sexta-feira, 30 de junho de 2023

Ideias de pseudociência, por que é tão fácil vendê-las em nosso país? Parte II

Ideias de pseudociência, por que é tão fácil vendê-las em nosso país? Parte II A primeira resposta que me ocorre é a preguiça mental. A precariedade de uma aprendizagem solidificada na curiosidade em processo de pensamento lógico leva à busca por atalhos e abreviaturas de um caminho de aquisição de conhecimento que seja mais rico, que seja de qualidade. A escolaridade falhada, em qualquer formato de precariedade, vai interferir no desenvolvimento cognitivo, na capacidade de pensar, de supor, de questionar, de seguir critérios, minimamente, científicos. Não falo dos já famosos “dois lados”. Esse é um critério jornalístico, que é muito importante para expor um fato jornalístico. Na Ciência, qualquer que seja a área do Conhecimento, existem regras científicas, existem pesquisas, as quantitativas e as qualitativas, todas seguindo o rigor das leis científicas. Mas, entre nós, há uma verdadeira atração pelo pensamento mágico, fase do desenvolvimento cognitivo na infância. E as ideias de pseudociência, que são nutridas por esse tipo de pensamento, o mágico, o que não segue leis científicas, têm a preferência nacional. É mais fácil atribuir a algo que foi montado com enxerto de um conceito de uma Ciência, alguém já teve o trabalho de estudar e conceituar, fazendo parecer que seria “contíguo”, e que essa vizinhança lhe daria a confiabilidade da Ciência. Assim, a Física Quântica, por exemplo, tem sido assaltada no termo “quântico”. Sem nenhuma compreensão nem compromisso com a verdade científica, acrescenta-se quântico e quântica, como se fosse um adjetivo, a várias invenções que se pretendem científicas. Temos agora um monte de coisas “quânticas” para dar a impressão de coisa séria. A pseudotécnica de constelação familiar, por exemplo, se apodera de conceitos da Física Quântica, as Vibrações, como se fosse possível estender às pessoas o conceito científico que se refere a leis de dimensão nano. A Ciência e os Cientistas ainda estudam para descobrir uma partícula nano de átomo. Isto seria, aproximadamente, comparável a um grão de areia numa praia de 1.000 kms. E já falam de “vibrações morfogenéticas” que trazem a “comunicação” de antepassados que morreram a décadas, de até 5 ou 6 gerações anteriores. E essa “comunicação” trazida pelas “vibrações quânticas” explicaria a pedofilia praticada pelo pai contra seu filho/filha, sendo ainda a prova de que a mãe alienadora é a culpada pelos abusos. Ou explicaria a violência doméstica contra a mãe, culpada também por ser agredida, porquanto era um antepassado dela que tinha sido um homem violento no tempo do Império. Afirma-se que a pretensa técnica das constelações familiares, criada por uma pessoa bem controversa, tem a Física quântica em sua tese. Parece meio “viajante”, mas vale saber que essa ideia de pseudociência foi autorizada pelo CNJ para ser usada na justiça, no SUS, nas escolas. Não importa se não é científica, e menos ainda, se é perigosa para as pessoas que são submetidas por indução/imposição de um Operador de Justiça, assim como, sendo aplicada para diminuir as pilhas de Processos de Família, é praticada nas dependências de Fóruns em 50/60 pessoas ao mesmo tempo, rasgando o Princípio de Confidencialidade das matérias psicológicas dessas pessoas. Vou poupá-los da parte da opressão e humilhação que ocorre, com a obrigatoriedade do pedido de perdão, de preferência de joelhos, que é feito pela vítima ao seu agressor. Sim, é a inversão dos fatos referendado pela justiça, muitas vezes com a assistência ao vivo do magistrado, que se emociona com a perigosa catarse de cada caso encenado. Assim também a pseudociência que mantem a lei de alienação parental é sustentada por termos e ideias inventadas, preconceitos relativos à mulher/mãe, louca, histérica, vingativa, interesseira, inconformada com a separação, mesmo que os números de Feminicídio evidenciem que não são mulheres que matam porque não se “conformaram com o término do relacionamento”. Quem são? E as Crianças são fantoches de suas mães que conseguem, facilmente, implantar falsas memórias de abuso sexual em suas mentes. Essa falácia é impossível de ocorrer, porquanto a memória da Criança, de Zero a 11 anos, se processa pela experiência , ou seja, é pelo raciocínio concreto que se dá o desenvolvimento cognitivo. Que leigos imaginem que quando uma Criança de 3 anos relata uma ereção e uma ejaculação do seu pai em sua mãozinha, ou uma penetração digital anal dizendo que “foi lá dentro”, sejam relatos que a mãe implantou, possivelmente, pela implantação de um chip quântico, é só o que falta ser dito e acreditado, é lamentável, mas podemos entender, em parte, por falta de bom senso, de raciocínio lógico. A tal falta de aprendizagem de qualidade, a tal preguiça mental. Mas é inadmissível que pessoas que se sentaram em bancos de Universidade, que gastaram o dinheiro Público com esse Estudo, ou que a família pagou uma Faculdade de Ensino Privado, que essas pessoas nunca tenham ouvido nenhuma Teoria do Desenvolvimento Infantil, ou aberto um só livro de Psicologia, repitam esses disparates como se verdades científicas fossem. Praticam a Privação Materna Judicial. Praticam o Maternicídio. Praticam o Feminicídio e o Infanticídio. Há muitas Crianças pequenas que atentam contra a própria vida de maneira não exitosa, mas atentam. E muitas Crianças têm sido mortas pelos seus pais. Não é possível não suspeitar da intencionalidade da maldade, da perversidade. O motivo, portanto, é outro.

