quinta-feira, 25 de agosto de 2022

Como cresce uma Criança? Parte VII

Como cresce uma Criança? Parte VII O desenvolvimento afetivo tem sido muito estudado por grandes teóricos da Psicologia e da Psicanálise. Os enfoques são variados, mas o ponto comum a todos é a condição relacional. Ou seja, todos, todos, pensam as teses e teorias dentro da relação primordial, a relação que traz o vínculo visceral pela condição essencial da vida intrauterina, que se transforma em afetivo. Muito banalizada, mas é a preparação para a tendência ao apego, ao afeto, a primeira moradia do ser humano imprime a modalidade da importância do outro, desse caráter do processo de humanização, iniciado nesse ambiente aquático e escuro, mas não silencioso. Esses barulhos, os pulsantes e os digestivos, e batidas ritmadas, as cardíacas, as vibrações sonoras da voz, vão se tornando, por alguma possibilidade rudimentar, reconhecidos como asseguradores de uma continuidade indispensável à pavimentação da estrutura da mente. O que nos parece uma espécie de nirvana, não creio que seja, mas, certamente, uma modalidade de vida bem mais protegida, quando as condições são adequadas, é interrompido com o parto. Situação brutal para mãe e bebê. Separação com dor para mãe e bebê. Muito provavelmente, esta é a mais intensa vivência de angústia de desamparo, por excelência. Sabemos que o bebê humano nasce muito incompleto em vários de seus sistemas, necessitando por bons anos que adultos, do seu entorno, lhe garantam a sobrevivência. Mas, por vezes, esses bebês, por alguma razão, nascem com maiores dificuldades ainda de sobrevivência. Os nascimentos prematuros trazem grande risco à vida dessas Crianças. Os cuidados são redobrados, e até algumas décadas, eles eram separados de suas mães para que procedimentos hospitalares fossem praticados para a manutenção de suas vidas, iniciadas débil e precocemente. Na década de 80, um médico, Edgar Rey Sanabria, professor de neonatologia e pediatria do Instituto Materno Infantil de Bogotá, na Colômbia, alarmado com a taxa de mortalidade de bebês prematuros em seu hospital, inventou o Método Canguru para atender essas Crianças. Com a escassez de incubadoras, e de atenção especializada de médicos e de enfermeiros, comovido com o drama de mães e bebês que se perdiam, mutuamente, construiu um conceito de cuidado de contato pele-a-pele para os pequenos prematuros ou de baixo peso. Defendeu que para além da assepsia, das contaminações e dos aparelhos, os bebês precisavam do colo aconchegante da mãe, para mantê-los quentinhos e para estimular a amamentação. Outro fator muito importante é que essa proximidade proporcionada pela bolsa canguru, dentro das instalações da Pediatria Neonatal dos hospitais, faz com que a mãe perca o medo de lidar com a fragilidade de seu filho, que tanto interfere na relação afetiva que está em curso. Os bebês prematuros precisam mais ainda de suas mães. E de afeto. Além disso, se o bebê necessita de oxigênio, por exemplo, pode receber através de uma pequena máscara, sem precisar ser isolado numa área de cuidados intensivos. O sistema de regulação térmica, muitas vezes precário nos prematuros, se desenvolve pelo contato continuado com a temperatura constante do corpo da mãe, de maneira tão adequada quanto a temperatura fornecida pela incubadora. Também o custo desse método é um fator importante. A bolsa canguru, confeccionada em tecido fica muito longe dos custos de uma incubadora com todos os seus requisitos e manutenção. A relação é de alguns reais contra alguns milhares de reais. O método reduziu a mortalidade dos bebês, assim como reduziu, em média, em 10 dias a internação dos bebês, e se mostrou mais eficiente na aquisição de peso, no desenvolvimento físico, e mental, com o vínculo materno muito favorecido pela proximidade mãe-bebê. Validado cientificamente, o método chegou ao Brasil, e foi implementado em 1997, sendo oficializado dez anos depois como política pública com a publicação de uma portaria do Ministério da Saúde. Mas, apesar de apresentar muitos benefícios para os bebês e suas mães, não foi bem recebido pela comunidade pediátrica. Entre nós, algumas maternidades, poucas, passaram a adotar esse conceito médico-psicológico. O Método da Mãe Canguru, MMC, nasceu de uma empatia de um médico, que se comovia com o sofrimento de mães ao serem afastadas de seus bebês super frágeis, logo após um nascimento antecipado, com todo o arsenal de culpas e de impotência que as invadia. Excluídas dos cuidados de seus bebês, com o método da mãe canguru, voltam ao devido protagonismo ao terem seus bebês colados ao seu peito. Mas, por que será que esse método não é predominante nas maternidades? O afeto do dr. Edgar que mobiliza o afeto da mãe, estimulando o afeto do frágil recém nascido que precisa lutar mais ainda pela sua vida, por que não facilitar essa cadeia afetiva? O afeto é simples e complexo. Não é visto, é sentido. Sua falta, traz prejuízos, e pode ocorrer também na presença. A má qualidade, igualmente, produz sofrimento e marcas. Os tempos de ausência afetiva, assim como as intensidades de afetos patológicos deformam e adoecem a mente. Mas, os bebês e as Crianças têm grande plasticidade e tolerância, são capazes de fazer, de maneira saudável, uma boa substituição.

