dimensão assustadora porquanto permanece na invisibilidade, mesmo sendo anunciada de algum modo, pratica uma manobra que acaba por ganhar, do entorno omisso, um reforço à violência. Assim, vulnerabilidade e violência se alimentam mutuamente. Precisamos pensar nos estragos que essa dupla indissolúvel causa. Vale ressaltar que a vulnerabilidade é uma condição que tem como necessidade essencial a ajuda de outra pessoa. Quando se trata de uma mulher, por exemplo, ela tende a se iludir que, como adulta, teria a capacidade de fazer frente à opressão imposta por um agressor. Entram como ingredientes, além do medo, elemento básico do ciclo da opressão, aspectos já distorcidos do exercício da maternidade, a vergonha, o desafio provocador, e, todos juntos, promovem o encarceramento no perverso ciclo da opressão. Permeada pela culpa secular, a vergonha se sentir ou ser acusada de culpada, faz com que a Mulher chegue a dissimular sua posição de oprimida pelo seu agressor. E, tenta transformar essa sensação de vulnerabilidade, num desafio onde acredita que vai conseguir “salvar” o seu predador. Ela não consegue pensar em se salvar a si mesma. Ela se acredita aquela que aguenta tudo para operar esse salvamento. Pegando emprestado de Paulo Freire em relação ao “ser mais” da dupla professor-aluno, a potencialização da amorosidade, podemos usar, em outro sentido, o termo desse autor “Vocação Ontológica”. No Ciclo da Opressão, a potencialização não da amorosidade, mas da recíproca dependência, maquiada de um alcunhado “amor”, que tem um liame viscoso como uma cola. A distorção do comportamento da Mulher oprimida que pensa que está protegendo seu filho, ou filhos, ao permanecer numa relação abusiva, parece estar conectada à distorções sociais do que seria o exercício da maternidade. Ela sonega de si mesma a capacidade perceptiva da Criança, ela “esquece” que a Criança entende por diversas linguagens, inclusive a corporal, o sofrimento e as dores da mãe no ciclo da opressão. Mas, quando temos uma Criança nesse lugar do oprimido por um adulto, a culpa pode aparecer induzida pelo adulto agressor, mas não há vergonha porque não há ainda um código moral formado. No entanto, essa formação do código moral, do código de Ética da Sociabilidade, sofrerá essa marca em suas raízes. A deformação é o caminho que essa Criança experimenta. Estamos assistindo nesse nosso tempo sombrio, cada vez menos humanizado, cada vez menos humano, cada vez mais sub-animal, uma opressão avassaladora contra Mulheres e Crianças. Já nem tinha espaço midiático a guerra Rússia-Ucrânia. A banalização chegou e invisibilizou as milhares de Crianças assassinadas, feridas, perdidas e sequestradas de suas mães e pais. E estourou outra guerra sanguinária, com requintes de crueldade nunca antes imaginados. Com o recurso das imagens de internet, não conseguimos saber o que pode estar acontecendo, ou o que é a guerra psicológica das Fake News de grandes lobbies que manipulam a todos nós. Além desses dois focos de matança, temos hoje 17 países que estão tendo conflitos armados. Nessa soma não entra nosso Rio de Janeiro com a guerra urbana que convivemos. Nesse rolo compressor as imagens de Criança em situações de violência, vão perdendo os contornos. O menino encontrado por um soldado numa praia, inchado pelo afogamento. Estava num barco fugindo de uma guerra. O outro menino em visível estado de choque, sentado numa poltrona laranja, com um ferimento sangrando na cabeça, que não lhe provocava nenhuma reação. Estático por fora e por dentro. Aquela menina no Vietnam, acho, que fugia nua por uma estrada, no rosto o horror. Hoje, quantas Crianças dessas 19 guerras foram alvo de violência pela sua vulnerabilidade? Até quando, em nosso micro mundo, vamos continuar invisibilizando a vulnerabilidade para naturalizar a violência? A Criança não é o futuro. A Criança é o HOJE.

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada. Parte II

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada. Parte II Muito me arranha e sangra constatar impotente o esforço de certos dias “comemorativos”. Sei que é preciso marcar o dia das mães, o dia dos pais, o dia dos namorados, o dia do Natal, o dia do ano-novo, o Dia da Criança. Todos se mobilizam, todos tomam um banho de bondade para homenagear o “título” daquele dia. São algumas horas, muitas vezes com preparação de muitos dias, embebida nas mais variadas emoções. Todos temos conhecimento do apelo comercial dessas datas. A publicidade investe pesado. Mesmo assim o brilho da alegria reluz! E todos nos esforçamos, de uma maneira ou de outra, para homenagear o “dono do dia”. Estamos no Dia da Criança. Pedidos ou doações, as Crianças esperam seu presente. E, mesmo pouco visível, essa expectativa cumpre uma função no desenvolvimento saudável da Criança. A aquisição da noção de temporalidade, tão complexa para os pequenos, se processa em várias facetas. Como uma ideia ainda fluida, pouco delimitada, até o controle pelo calendário com boa noção de tempo, a Criança consegue aproveitar esse estímulo a essa aquisição tão necessária para a vida. Assim também, o presente traz um parâmetro afetivo que muitas vezes escapa ao olhar do adulto que está presenteando. Esse é um momento em que a Criança pode experimentar uma grande satisfação ao receber uma coisa simples, que preenche seu desejo longe de valores altos, tendo em mãos um punhado de guloseimas sempre negadas no cotidiano dela. A imaturidade da Criança, por vezes, a leva a se perder em desejos infindáveis que acabam por tocar a frustração, trazendo a insatisfação. Essa imaturidade também está presente em adultos que transformam essas datas comemorativas numa espécie de “salvação”, quando tudo vai se resolver. Essa ilusão é muito frequente na passagem do Ano-Novo, quando algumas pessoas depositam uma expectativa ilusória de felicidade. Como se a mudança de ano fosse resolver tudo, deixando de ser o tempo inexorável, o tempo que não para. Em meio aos brinquedos, às brincadeiras, fomos surpreendidos por mais uma guerra que atinge, principalmente, a vulnerabilidade. Mulheres e Crianças são alvo fácil porque aumentam os números que tomam aspecto de escores de uma competição. Competição estúpida que segue com a humanidade. A Criança é hoje o produto mais rentável de nossa época, tendo ultrapassado o comércio de armas e de drogas. Ela é comercializada, ele é explorada sexualmente em trabalho correlato à escravidão, ela é feita refém de um grupo ou de uma sociedade. Por não responder com uma defesa que a proteja, ela é um atrativo para perversos cruéis. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública apontam mais de 56 mil estupros no ano anterior, dos quais 72% ocorreram dentro de casa, e 44% foram praticados por pais, 10% em crianças de menos de 5 anos. Dados de conhecida e atestada subnotificação. Esse é o retrato da vulnerabilidade. Se, por aqui, vamos comemorar o Dia das Crianças, estamos diante de notícias e imagens de Crianças sendo assassinadas, feridas ou sequestradas. Mancha que suja de sangue o clima que estávamos preparando para nossas Crianças. Mas, nem todas as nossas Crianças estarão habilitadas à comemoração. Quantas entre elas estão sendo mal tratadas, estão sendo espancadas, estão sendo abusadas? E terão apenas direito a um oásis amanhã. As Crianças daqui, as filhas de pai e mãe que cumprem suas funções corretamente, as Crianças que são amordaçadas pelo medo ou pela lei, depreciadas e violadas por quem deveria protege-las, ou as Crianças alvos de mais essa guerra, elas todas são iguais. Todas têm desejos legítimos, e deverias gozar da Garantia de seus Direitos Fundamentais, escritos mas não efetivados. Todas têm Direito à Infância. Ou deveriam ter. Resta, para mim, um conflito doloroso, uma vontade de brincar, de olhar as brincadeiras, mas, também, de chorar. Quando vamos conseguir respeitar a vulnerabilidade? Quando vamos nos indignar com a violência dissimulada contra a Criança?