Ideias de pseudociência, por que é tão fácil vendê-las em nosso país? Parte I

Ideias de pseudociência, por que é tão fácil vendê-las em nosso país? Parte I Essa foi uma questão que ficou martelando em minha mente ao assistir a live da Dra. Gabriela Bailas, doutora com Pós Doc na Universidade do Japão, em Física Quântica, tem comunicação acessível e, por vezes, com humor, característica dos mais inteligentes. Em sua simplicidade de verdadeira cientista, Bibi, como permite que a chamemos, desmonta com precisão a Confusão de Línguas, conceito psicanalítico de Ferenczi, que tanto nos auxilia quando, diante de “falas” que misturam, aleatoriamente, sem nenhum compromisso com o propósito de um pretenso termo científico, surrupia um conceito de uma Ciência e a enfia numa falácia que subverte um processo cognitivo. Fica a confusão. Não sou cientista, gostaria muito, mas entrei no caminho clínico me profissionalizei na minha Ciência e no meu conhecimento, que além da parte teórica, é empírico, experiencial. Muitas vezes tenho passado pela experiência de constatar que algo que venho dizendo sobre aberrações cometidas legalmente, aparecem estampadas em bocas que querem o contrário, ou seja, a manutenção da aberração. Com uma sutil “mexida” linguística, quase imperceptível, aquela fala é levemente distorcida e toma corpo em discurso do outro lado da calçada. Será que eu disse isso? É angustiante tomar um susto dessa dimensão. A responsabilidade social é grande. Mas a Confusão de Línguas serve a esse propósito. Se quem fala determinada afirmação se sente confusa, imagino as pessoas que estão buscando conhecimento numa determinada área. E, o efeito? Tenho a forte impressão que tem sido exitoso. Por isso a importância da live da Bibi Bailas: “alienação parental: lei e pseudociência”. https://open.spotify.com/episode/7g19KuuMsCl7hltcYy9Y2r?si=THya7l43Q1O_uY0LdBglJw , se não errei alguma coisa na sequência. Também está no canal do Física e Afins do Youtube. Nessa live a Doutora em Física desmonta dogmas que têm sido responsáveis pelas maiores arbitrariedades “falando” pseudociência sem sustentação, nem dó, nem piedade com Crianças, condenadas, legalmente, ainda na infância à convivência com seu agressor. Com a perda da mãe. A Confusão de Línguas tem sido um fenômeno presente, além da retórica, em várias áreas de nossas vidas. Hoje, a convite da amiga Professora de Direito da Criança da Pós Graduação da UERJ, já aposentada, mas sempre ativa, e que escreveu o Prefácio do meu livro sobre “abuso sexual, uma tatuagem na alma de meninos e meninas”, fui a evento sobre “Adoção, Conquistas e Desafios”, foi falado, muito bem falado, um formato desse fenômeno. O racismo estrutural que acomete crianças filhas de pais de coloração diferente da delas. Muito comum, os dilemas para enfrentar o preconceito racial e as manifestações de bullying aumentadas em quantidade e em crueldade, explícita ou velada, pela característica diferente da criança. Como em todas as ocorrências de violência dos diversos tipos e nesses crimes contra Direitos Humanos, previstos nas Declarações Internacionais e Nacionais, na Constituição Federal, e no Código Penal, o mecanismo de defesa mais utilizado é o da negação. Ninguém assume ser portador de preconceito racial, de misoginia, de postura machista, de ser estuprador de Criança. A camuflagem do exercício da violência física - sempre culpa da mulher, da violência sexual - sempre culpa da mulher ou da Criança, acusada de ter seduzido o homem adulto, da violência psicológica - que a mulher e a Criança mereceram, da violência moral – aniquilando a mulher enquanto pessoa, da violência patrimonial – usada para mumificar quem pode denunciar crimes intrafamiliares, da violência institucional – induzindo representantes do Estado a calar a mulher e a Criança, da violência Vicária, ainda pouco falada, mas enormemente danosa, conhecida como violência por procuração, usada por grandes criminosos também que não sujam as mãos, nomeiam que as suja. Alguém já viu um agressor reconhecer que praticava violência? E a Sociedade, ela reconhece, por exemplo, que tem preconceito racial? Somos todos racistas em algum grau porque ele está escondido nas nossas