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

Como cresce uma Criança? Parte VI

Como cresce uma Criança? Parte VI O afeto é, pois, o combustível essencial para impulsionar o motor da aquisição das competências que humanizam os bebês. É o afeto, e, essencialmente, o afeto que torna o homem passível de socialização e de civilização. Observamos afetos in bruto em animais, em especial nos mamíferos. É um próton afeto, em geral, relacionado à preservação da espécie. Um cuidado na amamentação dos filhotes, na proteção diante de perigos para os pequenos. E, entre os animais humanizados, nossos pets, é possível constatar um afeto, muitas vezes, até incondicional. Histórias bonitas chegam a afirmar que esse seria o melhor afeto do mundo, que supera qualquer afeto entre humanos. Se considerarmos a desigualdade de autonomia e liberdade entre homem e bicho de estimação, poderíamos até concordar. No entanto, o afeto saudável é bem mais amplo e prevê justas condições. A primeira relação afetiva é construída na amamentação. Como já dissemos, anteriormente, a necessidade de receber alimento está prevista em dois tipos de alimento: o nutriente, que é o leite materno, e o afeto. Na última semana, reportamos o experimento do fisiologista Harlow que constatou a importância do afeto, no caso dos bebês chipanzés órfãos, chegando a contrariar o comportamento instintivo da preservação da espécie ao comprometer a vida para permanecer no aconchego de um colo macio. Spitz se inspirou nessa observação e explicou o quadro de autoabandono em crianças internadas e separadas de suas mães. Denominou de Hospitalismo o mesmo comportamento depressivo em crianças com desinvestimento no mundo e seus estímulos, motivado pela ausência do cuidado materno, de tal ordem que comprometia, severamente, a saúde da criança. O corpo a corpo entre bebê e mãe é o alicerce da estrutura psicológica das crianças e, depois, das pessoas. E o início crucial é a amamentação. Fixar os olhos nos olhos da mãe enquanto mama, enquanto mantem a mãozinha pousada em seu seio, para algum tempo depois, segurar o indicador da mãe durante todo o ritmo coordenado entre o respirar, o sugar e o deglutir, constitui uma ação bem orquestrada quando a relação mãe-bebê está sendo bem construída. Esse olhar do bebê é encantado e encantador. Movido pelo afeto, ele alimenta a interdependência da mãe e do filho, um depende do outro, afetivamente. A mãe se vê, cada vez mais, envolvida pela responsabilidade de sustentar aquele ser frágil. O bebê necessita do nutriente mãe. Ele não tem clareza de cognição ainda, mas ele sente, momento precursor do pensamento, que está requerendo o cuidado necessário. Esta troca de olhares, com o acompanhamento da sensação tátil do tocar a pele da mãe, assim como, da sensação olfativa de seu cheiro, fazem desses momentos de amamentação tempos de crescimento seguro e prazeroso. É um ato de várias músicas. E precisa ser bem vivido para que cumpra sua função estrutural no desenvolvimento afetivo. Portanto, não é difícil pensar que esses tempos de conexão mãe-bebê devem ser respeitados e esperados, para que satisfação. Uma fase mal preenchida, irá acarretar uma falha que será rolada por todo o desenvolvimento, afetando também os outros vetores do desenvolvimento. Como já dissemos, o afeto é o combustível para toda a saúde de desenvolvimento. Assim, o que pode ser visto como falha não se esgota na ausência total de um bom cuidado. A falta de afeto assim como a precipitação na interrupção de uma necessidade afetiva de um bebê, são danosas. Permitir que uma mãe cumpra essa primeira etapa de dependência absoluta do bebê, dando-lhe suporte e acolhimento ao seu cansaço, é fundamental. Por vezes, a mãe é criticada por alguém daquele núcleo familiar, forçando a separação da dupla, precocemente. Isto pode provocar uma falha, o bebê é empurrado para uma fase que ele não está amadurecido para encarar, o que acaba por provocar uma certa cronicidade daquele estágio de dependência, desarmonizando seu desenvolvimento e atrasando suas aquisições. Bowlby lançou um olhar sobre essa fase inicial do bebê, e nos ensina sobre a importância do apego, a dor da separação e a angústia. Mahler, observou a dependência absoluta se movendo para a dependência relativa em busca da autonomia. Winnicott nos ofertou o conceito de objeto transicional, que nos dá a compreensão do processo que o bebê vive com seu ursinho de pelúcia, ou com seu paninho de dormir, um objeto que dá segurança a ele porque tem parte da realidade, parte dele, e parte da mãe, em seu simbolismo, permitindo que se encoraje em se afastar da mãe com a segurança desse significado. Se o afeto primário precisa ser da mãe, não esqueçamos que o vínculo afetivo com a mãe é visceral, há um certo reconhecimento tranquilizador de impressões corporais deixadas pelo período intrauterino, a plasticidade afetiva de um bebê vai dando permissão à diversidade de pessoas constantes em seu mundo. E, todos esses outros afetos, aos poucos permitidos, são muito importantes em seus papéis específicos ou no papel de substitutos, também muito saudável. Afago é afeto. Cuidado é afeto. Balanço é afeto. Limite é afeto. Responsabilidade é afeto. Estimular o crescimento é afeto. Mas, com segurança.