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada. Parte I

A vulnerabilidade negada é a violência naturalizada. Parte I. Era noite, voltando do consultório trabalhado com cuidados redobrados pela prevenção da transmissão de uma virose, hoje é uma palavra banal mas que guarda uma ameaça bem maior que no passado, e apesar da autorização médica, uma preocupação a mais. Decidi então levar uma comida pronta para casa, não tinha condição de preparar nem um ovo, e precisava me alimentar para fazer frente à convalescência, fase que também requer atenção específica. Já de posse do meu alimento adequado à minha recuperação, sou chamada pelo oferecimento de alguma coisa que vinha de uma mulher que vinha em sentido contrário. Liguei o automático e agradeci enquanto a pessoa parava e seguia publicitando seus artigos. Desliguei o automático, e quando me virei ela tinha desistido de mim. Chamei-a, olhei para aquela mulher da 3ª ou 4ª idade, pequena, franzina, puxando um carrinho de feira repleto e um mostruário nas mãos, e perguntei quanto custava o que vendia. Ela me disse R$ 5,00. Eram canetinhas de vários modelos, bonitinhas, escolhi uma prateada, ela puxou um caderno, já cheio de riscos, e me fez experimentar para verificar se estava funcionando. Decidi não lhe perguntar sobre sua vida, sua condição de sobrevivência, nem sua idade. Estava tudo já respondido, eram explícitas as respostas. Não devo satisfazer minha curiosidade quando isso pode causar uma revitimização ao outro. Foi assim que percebi, ela precisava continuar seu caminho, talvez para defender algum salgado para comer antes de dormir um pouco, não sei onde e como. Assim continuei meu caminho. Mas não consegui parar meus pensamentos. Uma chuva de perguntas caía sem parar no meu pensamento. Mas, por que tinha me incomodado tanto? Afinal, essa cena é tão comum. Percebi que tinha sido atingida ao vivo pelo que falo tanto quando me refiro à Criança segregada pela Cidade Partida. Acreditamos que o Apartheid foi na África do Sul e que ficou para trás, foi resolvido por Mandela. O Apartheid está entre nós, mas, como na questão do preconceito racial, negamos, somo camaradas, amigos, e nos negamos a enxergar o que praticamos, disfarçadamente. Negando a existência dessa Cidade Partida, nos iludimos que somos bons uns com os outros. Claro que se esquecermos os cancelamentos que ocorrem nas redes sociais, sem dó nem piedade. Justiça com as próprias mãos. Vivi a confirmação do nosso Apartheid numa calçada de um bairro da zona sul do Rio de Janeiro. O que me diferencia daquela Senhorinha? Tínhamos muitos traços aparentes em comum. A cor da pele, o cabelo, a maneira polida de falar, a delicadeza e atenção com o outro, a força de trabalho, o olhar nos olhos. Em que ponto da vida aquela Senhorinha foi abandonada e apartada? Ou foi desde sempre que as oportunidades não chegaram para ela? Será que ela, como muitas Crianças, é vítima de exploração? Afinal ela agora tem uma condição etária que mobiliza, faz algumas pessoas se penalizarem por essa condição. Se não honramos a vulnerabilidade de grupos que precisam mais da ajuda do entorno, e da Responsabilidade do Estado, não seremos uma Sociedade saudável. E isso interessa porque cria bolsões para perversos praticarem a violência, porquanto o perverso necessita do fragilizado para se sentir Poderoso. Afinal, maltratar Crianças, Idosos, Gays, Pobres Pretos, Mulheres, principalmente as que se tornaram mães, é o Gozo do Perverso. Ele precisa do vulnerável para se sentir acima, para esmagar, para obter esse caldo de prazer, para ele o principal prazer. Era o dia seguinte ao Dia do Idoso. Homenagens, programas, produção audiovisual, memes, musiquinhas com brincadeiras, mas muita celebração enaltecendo o Idoso. Será que no Estatuto do Idoso, existe algum Artigo que corrobore o trabalho daquela Senhorinha? A invisibilidade acoberta a violência social com seus idosos. Enquanto nos omitirmos sem iluminar essa invisibilidade da vulnerabilidade da Criança e do Idoso, as duas pontas do ciclo de vida, a primeira porque ainda não adquiriu as habilidades necessárias para se defender de predadores sociais, “atletas da violência”, e o segundo porque está perdendo essas habilidades e o declínio corporal chega, não alcançaremos a Democracia Social. E, se não enxergamos a vulnerabilidade como da responsabilidade de cada um de nós, estaremos pavimentando a naturalização da violência, que passa a acontecer com a autorização de cada um de nós, sob justificativas as mais absurdas mas, aceitas como banais. Parece-me que há um sistema que sustenta esse ciclo, invisibilidade, violência, assistida por todos em uníssona cegueira deliberada. A vulnerabilidade invisibilizada é a violência naturalizada.

