segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes. Parte II

Como e por que matamos nossas Crianças e Adolescentes Parte II A cidade partida chora e sangra. Chora sem fazer barulho, é segredo de justiça. Sangra na invisibilidade só quebrada por breve tempo pelos gritos que clamam justiça. Mas são gritos que não são ouvidos. A instituição que detém o Poder protocolar dita que foi um confronto. Sempre. E segue executando a pena de morte em Crianças e adolescentes. No Grande Rio, já são 24 Crianças e Adolescentes. Em 7 meses e 20 dias, 24 pequenos foram mortos à bala aqui na nossa Cidade Maravilhosa e entorno. Crianças têm sido assassinadas por portadores de armas pesadas que não têm nenhum compromisso com o outro, qualquer que seja esse outro. No quarto, na sala, na garupa de uma moto, ontem no meio da rua. Poderia ser o roteiro de um filme romântico se não fosse mais uma tragédia. Um menino e uma menina voltavam da escola e se viram no meio de um tiroteio, hoje cotidiano no Rio de Janeiro. Eles se jogaram no chão, como todas as Crianças desse lado da cidade já aprenderam, e ele deitou por cima das costas dela para protegê-la. Levou um tiro nas costas. De fuzil. Morreu ali. A menina, protegida, não se machucou. Não no corpo. Mas será que conseguirá retirar esse corpo inerte, sangrando de suas costas algum dia? Assistência do Estado??? Como noticiam oficialmente: “não resistiu aos ferimentos”. Mas que ferimentos? Não resistiu a um tiro de fuzil? Protestos e o grito de “justiça”. Por onde a “justiça’ começaria a trabalhar num caso desses? Até a próxima Criança ser abatida e a mídia trocar o nome. Do outro lado da cidade partida quantas Crianças são molestadas por dia dentro de suas famílias? Nem sabemos. Os casos são subnotificados, e os que chegam a algum balcão, caem no “cofre boca de lobo”. Segredo de Justiça. A invisibilidade de Crianças e Mulheres vítimas da perversidade da lei que protege agressores já se tornou título de livro. Ontem me senti, confesso, constrangida. Fui convidada a compor uma Mesa de Conversa para comentar a exibição do Curta “Lei da Mordaça”, na Cinemateca do MAM aqui no Rio de Janeiro. Filme impactante na medida. Realista. Doloroso. Frustrante. Mas que mexe no âmago. Verdade da dor de mulheres que têm sido assaltadas em seu Direito de Maternidade, conferido pela Natureza a todos os mamíferos. É o Maternicídio. Hoje exercido pelo Estado. É estarrecedor ver, logo no início do filme, o registro do inventor do termo “alienação parental”, Richard Gardner, que a solução para as Crianças que resistirem a conviver com o genitor/agressor é a prisão delas. Sim, ele fala com todas as letras que depois de passarem um dia ou dois numa prisão, a Criança vai aceitar direto a convivência com o pai, e dá um sorrisinho. Em seguida ele acrescenta que também para as mães, que, passando uns dias encarceradas, faz com que desistam de continuar alegando abuso sexual ou espancamento do pai. Afirma como se estivesse indicando um “santo remédio”. Com sorriso sarcástico. Essas falas desse médico pedófilo que engendrou essa armadilha, que se tornou dogmática entre nós, para defender pais abusadores que o procuravam em busca de laudos para serem inocentados, se chocam com a cara lavada ao instruir que as Crianças que resistirem à convivência com seus agressores, devem ser presos, detidos em prisão. Não há nenhuma preocupação com a ausência de lógica nas afirmações que fomentadas por uma mente desse tipo, proliferaram ideias pseudocientíficas, fraudes pseudoteóricas, enfim, afirmações infundadas e insustentáveis, até mesmo no simples bom senso. Como se dar espaço para aberrações, e pior, passar a defende-las? O filme traz recortes de Audiências Públicas, falas de Técnicos e Juristas, e a Nara, uma vítima da lei de alienação parental, discorre, com clareza e lucidez ímpares, a barbárie institucional que conheceu. A Nara é um ponto crucial no roteiro muito bem construído. A agonia da impotência vai invadindo aquele que está assistindo o documentário. E a Voz das Burcas traz a realidade da mordaça. As manifestações, os gritos que clamam a devolução dos filhos retirados das suas mães, iguais aos gritos por justiça das mães que perdem os filhos para as balas de fuzis, e que também não são escutados. As luzes se acendem mostrando nossa vergonha, nossa raiva, nossa tristeza. E aí, ao vivo, as meninas que construíram aquele impacto se apresentam. Talvez a idade média da equipe seja 23 ou 24 anos. Meninas muito grandes! Fui tomada de uma espécie de constrangimento diante daquela juventude enquanto identificada com os inúmeros antigos que estão nessa indústria: como aquelas 6 grandes pessoas, terminando a faculdade, conseguiram captar o óbvio? Estudaram, buscaram verificar, se indignaram. Por que pessoas da minha idade e estrada não enxergam a realidade de aberrações e perversidades tão explícitas? Como, com tão pouca idade, elas têm responsabilidade humanitária, e bem mais velhos e muito “estudados” não se importam com o sofrimento pela Privação Materna Judicial que promovem? Crianças importam. Mulheres importam. Não podemos matar. Nosso profundo agradecimento a Isabella Vilela, Lygia Contin, Diana Lima, Gabriella Godoy, e Kaena Ramos. Vocês são inspiradoras! Obrigada muito pela alegria desse momento dos três tempos, o ontem, o hoje, o amanhã! Que alegria/força!

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