domingo, 14 de agosto de 2022

Como cresce uma Criança? Parte V

Como cresce uma Criança? Parte V A aquisição da linguagem é todo um processo de muita complexidade que envolve vários sistemas e outros vetores do desenvolvimento. A palavra, falada e escrita é um diferencial da espécie humana. A palavra é a tradução de emoções e pensamentos que apontam para o marco civilizatório. A habilidade com as palavras equivale à destreza dada pela aquisição psicomotora da pinça fina, a oposição do polegar ao indicador que se inscreve, como já abordamos, na escrita, na arte, na medicina. Com as palavras progredimos na Comunicação enquanto Cultura Oral. As palavras vão preencher, com rigor, o conteúdo da Ciência, vão encenar os conflitos e as dores humanas no teatro, e vão dar asas infinitas para os voos da Poesia. A Música é uma outra forma de linguagem que expõe emoções e sentimentos. As notas musicais, os compassos que trazem a matemática das divisões em espaços, contam sonhos e tragédias, tristezas e alegrias, que nos invadem. A Poesia, aplicada às notas musicais, relata contemplação, amores felizes e amores sofridos. São línguas eloquentes. A História se encarregou de trazer método e muitas regras gramaticais para as línguas. Mas muitas sociedades tiveram e algumas ainda têm línguas orais e só orais. Entre nós, temos a equivocada impressão que o Português Brasileiro é nossa única língua. Mas existem 180 idiomas falados pela nossa população indígena. Lamentavelmente, se aproximam cada vez mais da extinção pelo desprezo nutrido de preconceito por se imaginar que só é bom o que é enquadrado nas regras formais. E a comunicação com sua importante função humanitária, é detonada. Assistimos, atualmente, ao reducionismo linguística. A “língua tecnológica” que vem das teclas mudas, do celular, do computador, (isso que estou vivendo nesse minuto), aponta, ao mesmo tempo, para o distanciamento e a aproximação entre as pessoas. A morte da linguística em sua imensidão de possibilidades, ocasionada pelas abreviaturas e pela ausência de regras gramaticais, campo onde vigora uma espécie de vale tudo da capacidade de se expressar, trouxe um empobrecimento. A comunicação entre pessoas que pertencem a um grupo que domina essa nova tecnologia digital tirou o som das vozes e as emoções das entonações, variação do sussurro ao grito. Valorizando os avanços, nem sofremos, mas, perdemos. E, se o desenvolvimento da linguagem é tão complexo e extenso, assim como o desenvolvimento cognitivo, o desenvolvimento afetivo é ainda mais complexo. Muitos são os teóricos da Psicologia e da Psicanálise, que se debruçaram sobre ele, porque é fundamental a sua importância para a efetivação de todos os outros vetores de crescimento. Sem ele, os outros aspectos serão, severamente, comprometidos. É o afeto, o recebido, o retribuído, que mantem todas as aquisições humanas, de todas as ordens. O bebê humano nasce com necessidade de dois alimentos: o nutriente e o afeto. O leite materno é, por excelência, o nutriente preferencial para a saúde do bebê. O afeto é o caldo que repercute o cuidado que garante a sobrevivência, tanto quanto o nutriente. O afeto é alimento, também. René Spitz, chefe da Enfermaria de Pediatria no Sistema de Saúde em um hospital em Paris, começou a observar que Crianças que eram internadas para algum tratamento, cínico ou cirúrgico, (à época não era permitido que a mãe fosse acompanhante), se ressentiam tanto da ausência da mãe que, mesmo cuidados com conforto, boa alimentação e higiene adequada, entravam em processos regressivos, apresentavam retraimento no contato com a equipe, e iam perdendo as aquisições de desenvolvimento já conquistadas. Preocupado com alguns casos em que esse comportamento de se ausentar do convívio, da troca até de olhares com as pessoas que se encarregavam dos cuidados necessários, era possível constatar que algumas Crianças eram acometidas de maneira severa. Algumas apresentavam uma verdadeira “retirada” do mundo, se ensimesmavam, recusavam a alimentação, entravam em processo de caquexia, chegando até ao óbito. Nem mesmo os cuidados “corretos” necessários conseguiam estancar a derrocada daqueles pequenos, ali dentro de um hospital. Intrigado, Spitz foi buscar no estudo feito por um Fisiologista, Harlow, que descreveu uma experiência com chipanzés recém-nascidos que tinham ficado órfãos por ocasião de seus nascimentos. Harlow construiu numa grande sala uma macaca confeccionada de arame e que tinha, numa das mãos, uma mamadeira onde havia leite à vontade. No outro lado, construiu uma macaca feita de trapos de tecido, lãs, um colo, mas não tinha leite. Os pequenos chipanzés, um a um, eram colocados na sala. Logo descobriam a mamadeira com o leite, bebiam e iam se aconchegar no colo da macaca de panos e lãs. E ali ficavam, indo apenas se alimentar rapidamente, voltando logo em seguida. Mas, como no caso da Enfermaria, alguns macaquinhos passavam a ficar somente no aconchego do colo quentinho, deixando de se alimentar a ponto que alguns comprometiam a saúde, e alguns, contrariando o instinto de conservação da espécie, vieram a falecer. Essa constatação de Harlow, explicou o comportamento de sofrimento extremo das Crianças que vivenciavam um abandono materno pela separação da internação. Inspirado por esse estudo, Spitz trouxe uma compreensão para esse comportamento, que chamou de Hospitalismo. E solucionou essa resposta depressiva das Crianças, destacando uma enfermeira para cada uma que apresentasse o quadro de Hospitalismo, saindo do rotineiro esquema de rodízio das cuidadoras. E foi evidenciado, assim, que uma vez cuidada pela mesma pessoa, a Criança saía do quadro e retomava o convívio saudável e o desenvolvimento.