Uma Conferência Internacional sobre a lei de alienação parental. Parte II

Uma Conferência Internacional sobre a lei de alienação parental Parte II A excelência das apresentações dos experts internacionais sobre o tema trouxeram a reflexão, recuperaram a capacidade de pensar, só interrompida pela pergunta: por que lutamos para recuperar o óbvio, para buscar novas resistências contra as perversidades estabelecidas legalmente? Foi bem difícil me multiplicar para atender à participação em dois grandes Eventos nos mesmos dias. Excelentes Eventos! Precisos e corajosos. A Universidade de Brasília, Cladem e Equality, promoveram o Pensamento trazido pelos FATOS relatados e avaliados por Acadêmicas, Pesquisadoras, Advogados, Ativistas, Mães. Sim, as mães estavam presentes na Voz de algumas que as representavam. Escutar as mães é sempre doloroso. Muito. É impressionante ouvir como a voz de testosterona é direta, não necessita de comprovação, é só falar que a mãe está praticando atos de alienação parental que aparece uma celeridade judicial inacreditável. Relatos, com comprovação de processos onde o mesmo fato, por exemplo, uma mudança de endereço da mãe, alegado pelo genitor como não avisado, causa a perda da Guarda da Criança, e multa. Enquanto o pai some com a Criança por meses, e quando encontrado pela mãe, o juiz inverte a Guarda em favor desse genitor. Processos onde o Laudo da Perícia Forense afirma os indícios de abuso sexual, com vestígios concretos, e o genitor ganha a Guarda da Criança. E são centenas de processos com violência institucional de gênero desse tipo. A Violência Vicária, título do novo livro da Perita Internacional Sonia Vaccaro, está por todo lado. É desalentador. O Estado segue a seita dogmática da acusação de mãe alienadora, e entrega a Criança para o genitor que deveria ser investigado sobre a denúncia de abuso sexual intrafamiliar. A mãe é afastada, é violado seu Direito Natural à Maternidade, e nunca mais o Estado presta conta da Criança entregue ao genitor abusador. A Criança não tem nenhum valor, nenhum respeito por ela é guardado. Todos os artigos que rezam a Proteção Integral no Estatuto da Criança e do Adolescente são desconsiderados. Ao genitor abusador é conferido total Poder sobre a Criança. É, efetivamente, reconstituído o Pátrio Poder. Para completar a perversidade, a Criança é submetida, compulsoriamente, a uma tortura intitulada Reprogramação ou, em mais um erro teórico, “revinculação”. Esse termo é usado pelos que querem fazer uma maquiagem de seriedade, porquanto vínculo afetivo é um conceito teórico que não se aplica à técnica malfeita de condicionamento Pavloviano. Seria muito bom que esses profissionais que buscam bolsões promissores, dedicassem um bom tempo ao estudo em livro. Mas, se a Criança continuar com a Mãe, vai ter que passar por periódica pretensa avaliação chamada de “estudo psicossocial”, a revitimização em série. E, se o juízo continua com o desejo obcecado de inocentar o genitor, a Reprogramação compulsória também é determinada. E a profissional que se presta a praticar esse condicionamento torturante vai repetir, por exemplo, uma frase que contem uma ameaça e detona suas lembranças traumáticas, inclusive, reavivando-as, “ você só vai ser feliz quando for morar com seu pai e esquecer essa bobagem”. Reduzindo a dor do trauma a uma bobagem que impede a felicidade, essa profissional, paga pela mãe, e muito bem paga, mãe que é a culpada dentro do processo, segue apartada dos conhecimentos científicos que compõem as teorias do desenvolvimento infantil. Além disso, não há possibilidade de obediência ao Código de Ética do Psicólogo. Como sintonizar os Princípios e Valores Éticos com uma atitude autoritária, invasiva, ameaçadora, desrespeitosa, que causa constrangimento. Nenhum respeito ao ECA. Mas uma explicação sem sentido nem fundamento é dita e, o que é pior, é aceita. Não se questiona os ferimentos que uma invenção dessas vai causar na Criança. Ela viveu. Ela relatou. Ela tem as imagens mnêmicas dos atos libidinosos. O que pretende alguém enlouquecer uma Criança, tentar convencê-la de que o que ela viveu, ela não viveu. O que ela fará com todas as sensações perceptivas que tem no seu acervo de sua vidinha? Os toques, os cheiros, os sons que aquele adulto produzia ao tomar posse de seu corpinho indefeso, nada existiu? Ou ainda mais grave, a “Reprogramadora” repete sempre que aquilo tudo “é normal, são coisas que os homens fazem entre eles”. Ou, que os abusos “eram uma forma de amor do pai, amor”. As mentiras teóricas são abundantes. Uma delas, muito perniciosa é a afirmação que todo pai é indispensável para a Criança, não importando se ele é um abusador/estuprador, um agressor, um adicto de cocaína, um alcóolatra violento, “ele pode bater na mãe mas é um excelente pai”, uma aberração que circulou, recentemente. Quando esse genitor mata a Criança, de quem ele seria “um excelente pai”, a autora da frase será responsabilizada? Ou quando se cumpre a instrução do médico pedófilo que inventou o termo alienação parental, e a menina fica grávida do pai dela, “ele é abusador mas é pai, tem direito a convivência”, outra afirmação que se escuta muito de operadores de justiça, e a menina e o bebê morrem no parto, quem é responsabilizado? Por que essas mentiras teóricas, escritas nos laudos sentenciais, não despertam uma mínima desconfiança quanto à sua fidedignidade científica? Quanto à sua confiabilidade científica?