raízes que, como no Segredo de Justiça, goza de prerrogativa de Segredo. Justificações e justificativas são ditas. E nos contentamos com a ausência de sustentação que siga o Princípio da Razoabilidade. Quando lemos o texto de uma jovem médica que evidencia a realidade da violência contra a Criança e o fato feminino, que alimenta índices de 3 Feminicídios por dia, e 1 estupro de Criança a cada 30 minutos parece escandaloso tal como foram escandalosas as matérias do Tle Inlerc0pt, retiradas do ar por uma operadora de justi§ça, sob uma alegação pouquíssimo convincente. Finalizamos com um trecho desse bonito e triste Artigo, que está na íntegra no meu blog www.anamariaiencarelli.blogspot.com “...Passamos um tempo compartilhando histórias, sempre chegando às mesmas conclusões - de que ser mulher só por já ser mulher é extremamente exaustivo. A maioria dos homens, até hoje, segue se sentindo no direito de nos assediar e nos agredir, verbalmente, emocionalmente ou fisicamente, em qualquer ambiente, com a certeza de impunidade. E falamos também sobre como é difícil pra nós levarmos isso adiante, prestarmos queixa, sabendo que, como sempre costuma acontecer, nossas queixas muito provavelmente serão subestimadas e menosprezadas, serão taxadas como exagero ou vistas como uma interpretação errônea, como sempre são. O homem sempre terá uma desculpa ou justificativa que será muito plausível aos olhos da sociedade machista que vivemos. Acaba sendo mais extenuante ainda tomar alguma atitude em relação a isso, e então simplesmente deixamos pra lá, avisamos as nossas para terem cuidado, e a vida segue correndo pra essas pessoas como sempre correu. Isso tudo já é tão claro na minha cabeça que é extremamente cansativo até pensar sobre isso e chegar a essa conclusão repetidas e repetidas vezes. Enfim, permanecemos nesse papo mais um tempo, lembrando e compartilhando histórias, de assédio e de outros tipos de violência que ocorreram conosco, com amigas e conhecidas nossas, todas sempre com scripts parecidos. Até que as histórias foram ficando mais cabeludas e eu acabei compartilhando sobre o abuso sexual que sofri na infância e falamos sobre como no mundo de hoje é extremamente difícil ter confiança em qualquer pessoa, haja vista todos os relatos que já ouvimos, já presenciamos e/ou vivemos. ... Com a bagagem enorme que a maioria de nós temos, como confiar em alguém sem suspeita, sem um grande sentimento de desconfiança envolvido? Somos obrigadas a viver em constante estado de atenção, não nos sentimos seguras em baixar a guarda. E isso é também uma forma de violência diária que vivemos. O nosso existir é por si só um fator de risco para sermos sujeitas a qualquer tipo de violência contra mulher, e viver alerta e com medo é uma agressão que infligimos a nós mesmas (pois o mundo machista nos obrigou a isso). E a cada agressão nova que vivemos, todo o resto que está no passado, que lutamos tanto para deixar adormecido, para seguirmos em frente, vem à tona novamente e parecemos voltar à estaca zero. Essas agressões podem vir em tantas formas... podem vir na piadinha machista “inócua”, podem vir na credibilidade/respeito maior que dão ao seu colega de trabalho homem, podem vir no simples ato de ignorar a opinião de uma mulher numa mesa de bar, de nos interromper quando falamos, podem vir na diferença salarial entre homens e mulheres, além das situações mais óbvias, como o assédio, como o abuso sexual, como o abuso/violência psicológica/emocional nos relacionamentos, como o estupro, como a violência doméstica... e, como isso tudo ainda não fosse suficiente, podem vir ainda pela culpabilização da mulher por parte do agressor e da sociedade por ter passado por alguma dessas situações. E não se enganem, todas essas micro e/ou macroagressões vão abrindo feridas em nós e cabe somente a nós cicatrizá-las, com a ajuda umas das outras. Estou num dia que precisava fazer esse desabafo e aproveito para dizer que, mulher, se não formos nós juntas por nós mesmas, ninguém será por nós. Assim se sedimentam condutas desrespeitosas/criminosas que também são sedimentadas pelas ideias de pseudociência. No próximo artigo vamos tentar pensar a venda áurea dessas ideias.