Uma Conferência Internacional sobre o uso do pseudoconceito de alienação parental Parte I

Uma Conferência Internacional sobre o uso do pseudoconceito de alienação parental Parte I Por que nos debruçamos sobre esse termo enquanto crianças e adolescentes são assassinados todos os dias? Por que seguimos clamando pela Revogação da Lei de Alienação Parental quando a cada 10 minutos uma criança é estuprada? Por que nos debruçamos sobre violência de gênero se o Feminicídio cresce exponencialmente? Em meio lamacento, temperado ou originado pela violência de gênero, esse termo, que não é um conceito pela ausência de critérios científicos em sua pretensão, se espalhou como rastilho de pólvora, expressão usada pela Juíza Maria Clara Sottyomayor do Tribunal Constitucional de Portugal, a mais alta instância do país fraterno. A Juíza Clara estará no webnário promovido pela Universidade de Brasília nos dias 25, 26, e 27 de setembro sobre esse termo e sua estreita associação à violência de gênero. A Perita Internacional e Professora da Universidade de Madri, que acabou de publicar seu novo livro, “Violência Vicária”, essa definição nova para uma conhecida forma muito usada de violência contra a Mulher, a Pesquisadora Joan Meier, o Juiz de Criança Juan Manuel, o estudioso Juiz Romano, a advogada brilhante Claudia Galiberne, a socióloga professora da UnB Ana Lièse, a pesquisadora da UFRJ Suzana, a Especialista italiana Michela, a Eleonora Francica, a Relatora da ONU Reem, a Sonja e a Adrienne, a cineasta Isabella Vilela, Ruana, Sibele, Luz, Ivana, Helena Piragibe da UBM, o CFP, o CONANDA, o CNS, o CFSS, CNDH, a Simone, a Cristina, a Denise, todos estão interessados em pensar os Impactos dessa importação sem fundamento que se alojou no sistema judiciário brasileiro como o dogma de uma seita. Como permitimos a distorção do conceito de Proteção Integral por uma pretensa questão emocional que joga holofotes na mãe como sendo louca, interesseira, inconformada com o término do relacionamento? Quantas vezes esse tal relacionamento já havia findado há muito, ela não era “louca” até então, mas a ousadia de uma mulher em fazer uma denúncia contra um homem é insuportável para grande parte da sociedade. Seguimos sendo uma sociedade primitiva. Estudantes de Medicina fazem uma manifestação grotesca de exibicionismo como se seus órgãos genitais fossem troféus a serem expostos orgulhosamente para estragar um jogo entre equipes femininas. Um pai é preso por ter engravidado a filha, de 12 anos. Uma médica afirma em reunião de sua equipe que uma menina de 9 anos, internada no Serviço de Pediatria com hematomas e inchaços na genitália e região anal, tendo recebido medicação preventivo contra HIV, prescrito no próprio hospital, não foi vítima de abuso sexual porque não tinha rompimento de hímen, explicitando sua perigosa ignorância sobre o tema. E proibiu os alunos de tocarem em abuso sexual. À dra. precisa ser explicado que sexo oral também não causa rompimento de hímen. No entanto é tipificado como abuso sexual, tipificado como estupro de vulnerável. A ignorância dos artigos do ECA que buscam a garantia dos Direitos Fundamentais, entre eles, a dignidade da criança, agrava a situação da criança vítima. O Art. 13, por exemplo, determina a obrigatoriedade da Notificação ao Conselho Tutelar a suspeita ou a confirmada de indícios, evidências, que mesmo quando são constatadas pelo Exame de Corpo de Delito, por laudo assinado por Médico Legista concursado, são desqualificados por uma Psicóloga que alega que o médico foi precipitado por não ter examinado a criança várias vezes. Não se deve à ignorância uma alegação desse tipo por uma profissional que não tem o gabarito nem a licença de se promiscuir na área que não é de sua alçada, induzindo assim a cadeia que proferirá a sentença, sempre encostada na lei 12.318/2010. Será que isso se deve apenas, mesmo que muito grave, à ignorância de leis, genuinamente, de Proteção? À ignorância de Teorias do Desenvolvimento Infantil? À noções básicas de bom senso? Não é possível ignorar, isso sim, a intencionalidade que move alguém que sentencia para um juiz a inversão da guarda e a entrega da criança para aquele em quem recaem as suspeitas do abuso sexual. A voz da Criança? Desqualificada até quando ela desenha, expressão de via de comunicação infantil, quando ela relata detalhes da prática executada que implicam na impossibilidade absoluta porquanto é equivalente a afirmar que uma criança aos 2 meses desceu do berço e foi andando à geladeira pegar o leite. Não há como uma criança se referir a conhecimentos de comportamentos sexuais sem ter experimentado esses comportamentos, porque seu raciocínio é concreto até os 11 anos, mais ou menos. Somente por experiência a criança adquire seu acervo de memórias. Mas, absurdos são admitidos. E obedecidos. A honestidade intelectual está muito rarefeita. E outras formas de honestidade, também. Urge refletir sobre os impactos desastrosos desses 13 anos da lei 12.318/2010 porque já temos uma geração chegando à vida adulta com todas as implicações afetivas e sociais que vem causando mutilações irrecuperáveis. Afinal, quem duvida que a exploração sexual, o abuso sexual incestuoso, é benéfica como afirma em seu livro o pai da alienação, Gardner? P.S. O link do formulário de inscrição da Conferência Internacional promovida pela UnB: < https://forms.gle/neuozvc6b5QrzcAS6 >

Nosso Tributo a José Gregori, e a todos os genuínos defensores dos Direitos Humanos da Criança Parte II