sexta-feira, 16 de junho de 2023

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte V

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte V. Perdi alguém. Mais um se foi. O Bola Preta. Também atendia por Bola, Bolota, Bolinha. Quando cheguei com ele, bebê, e ofereci para meu neto, vi um brilho naqueles 4 olhos, que nunca havia visto. Ali começava um amor. O menino se intitulou seu pai e insistia que o Bola era muito parecido com ele. O vínculo afetivo, pai e filho, estava selado. Mas o Bolota tinha aquela coceira nos dentes, e nada de saliências nos móveis sobreviveu. Amadureceu. Foi minha silenciosa companhia quando escrevi meu primeiro livro solo nas noites que varavam as madrugadas. O Bola deitava em cima dos meus pés enquanto escrevia no computador. Parecia entender que eu precisava de companhia, daquela presença silenciosa e calorosa. Como era importante aquele aquecer dos meus pés enquanto eu registrava as geleiras em avalanche dom comportamento de perversidade extrema que faziam parte da minha longa escuta profissional. O Bola parecia saber que me fazia bem. Envelheceu, mas nem tanto. Tornou-se um senhor calmo, fez novos vínculos, mostrando sua enorme capacidade de trocar afetos bons. Foi exemplar em distribuir amor. As Crianças se beneficiam muito desses afetos sem palavras. Os pets cumprem essa função de construir saudáveis vínculos afetivos para a vida toda. Com eles também, as Crianças experimentam as primeiras sensações e os primeiros sentimentos de equivalência dos laços familiares, não consanguíneos, mas muito sólidos. A boa paternidade não carece de título, de “Direitos”, de litígios judiciais. Precisa, primordialmente, de afeto de qualidade, de empatia, de cuidado, de responsabilidade, e de respeito pelo outro. Muito erramos quando atribuímos itens ao vínculo que não pertencem ao mundo dos afetos e não da convivência tornada quase métrica. Nesse momento de luto, penso também no que tem acontecido em nome do dogma judicial da alienação parental, acusação, frequentemente, atribuída às mães. São afastadas como se fossem de alta periculosidade. Quantas Crianças, além da Privação Materna Judicial, determinada por essa lei, sofrem também com a Privação de seus bichinhos de estimação? São entregues aos genitores sem levar nada de suas vidas. Seus afetos em bichinhos, em objetos, em roupas, em cheiros e luminosidade dos espaços da moradia de até então. É uma espécie de “nudez afetiva” a que são obrigadas, o que lhes aprofunda a sensação de desamparo daquele momento que não alcançam a compreensão. É preciso entender que isto tem um objetivo: fazer um corte profundo para que a Criança esqueça tudo que está associado à mãe. Isto é muito cruel com os pequenos. Quem se importa com o sofrimento da Criança quando se estabelece esse terreno pantanoso que prescinde de todas as evidências de uma outra coisa? A mãe é louca, ressentida, tem depressão, esquizofrenia, é mãe narcisista – o mais novo disparate da ignorância conceitual reinante – como se fosse possível essa mistura de diagnósticos. Vemos hoje processos de “guarda compartilhada de pets”, porque as pessoas se lembram que o cachorrinho ou o gatinho sentirá a falta daquele que se separou da casa. Mas ninguém pensa que uma Criança que passa a viver a Privação Materna Judicial, imposta pela lei de alienação parental, perde também esse afeto. O bichinho de estimação carrega grande representação, é fonte de importantes experiências afetivas na infância. É um equívoco basal achar que esse campo afetivo é substituível. Ter duas casas, como é comum ser falado, não é vantagem. Ao contrário. É um estímulo à desorganização interna. A mente da Criança necessita de limites, de repetição das mesmas coisas, de mesmice num determinado perímetro psíquico. Ou seja, ter duas casas é como não ter nenhum lugar seu. Assim podemos avaliar a dimensão do perder a sua casa, suas coisas, seus cheiros, seu bichinho, sua mãe. Perder seu Pet é um luto sem morte. Quantas vezes uma Criança pronuncia a palavra mãe por dia? Abortar, abruptamente, essa necessidade de falar o nome da mãe imprime uma dor calada e não localizada. Mas, profundamente, sentida.

domingo, 11 de junho de 2023

Os bastidores da série censurada pela justiça.

Sábado, 10 de junho de 2023 Os bastidores da série censurada pela justiça Repórter do Intercept conta detalhes da investigação "Em nome dos pais". No dia 27 de abril deste ano, o Intercept publicou a primeira reportagem da série "Em nome dos pais". Um material jornalístico cuidadoso assinado por mim, Nayara Felizardo, e que resultou em quatro matérias e um documentário sobre o tema da alienação parental. Um mês e três dias depois da primeira matéria ir ao ar, a juíza Flávia Gonçalves Moraes Bruno, da 14ª Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro, ordenou que todo o material fosse retirado do nosso site e também das redes sociais, sob multa de R$ 30 mil em caso de descumprimento. A ação foi movida por um homem que nem sequer foi citado em nenhuma das nossas reportagens. Ele alegou que nosso documentário exibe documentos sigilosos que expõem uma criança – o que, de maneira alguma, é verdade. Por isso, eu resolvi abrir aqui como foi o processo de produção, investigação e escrita desta série, mostrando todo o rigor, cuidado, preocupação e quantidade de pessoas envolvidas numa investigação tão importante como essa – que se dispôs a revelar nomes de juízes, desembargadores promotores, psicólogos e assistentes sociais que aplicaram a Lei de Alienação Parental para, em alguns casos, livrar acusados de estupro de vulnerável ou violência doméstica. Ainda por cima tiraram de mães a guarda dos filhos para entregá-los justamente aos pais denunciados por estes crimes. Comecei a investigação como todas as outras que já fiz: estudando muito o assunto. Um ano depois, tenho mais de 200 arquivos salvos. Recebi a pauta da editora Bruna de Lara. Inicialmente, era para ser uma reportagem simples sobre o lobby que alguns homens fizeram no Senado para retirar artigos de um projeto de lei que modificaria a Lei de Alienação Parental e poderia prejudicá-los nos processos judiciais que enfrentavam. Depois de estudar o assunto, vi que tinha uma história bem maior diante de mim. A Lei de Alienação Parental tem como base a pseudoteoria de um médico que fazia laudos para defender pedófilos. Voltei à minha editora e pedi mais tempo. Já tinha feito algumas entrevistas quando outra editora, Tatiana Dias, me encaminhou um e-mail. Ela nem sabia, mas aquela história repetia praticamente o mesmo script das outras que eu estava ouvindo: uma mãe é acusada de alienação parental depois de denunciar o ex-marido. A partir de então, as informações chegaram como uma enxurrada. Percebi que uma reportagem não daria conta de todas as denúncias. Entrevistei cerca de 30 pessoas diferentes. Com algumas delas, conversei por vários dias. Por último, me debrucei sobre os processos. Apenas um deles tinha mais de três mil páginas e eu o li na íntegra. Os outros também eram bem longos. As disputas judiciais levam anos e tudo fica arquivado. Eu precisava ver tudo para entender muito bem o que tinha acontecido em cada caso. De 18 casos que investiguei, utilizei 11 na série "Em nome dos pais". Decidi que só escreveria sobre o que tivesse exames, laudos e