Nosso Tributo a José Gregori, e a todos os genuínos defensores dos Direitos Humanos da Criança. Parte II Como bem qualificou a Olga Câmara, José Gregori foi o Pai dos Direitos Humanos no Brasil. Ele vislumbrou um horizonte humanitário a que todos tinham Direito. Trabalhou muito. Incessantemente. Será que honramos a herança que nos deixou? Há 50 anos trabalho nessa área da Proteção da Criança e do Adolescente. Diria que não. Cada milímetro de avanço é respondido com mais uma legalização de uma violência, geralmente, camuflada de “protetora” que usa os mesmos termos para confundir os incautos. São “leis” que surgem em velocidade máxima, manipulando uma retórica de pseudociência com tamanha habilidade que fica difícil distinguir o joio do trigo, ou, no popular, alhos de bugalhos. A confusão de línguas, conceito teórico e brilhante de Ferenczi, ilustra bem esse propósito: dizer coisas em contramão explícita. Afirmações sem nenhuma sustentação científica, são faladas sem nenhum pudor. A lei de alienação parental, com seus adereços, as falsas memórias em Crianças e a seita da constelação familiar, entre outras, explicitam, com clareza, essa estratégia belicosa contra mulheres e Crianças. José Gregori foi um homem que, genuinamente, semeou verdadeiras Políticas Públicas de Direitos Humanos, com responsabilidade, efetividade e consequência. Quando pensou e montou a Rede de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, que deveria ser formada pelas organizações sociais e instituições de defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, visou a descentralização e intersetorialidade através da composição entre Centros de Defesa, como Unidades de Referência em cada Unidade da Federação, Conselhos Tutelares, Conselhos de direitos da Criança e do Adolescente, Membros do Poder Judiciário e da Varas da Infância e da Juventude, do Ministério Público e da Defensoria Pública, organismos federais, Polícia Federal, estaduais, Polícia Civil, e, inclusive, internacionais, como a INTERPOL, de Segurança Pública. Essa Rede existiu. Com agilidade era possível para nós da ABRAPIA, acessar qualquer desses órgãos para o encaminhamento de uma denúncia de abuso em qualquer canto de nosso país. Para completar, fundamental, o Banco de Dados. Era possível visualizar incidências, e cruzar dados, levantando hipóteses. Um Banco de Dados. Em 2003 foi inaugurado o disque 100 pelo governo federal que entendia ser esta uma função do Estado. Com 16 itens de denúncia, que iam de doenças raras a trabalho escravo, de criança e adolescente a preconceitos, o disque 100 trouxe uma abrangência muito maior que o 0800 99 0500 operado pela ABRAPIA que focalizava, tão somente, a Proteção da Criança e do Adolescente. O Serviço foi amadurecendo e se consolidou. Mas a judicialização embebida na doutrina de Gardner, a alienação parental, baniu o abuso sexual incestuoso. Hoje, esse comportamento aberrante, não existe mais para os operadores de justiça. Toda denúncia de abuso sexual intrafamiliar do pai é travestida de alienação parental da mãe, sempre classificada como louca, interesseira e inconformada por “ter perdido” o marido. O curioso é que essa é a motivação já consolidada pela investigação policial sobre os Feminicídios: o marido, namorado ou ex matou porque não se conformou com o término do relacionamento. Assim, não existe mais abuso sexual no Brasil, apesar do país ser conhecido como o paraíso dos pedófilos. Os Feminicídios que só aumentam, como encaixam nessa “historinha”? E a mágica de sumir com a denúncia sexual da Criança, semelhante a fazer sumir uma pombinha branca? A Rede de Enfrentamento à Violência Sexual contra a Criança e o Adolescente não sobreviveu. Só restou a memória daquela articulação que tantas vezes experimentei quando buscava na Rede o socorro a uma Criança que estava sendo explorada, (toda Criança abusada dentro da família, está sendo explorada), por um adulto em qualquer lugar no nosso território, tendo a certeza de que o encaminhamento tinha começado ali, e podia ser acompanhado, assim como esse registro no Banco de Dados serviria para a implantação de melhores Políticas Públicas, mais eficientes. Lamentável o sumiço do Banco de Dados. Hoje temos a figura jurídica do “segredo de justiça” fazendo sumir os registros que são atendidas pelo disque100. Temos números de outros organismos, de ongs, mas ninguém sabe para onde vão as denúncias recebidas. Parece, parece, que são segredadas. O José Gregori pensava coletivo, trabalhava por Políticas Públicas responsáveis e comprometidas com a Proteção Integral dos pequenos vulneráveis. A honestidade é cada vez mais rara. A honestidade intelectual se degradou entre profissionais que deveriam cumprir suas funções públicas, e ao invés disso, abraçam pseudociências, recheadas de pensamento mágico, misturadas a erros teóricos sobre o desenvolvimento infantil. Obrigada José Gregori pela generosidade incansável nessa luta pelos Direitos Humanos, que até hoje amarga um estereótipo de proteção a bandido. Faz-se necessário ler mais para saber, verdadeiramente, estudar, para não ser cooptado pela superficialidade manipulada.

Nosso Tributo a José Gregori, e todos os genuínos defensores de Direitos Humanos de Crianças Parte I

Nosso Tributo a José Gregori, e todos os genuínos defensores de Direitos Humanos de Crianças. Parte I Era 05 de fevereiro de 1997. A ABRAPIA, me parece ter sido a primeira ONG de Proteção da Criança e do Adolescente, aceitou o desafio de operacionalizar um instrumento que, para além da educação e da informação, trouxesse uma alavanca para a efetivação da Rede de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes. Nascia ali o primeiro disque-denúncia de combate da violência sexual contra Crianças e Adolescentes. O conhecido 0800 99 0500. Gratuito, cobrindo todo o território nacional, de dimensões continentais, com uma extensa multi-fronteira, e, por isso, sempre, precariamente, administrada. A Rede de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes vinha sendo gestado, porquanto indícios se tornaram evidências de turismo sexual infantil, campanhas explícitas mundo a fora. A EMBRATUR, na época, encontrava posters em agências de viagem de vários países, que ofereciam pacotes que incluíam “uma menina”, “uma virgem”. Escrito. Os meninos também faziam parte de pacotes, mas não eram estampados nos cartazes de propaganda. Países diversos usavam essa estratégia sem quase nenhuma reserva, sobretudo Itália, Holanda, Alemanha, Espanha. Aqui, cidades como Fortaleza, Recife, Salvador, Natal, Rio de Janeiro, tinham esquemas que incluíam acertos com médios e grandes hotéis e restaurantes. Assim, a EMBRATUR, impactada com o tamanho do problema, investiu no projeto para combater o turismo sexual de crianças e adolescentes em nosso país. A WCF, Word Childhood Fondation trouxe apoio importante. Relatório da ONU acrescentou competência. A ANDI realizou pesquisa. A articulação de vários organismos federais, estaduais e municipais foram sendo conectados. Polícia Federal e Polícia Civil, Promotorias e Defensorias de Varas de Criança e Juventude, Conselhos Tutelares, Conselho de Direitos Humanos, de todos os Estados, em conexão para que os encaminhamentos das denúncias fossem realizados. A postos. O Governo Federal, através do seu Ministério da Justiça inaugurou em 5 de fevereiro de 1997 o telefone nacional, gratuito, com garantia de sigilo para o denunciante, na Sede da ABRAPIA, no Rio de Janeiro. O então Presidente da República, em cadeia nacional e em gesto simbólico, fez a primeira ligação de denúncia ao 0800 99 0500. Eu estava lá. O Ministro José Gregori, acompanhado de sua Assessora Olga Câmara, grandes defensores dos Direitos Fundamentais da Criança e do Adolescente, falou simples, mas firme, da importância daquele momento. Muita responsabilidade para nós da ABRAPIA, pela escolha que o Ministro José Gregori fez. Incansável no combate à violação de Direitos da Criança e do Adolescente, não teve o merecido reconhecimento do trabalho continuado e eficiente que realizou por toda vida. Talvez por não buscar holofotes. Ele e a Olga, trabalhavam. Obrigada muito por todo o esforço competente. A história da Criança e do Adolescente em nossa terra vem sendo povoada de violência que viola Direitos e Corpos em barbarismo e impunidade misturados. Poucos, como o José Gregori que nos deixou esta semana, têm se dedicado com tanto cuidado e honestidade de ideologia. Proteger quando se tem leis que burlam princípios básicos, e, manipulando, protegem agressores e predadores, é muito penoso. “Em 1973, em Vitória, capital do Espírito Santo, a menina Araceli Cabrera Sanches, 8 anos, foi sequestrada, drogada, espancada, estuprada e morta por membros de uma tradicional família capixaba. As provas do crime foram destruídas, os laudos foram adulterados e as testemunhas não foram localizadas.”, página 99 do livro/documento publicado pela ABRAPIA, Do Marco Zero a Uma Política Pública de Proteção à Criança e ao Adolescente. Para que não fosse esquecida essa atrocidade, o dia 18 de maio, a partir do ano 2000, em homenagem à Criança Araceli, dedicamos essa data como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Araceli teve uma morte torturada, seguida da impunidade dos autores. Um assassinato bárbaro e coletivo. Outras Crianças continuam sendo assassinadas com requintes de crueldade, Joanna, Henry, emblemáticos, e que mostram um coletivo do entorno que tem conhecimento e nada faz. Degradante cumplicidade.

terça-feira, 5 de setembro de 2023

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes? Parte III

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes? Parte III Eu não sei. Tenho tentado refletir sobre essas duas perguntas: como e por que? Não consegui muita coisa. Talvez em relação ao “como” algumas evidências surjam quando temos balas de fuzis matando. Mas pouco surge se pensamos na outra modalidade de morte de Crianças e Adolescentes. Mesmo as orgânicas que se impõem pela negligência do Estado, pela ausência do Estado, pelo assaltos ao Estado realizados por perversos que não têm nenhuma empatia com os pequenos indivíduos, também aqui, PPP, porquanto são o alvo pela vulnerabilidade concentrada que carregam. Eu não sei. O como também aparece camuflado. Camuflado de culpa por falta de cuidado e responsabilidade da família que luta para oferecer aos pequenos uma refeição por dia, e nem todos os dias consegue, como se ficasse sempre insinuado que a culpa é pela falta de esforço que não fizeram. E, na cidade partida, as Crianças e Adolescentes que têm o que comer, e bem, e onde estudar e se divertir, viajar, são mortas pela negligência afetiva, pelos espancamentos intrafamiliares, pelos incestos dentro de suas próprias casas. Às vezes chegam a óbito, mas muitos se tornam mortos-vivos arrastando dores intermináveis. Eu não sei. Deveria saber. Hoje, com o advento do pós-pós-doc Google, todos sabem tudo. É só fazer uma consultinha a ele. O conhecimento de todas as áreas chega em raspas raladas no ralador de queijo, um fragmento misturado com uma dose de pensamento mágico é o suficiente para formatar uma argumentação com pretensões científicas. Vivemos a era das pseudociências. Lemos o celular. Não lemos livros. Mas temos certezas inabaláveis sobre tudo. Parece que não estamos suportando as perspectivas desastrosas que são anunciadas a todo momento para um futuro próximo, mas que já começou. O jogo entre a impotência e a onipotência é travado, ininterruptamente. A impotência é insuportável, a onipotência oferece uma ilusão de conforto por um triunfo sempre desejado. Assim, compramos ideias que são resultado de pensamento mágico, fase do desenvolvimento cognitivo da infância. Como era apaixonante ver, diante dos olhos, o mágico fazer sumir uma bengala ou fazer aparecer uma pombinha branca, contrariando as leis da realidade. A ilusão sempre atraiu o ser humano. O álcool e as drogas se alojam nessa busca de alteração da realidade. E, por isso, são tão antigos quanto o homem. Retorno para o meu não sei. Eu não sei como matamos 37 Crianças e Adolescentes à bala, nos mais diferentes lugares e situações, nos 8 primeiros meses do ano, na cidade do Rio de Janeiro. Como? A incidência é estarrecedora. Mas logo será esquecida. Não quero trazer aqui os Feminicídios em escalada também estarrecedora. Temos uma Lei, com “L” maiúsculo. Não conseguimos cumprir a lei? Semelhante ao matar Crianças e Adolescentes que também não cumprimos a outra Lei com “L” maiúsculo, o Estatuto da Criança e do Adolescente, ECA, que reza a Proteção Integral dos pequenos e vulneráveis de nossa sociedade. Essas duas Leis são inspiração para muitos países que as copiam no que é possível para a devida adaptação em suas sociedades. São copiadas por muitos países, mas não protegem Crianças, Adolescentes e Mulheres brasileiras. Como isso? É outro “como’ que tenho que escrever de novo, eu não sei. E o por que do título? Por que matamos nossas Crianças e Adolescentes? Aqui, me sinto mais incapaz ainda de chegar a algum lugar lógico-afetivo. Por que? Por que matamos nossas crias? As genéticas e, também, as sociais. Esse “por que” é como uma espinha de peixe que atravessa a garganta e ali fica enganchada. A mim me parece destituído de uma mínima réstia de razoabilidade esse por que. Por que matar uma Criança de 4 anos de pancadas, chutes, socos, batendo sua cabeça contra a parede ou o chão? Por que matar uma Criança de 5 anos com atos os mais variados de tortura? Hematomas de várias idades, queimaduras de primeiro, segundo e terceiro graus de vários tamanhos, hemorragia cerebral, mantendo-a amarrada na cama em meio a excrementos, por que? Seria ódio? Mas por que aquele menino, aquela menina, provocariam um ódio tão extremado, tão inimaginável até que somos impactados pela notícia midiática. Não era segredo, muitos do entorno dessas e de outras Crianças e Adolescentes tinham conhecimento do sofrimento atroz que eles passavam, cotidianamente. Ninguém teve empatia pela dor que sentiam? Apesar de todos os canais possíveis de denúncia, até de modo anônimo, ninguém se sensibiliza com a dor de um pequeno. E aí, surge o protetor “segredo de justiça”. O agressor goza do privilégio de Proteção do Estado. A Criança será estigmatizada porque, se não morreu, será entregue a seu agressor, beneficiado pela lei de alienação parental que condena a mãe à perda da guarda do filho ou filha. Quantas já foram mortas? Por que? Eu não sei.

segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes. Parte II

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes Parte II A cidade partida chora e sangra. Chora sem fazer barulho, é segredo de justiça. Sangra na invisibilidade só quebrada por breve tempo pelos gritos que clamam justiça. Mas são gritos que não são ouvidos. A instituição que detém o Poder protocolar dita que foi um confronto. Sempre. E segue executando a pena de morte em Crianças e adolescentes. No Grande Rio, já são 24 Crianças e Adolescentes. Em 7 meses e 20 dias, 24 pequenos foram mortos à bala aqui na nossa Cidade Maravilhosa e entorno. Crianças têm sido assassinadas por portadores de armas pesadas que não têm nenhum compromisso com o outro, qualquer que seja esse outro. No quarto, na sala, na garupa de uma moto, ontem no meio da rua. Poderia ser o roteiro de um filme romântico se não fosse mais uma tragédia. Um menino e uma menina voltavam da escola e se viram no meio de um tiroteio, hoje cotidiano no Rio de Janeiro. Eles se jogaram no chão, como todas as Crianças desse lado da cidade já aprenderam, e ele deitou por cima das costas dela para protegê-la. Levou um tiro nas costas. De fuzil. Morreu ali. A menina, protegida, não se machucou. Não no corpo. Mas será que conseguirá retirar esse corpo inerte, sangrando de suas costas algum dia? Assistência do Estado??? Como noticiam oficialmente: “não resistiu aos ferimentos”. Mas que ferimentos? Não resistiu a um tiro de fuzil? Protestos e o grito de “justiça”. Por onde a “justiça’ começaria a trabalhar num caso desses? Até a próxima Criança ser abatida e a mídia trocar o nome. Do outro lado da cidade partida quantas Crianças são molestadas por dia dentro de suas famílias? Nem sabemos. Os casos são subnotificados, e os que chegam a algum balcão, caem no “cofre boca de lobo”. Segredo de Justiça. A invisibilidade de Crianças e Mulheres vítimas da perversidade da lei que protege agressores já se tornou título de livro. Ontem me senti, confesso, constrangida. Fui convidada a compor uma Mesa de Conversa para comentar a exibição do Curta “Lei da Mordaça”, na Cinemateca do MAM aqui no Rio de Janeiro. Filme impactante na medida. Realista. Doloroso. Frustrante. Mas que mexe no âmago. Verdade da dor de mulheres que têm sido assaltadas em seu Direito de Maternidade, conferido pela Natureza a todos os mamíferos. É o Maternicídio. Hoje exercido pelo Estado. É estarrecedor ver, logo no início do filme, o registro do inventor do termo “alienação parental”, Richard Gardner, que a solução para as Crianças que resistirem a conviver com o genitor/agressor é a prisão delas. Sim, ele fala com todas as letras que depois de passarem um dia ou dois numa prisão, a Criança vai aceitar direto a convivência com o pai, e dá um sorrisinho. Em seguida ele acrescenta que também para as mães, que, passando uns dias encarceradas, faz com que desistam de continuar alegando abuso sexual ou espancamento do pai. Afirma como se estivesse indicando um “santo remédio”. Com sorriso sarcástico. Essas falas desse médico pedófilo que engendrou essa armadilha, que se tornou dogmática entre nós, para defender pais abusadores que o procuravam em busca de laudos para serem inocentados, se chocam com a cara lavada ao instruir que as Crianças que resistirem à convivência com seus agressores, devem ser presos, detidos em prisão. Não há nenhuma preocupação com a ausência de lógica nas afirmações que fomentadas por uma mente desse tipo, proliferaram ideias pseudocientíficas, fraudes pseudoteóricas, enfim, afirmações infundadas e insustentáveis, até mesmo no simples bom senso. Como se dar espaço para aberrações, e pior, passar a defende-las? O filme traz recortes de Audiências Públicas, falas de Técnicos e Juristas, e a Nara, uma vítima da lei de alienação parental, discorre, com clareza e lucidez ímpares, a barbárie institucional que conheceu. A Nara é um ponto crucial no roteiro muito bem construído. A agonia da impotência vai invadindo aquele que está assistindo o documentário. E a Voz das Burcas traz a realidade da mordaça. As manifestações, os gritos que clamam a devolução dos filhos retirados das suas mães, iguais aos gritos por justiça das mães que perdem os filhos para as balas de fuzis, e que também não são escutados. As luzes se acendem mostrando nossa vergonha, nossa raiva, nossa tristeza. E aí, ao vivo, as meninas que construíram aquele impacto se apresentam. Talvez a idade média da equipe seja 23 ou 24 anos. Meninas muito grandes! Fui tomada de uma espécie de constrangimento diante daquela juventude enquanto identificada com os inúmeros antigos que estão nessa indústria: como aquelas 6 grandes pessoas, terminando a faculdade, conseguiram captar o óbvio? Estudaram, buscaram verificar, se indignaram. Por que pessoas da minha idade e estrada não enxergam a realidade de aberrações e perversidades tão explícitas? Como, com tão pouca idade, elas têm responsabilidade humanitária, e bem mais velhos e muito “estudados” não se importam com o sofrimento pela Privação Materna Judicial que promovem? Crianças importam. Mulheres importam. Não podemos matar. Nosso profundo agradecimento a Isabella Vilela, Lygia Contin, Diana Lima, Gabriella Godoy, e Kaena Ramos. Vocês são inspiradoras! Obrigada muito pela alegria desse momento dos três tempos, o ontem, o hoje, o amanhã! Que alegria/força!

quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes? Parte I

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes? Parte I Onde escondemos nossa cara para não ver o que estamos fazendo com nossas Crianças e Adolescentes? No Rio de Janeiro foram assassinadas à bala 11 em 7 meses e 10 dias. Forma 3 nos últimos 6 dias. Eloáh, 5 anos, estava em seu quarto, acordando. Thiago, 13 anos estava passando na garupa de uma moto. Quais os crimes que eles cometeram? Temos pana de morte? A única constatação é que são pessoas “PPP”, pretas, pobres e periféricas. Para adultos, já estávamos desconfiados, mas para Criança que não entra em “confronto” a desculpa de praxe para as mortes desses adultos, na maioria das vezes, identificados como bandidos. Julgamento sumário, reatividade em velocidade máxima, nunca registrado pelas câmeras corporais. Também nesse lastro de violência letal, agentes do Estado são igualmente “eliminados”. A celebração da violência mais primitiva se faz presente na vida cotidiana, como quem pede uma licença para uma naturalização. Todos os dias vemos nos jornais essas notícias e, por vezes, ficamos confusos achando que essa foi a notícia de ontem ou de anteontem. Temos a mesma sensação de repetição, de “déjà vu” quando estamos recebendo mais um caso da invenção de “alienação parental”. São muito iguais. No entanto, a evidência de Cidade Partida, de Sociedade Partida, se impõe. Longe do território onde vivem as Crianças “PPP”, a alienação parental também mata. Joanna Marcenal foi a primeira vítima dessa perversidade. Crianças são assassinadas por espancamentos repetidos, ou por incestos praticados em abusos sexuais. Se não morrerem, biologicamente, morrem psiquicamente, moralmente, em opressão continuada, pelo estupro de sua dignidade. A indústria da alienação parental precisa de Crianças do grupo dos abastados. Não temos litígio iniciado por denúncia de maus tratos, violência física ou sexual quando a justiça não faz parte da ala privada. Por que não existe entre as Crianças “PPP”? Não se fala nisso, mas a lei de alienação parental, além de misógina, sexista, é elitista. Ela requer muito dinheiro para levar advogados e psicólogos ao fornecimento de petições e laudos, regiamente pagos, sempre, esses últimos que nem precisam da presença da alcunhada “alienadora”. Não há nenhum interesse em se averiguar a etiologia do termo. Sem cientificidade, mas gozando de uma aceitação dogmática na justiça privada. Alienação parental é dogma na justiça de família. Sua simples ameaça já imobiliza o protetor ou protetora da Criança, como instruiu seu inventor Gardner. Ele chamou essa estratégia de “terapia da ameaça”. Funciona como tal. Todos os que buscam a Proteção Integral da Criança, sabem que uma alegação de alienação parental tem um caminho muito curto e sem volta em direção à perda da guarda e entrega de sua Criança, como brinde, ao seu agressor. Crianças “PPP” morrem facilmente de tiro de fuzil. Mas não sofrem pela prática de alienação de suas mães. Crianças que não vivem em comunidades, morrem pela indignidade de violações de seus corpos, enquanto o silêncio e o dogma acoberta o predador. Umas e outras na nossa sociedade partida, sucumbem à violência de todos nós, os proativos executores e os omissos da barbárie que se escondem negando a responsabilidade que têm. Se há ausência de rastro das práticas libidinosas, meticulosa e propositalmente ocultas, desqualificamos o Relato da Criança que descreve com coerência e detalhes imagens que não podem constar de seu acervo mnêmico, porquanto seu desenvolvimento cognitivo não permite. Apreendendo o mundo pela experiência, ou seja por raciocínio concreto, a Criança refere a sexualidade masculina com a exatidão da experiência de ter vivido. Mas é desacreditada por completo. Afinal tem o termo de plantão, “mãe alienadora”, que varre o crime para baixo do tapete, reduzindo tudo a “conflito”. É a lei da mordaça. Henry foi morto por violência física de um adulto da “família”, com o conhecimento e o consentimento de outros familiares, que deveriam ser próximos, e das pessoas que faziam o papel de cuidadoras. Ninguém viu as marcas que ele exibia em seu corpinho ainda pequeno? Estamos eliminando nossas Crianças. Estamos mutilando as que escapam da morte física, aprisionando-as no ciclo da opressão. Uma Criança que vê a morte de outra de seu tamanho, ou que é testemunha de violência sexual do seu lado, tem um dano permanente em sua mente. Por que estamos desprezando esse sofrimento? Por que caímos na esparrela de achar que ela vai esquecer? Que elas vão esquecer? Onde se esconde o conhecimento técnico e teórico dos profissionais que deveriam garantir os Direitos Fundamentais?