depoimentos das crianças, sobretudo se a acusação fosse de abuso infantil. Se fosse outro tipo de acusação, isso também ficaria muito claro na reportagem. Só fazia sentido tratar de um assunto tão sensível se eu tivesse provas de que uma grande injustiça estava sendo praticada. Depois da investigação e do extenuante trabalho de escrita, que envolveu uma filtragem especial para evitar exposição das crianças e adolescentes, começou o trabalho de edição. Minha investigação foi detalhadamente escrutinada por, ao menos, dez pessoas diferentes – a quem tive que mostrar os documentos e provas que usei para embasar o que estava escrevendo. Primeiro, três editores se debruçaram sobre a apuração, questionando cada detalhe do que eu tinha escrito. Vencida essa etapa, foi a vez de ser sabatinada pela checagem. Poucos veículos têm um procedimento tão rigoroso. Nós, repórteres do Intercept, precisamos mostrar para os checadores de onde tiramos até as vírgulas do nosso texto. Ter feito o fichamento dos processos, marcando as páginas em que estava cada informação, fez toda diferença nessa etapa. Os checadores conferiram os documentos e ainda fizeram pesquisas complementares para ter certeza de que não havia qualquer sinal de viés de confirmação – ou seja, evitar de toda forma que eu estivesse interpretando, apurando ou escrevendo com base em hipóteses estabelecidas inicialmente. Por fim, nossos advogados também analisaram detalhes dos processos, sempre respeitando nossa liberdade editorial. No entanto, quando eles identificam imprecisões, são enfáticos pedindo alterações para evitar que erros sejam veiculados nas reportagens. É por tudo isso que a censura imposta às reportagens e ao documentário é inaceitável. Nenhuma linha dessa série seria publicada sem que seu conteúdo fosse aprovado em todas as minuciosas etapas que envolvem uma grande investigação do Intercept. Jornalismo investigativo, que afronta poderosos e traz à tona verdades inconvenientes, se faz com coragem, mas sobretudo com método e seguindo critérios estabelecidos, além de um esmero obstinado em cada etapa de trabalho. Nessa série, por tratar de conflitos envolvendo crianças e adolescentes, os níveis de exigência de toda a equipe foram elevados à máxima potência. É por isso que nós, do Intercept, entendemos que essa é uma decisão judicial absurda e abre precedentes para censurar outros materiais jornalísticos de igual relevância e fundamental interesse público. Não nos calamos e nem vamos nos calar. Nosso trabalho é sério e respeitoso. E precisa ser respeitado! Nayara Felizardo Repórter Lutaremos até o fim para reestabelecer a publicação de nossas reportagens censuradas – e iremos até o STF se for preciso. Apoie agora o fundo de defesa legal do Intercept para que essa batalha não seja desigual! AJUDE O FUNDO DE DEFESA LEGAL DO INTERCEPT → Nosso e-mail é: newsletter@intercept.com.br Acompanhe o TIB nas redes sociais: Facebook Twitter Instagram YouTube Este e-mail é um canal importante para conversarmos com nossa comunidade, mas se você mudou de ideia e não quer receber nossa newsletter, clique em cancelar a inscrição. Essa ação é irreversível.

sexta-feira, 9 de junho de 2023

CONSTELAÇÃO FAMILIAR: UMA PRÁTICA PERIGOSA • Física e Afins

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte IV

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte IV Há alguns dias fui perguntada numa entrevista para Rádio e TV aberta, Programa “Gente que Fala”, sobre a melhoria do Brasil no item “resposta” de combate de abuso e exploração sexual de crianças e Adolescentes. Teríamos passado do 13º para o 11º lugar num desses rankings da vergonha. Melhora, aliás, acompanhada pelo 5º lugar em Feminicídio. Como compreender uma melhoria se a cada dia mata-se mais mulheres, estupra-se mais Crianças? Não é difícil entender que se os casos de abuso sexual foram banidos dos laudos sentenciais de peritos que, partindo de uma acareação entre a Criança e seu agressor/ violentador, que concluem sempre que constataram pelo olhômetro dessa acareação que a Criança não foi abusada, conclusão através da visão ocular, e que, portanto, seguindo a seita reinante, trata-se de atos de alienação parental da mãe, evidentemente, o número de abusos sexuais foi drasticamente reduzido. Assim se obtém uma fictícia “melhora” no ranking que mede a resposta a esse problema. Hoje, compus a Mesa do Seminário: “Combate à Exploração e Abuso Sexual contra Crianças e Adolescentes, em Homenagem à Memória de Araceli Crespo e Joanna Marcenal”, no Auditório Nereu Ramos da Câmara Federal, em Brasília, e escutei, e compartilhei conhecimentos empíricos e compilados em dados estatísticos, pronunciados por incansáveis trabalhadores desse combate. Brilhantes, mostravam a convergência de algumas iniciativas públicas, que ainda não podem a ser chamadas de políticas públicas, porquanto o esforço desses trabalhadores não conseguem transpor os grandes muros que protegem indivíduos que lucram com o sofrimento de Mães e Crianças, aniquilando a infância, promovendo a curva crescente dos Feminicídios. Araceli, aos 5 anos de idade, há 50 anos, foi, cruelmente, estuprada, torturada até a morte, e os supostos autores foram inocentados. Todos. Só Araceli foi condenada a restar presa para sempre em seu túmulo. Joanna, aos 5 anos de idade, há quase13 anos, foi entregue, judicialmente, a seu pai sob alegação do termo alienação parental da imputado à mãe, porque a lei de alienação parental foi votada e promulgada 15 dias depois. Henry, aos 4 anos de idade, há 2 anos, teve 23 lesões pelo seu corpinho, externas e internas, que o levaram a óbito. Morava na casa de seu padrasto e sua mãe. Ensejou com sua tragédia a Lei Henry Borel que prevê a Responsabilização das pessoas do entorno, família extensa, professores, médicos, etc., nos casos de violência física. Quênia, aos 2 anos de idade, há 2 meses, morreu com 59 lesões distribuídas em menos de um metro do seu pequeno corpo. Lesões de várias idades, recentes e antigas, incluindo evidências de estupros. A Lei Henry Borel e o ECA, e o Código Penal, e a Constituição Federal, já estavam em vigor. Ela morava com o pai e a madrasta. Estava frequentando a creche, ainda usava fraldas e adultos lhe faziam a higiene e davam banho. Ninguém viu nenhuma das 59 lesões? Não é difícil olhar a ineficiência de leis escritas como sendo uma premissa que estimula mais a transgressão do que seu seguimento. Se somarmos os Tratados Internacionais, as Cartas de Direitos Humanos, as Resoluções de Conselhos, temos um número bem grande. Neste tema, por exemplo, é amplamente sabido que a Criança é Sujeito de Direito, que ela deve ser Protegida em sua Vulnerabilidade, e Operadores de Justiça lançam mão de práticas de tortura usadas em porões, já combatidos, acreditando em mágicos poderes, para seguir o dogma da alienação parental, subtraindo o crime que é travestido em simples conflito familiar. Onde vamos parar com essa permissão ao incesto? Curiosamente, para ser delicada, a lei de alienação parental é rigorosa e ininterruptamente aplicada. Em inexplicável malabarismo jurídico, o mesmo objeto que embasa o processo de família, o afastamento do genitor promovido pela mãe, alcunhado de alienação parental, é possuído pelo Estado, através do Sistema de Justiça, que determina o afastamento total da mãe. É o mesmo objeto. Foi assim que a mãe da Joanna foi afastada, determinação de uma Juíza. Uma Juíza. Por 90 dias a mãe foi proibida de ver e até de falar pelo telefone com a Criança de 5 anos que pouco tinha convivido com o genitor ausente por muito tempo. A terminologia foi usada para justificação dessa Privação Materna Judicial letal. Temos visto aberrações em alegações de alienação parental que retiram bebês lactentes, promovendo o desmame traumático. Até mesmo uma mãe, ainda grávida foi acusada de alienação parental. A alienação parental serve para afastar a mãe de Crianças que ainda não adquiriram a linguagem, portanto, não compreenderiam a tal “campanha” contra o genitor. O que dizer do bebê ainda em vida intrauterina. No entanto, Crianças que descrevem através de palavras, com detalhes, os atos libidinosos praticados em seu corpo pelo genitor, são desconsiderados seus relatos sob a alegação que não são confiáveis. Parece que a testosterona faz a diferença. Violência institucional e violência de gênero. E quando um jornal de grande competência, após mais de 1 ano de investigação, expõe essas atrocidades, uma juíza retira do ar. Por que será? Uma juíza. Em tempo, há justos na Justiça.

A PROIBIÇÃO DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR

sábado, 3 de junho de 2023

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte III

Pai, genitor, padrasto, avô, tio, e suas Crianças. Parte III Quem inventou que uma Criança vítima de Abuso Sexual Incestuoso, ou Violência Física, ou Violência Doméstica contra sua mãe, vai se beneficiar da convivência com este genitor agressor? Onde está escrito e fundamentado tamanha aberração ilógica? Qual é a teoria científica sustenta essa pretensa premissa? Gardner, o inventor do termo alienação parental, afirmou por escrito que a Pedofilia é benéfica para a Criança. Nas páginas 24 e 25 de seu livro “True and Falses Accusations of Child Sex Abuse, ele escreveu: “as atividades sexuais entre adultos e crianças são parte do repertório natural da atividade sexual humana, uma prática positiva para a procriação, porque a pedofilia estimula sexualmente a criança, torna-a muito sexualizada e fá-la ansiar por experiências sexuais, que redundarão num aumento da procriação”. Essa é a transcrição da tradução da Juíza do Tribunal Constitucional de Portugal, Dra. Clara Sottomayor, publicada em seu livro Temas de Direito das Crianças. Defendendo, abertamente, a pedofilia como sendo uma prática natural, Gardner, visando inocentar pais acusados de abuso sexual de seus filhos, engendrou essa estratégia jurídica para inverter os lugares. Com a acusação, que ele recomenda seja imediata, de atos de alienação parental da mãe, ele dá essa instrução para livrar esses genitores do crime contra a criança, acendendo holofotes em cima da mãe que fez a denúncia. Seu plano foi muito exitoso. Muitos países montaram uma lei de alienação parental, mas todos revogaram essa lei em prazos pequenos de vigência. O Canadá, por exemplo, teve a lei por apenas 1 ano. Só no nosso Brasil ela segue, e já foi inclusive piorada com um remendo, a lei 14.340/2022, sob alegação de “aprimoramento”. Essa lei carrega um vício de origem. No entanto, a terminologia continua a ser usada em toda parte. Recentemente, a Espanha promulgou a Lei Rhodes que proibiu o uso da alienação parental como argumento processual, baniu a terminologia e correlatos. Mas a luta está sendo travada ainda, apesar da proibição. É esperado que o choque causado pela repugnância à quebra da interdição ao incesto, sugira um mecanismo de defesa mental, a negação. A impotência diante de um abuso sexual incestuoso é da ordem do insuportável para muitos. Muito mais fácil apontar para a mãe como mulher ressentida, vingativa, interesseira no dinheiro do ex. Se um abuso sexual intrafamiliar requer provas materiais, dificílimas de serem obtidas, a alegação de alienação parental só precisa de uma citação de uma “perita psicológica’ ou da voz com o timbre da testosterona. Só. A fragilidade da argumentação de técnicos que defendem a lei de alienação parental como se proteção à Criança fosse, se inicia pela redução do crime a conflito familiar, claramente interessados em sentir a ilusão da “solução”, nadando em prazer de Poder grandioso, sentenciando para os juízes o afastamento da mãe. A alegação de gravidade de uma violência psicológica e uma coação moral fornecidas pelo ato de alienação, parece esquecer que o abuso sexual incestuoso, além da violação do corpo e mente da Criança, igualmente é praticado com o acompanhamento de imensa violência psicológica e desastrosa coação moral. Ou não? Será que falta estudo ou sobra intenção? A mim me parece que essa indagação também serve para a questão da divulgação de uma confusão de nomenclatura. Quando se divulga, por exemplo, o conceito de Escuta Especial, Metodologia específica para crianças vítimas de violência sexual, (leia-se violência sexual que se refere a qualquer ato libidinoso), descrevendo uma atitude técnica referente à atividade lúdica, fica evidente o desconhecimento da Metodologia, teoria e técnica, que fundamenta a Escuta Especial, também conhecida como Escuta Protegida. Assim também quando é descrita a “sala de espelhos”, chamada por alguns de “Câmara de Gesel”, sala já ultrapassada pelo estudo científico que apontou falhas em seu uso para a Criança vitimada sexualmente. Ela era usada no que foi denominado “DSD, ou depoimento sem dano”. A mudança científica para o conceito de escuta se deu pela constatação que a postura inquiridora, o mal estar causado por uma parede de espelho que não permitia à Criança saber se o pai estava ali, a interferência das pessoas da Justiça, inclusive o suspeito, ali atrás do espelho fazendo a “direção de um setting” dito da Psicologia, a sequência de perguntas dirigidas sem nenhuma preocupação com o medo, o constrangimento, a vergonha, até a consequência traumática, causavam revitimização, e permaneciam na subjetividade de adultos despreparados que desembocavam em vereditos que muito se afastavam do Melhor Interesse da Criança. Misturar conceitos e metodologias tão distintas, causa uma confusão até mesmo nos profissionais da área. A Escuta Especial foi construída ao longo de mais de 4 anos de estudos e pesquisas, cuidadosamente voltada para o bem estar da Criança em momento tão, especialmente, delicado e doloroso e sua saúde mental que lhe restou após o trauma continuado do abuso sexual incestuoso, praticado pelo seu genitor. Pai não abusa de filho.