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Como cresce uma Criança? Parte IV

Como cresce uma Criança? Parte IV Prosseguindo no tema dos 4 principais vetores do desenvolvimento infantil, a aquisição da linguagem dependerá, diretamente, da maturação motora do aparelho fonador associada à boa audição, acrescida ao afeto acolhedor a cada progresso conseguido. Aconchegar com afeto os sons ainda rudimentares que vêm do esforço de imitar os sons escutados, faz parte do Cuidado, conceito já considerado como dentro do ordenamento jurídico. O bebê necessita desse estímulo para continuar o esforço de coordenar a respiração e a articulação dos fonemas que vão tomando forma de comunicação a partir da interpretação feita pelo ambiente, principalmente pela mãe, que irá lhe atribuir um sentido. Tudo por aproximação sonora. Nesse momento, o mais importante é o que se passa entre a dupla mãe-bebê. A tentativa de “falar” feita pelo bebê, será recebida com uma emoção de prazer alegre explícito no rosto da mãe, e que, ato contínuo, convocará o bebê à repetição daquele som que acabou de emitir. Conjugar dois fonemas simples pode formar um esboço de primeira palavra. A interpretação desses sons segue sempre o critério dos afetos primários, sendo, preferencialmente, ligados à mãe e ao pai, seguindo-se de outras pessoas da casa. As primeiras palavras, ainda mal pronunciadas, têm forte conteúdo afetivo. O esforço é grande para dizer “aua” que sintetiza “estou com sede e quero água”, ou “quero beber água”. “Cabô”, “imbora”, “mais”, são algumas das expressões fonéticas que dizem todo um pensamento, na maioria das vezes traduzindo um desejo e sempre com uma boa dose de dramaticidade. Por ensaio e erro e com muita repetição, a articulação vai evoluindo até que quase todos os fonemas da língua materna são pronunciados, razoavelmente. Alguns deles só são adquiridos em 4 ou 5 anos, mas isso não chega a comprometer a comunicação com as outras pessoas. O vocabulário tem uma grande explosão entre 2 e 4 anos, passando de 100/200 palavras para 800/1000 palavras, mesmo que ainda não haja uma compreensão exata do significado dessas palavras. É nesse período que adquirimos quase todo o vocabulário que iremos utilizar por toda a vida. A ambiência linguística, assim como a ambiência comunicativa, facilitará ou dificultará a riqueza da fluência verbal do adulto. Núcleos familiares onde a comunicação é bem valorizada, mesmo que não tenha uma excelência linguística, estimularão a comunicação. Neste mesmo sentido, a boa incidência de leitura entre as pessoas da família, também é fator facilitador para um bom raciocínio linguístico, para a emoção que se expressa na boa comunicação. A língua falada vai se multiplicando e se sofisticando, os termos de ligação, artigos, preposições, conjunções, a conjugação dos verbos, tudo isso ganha uma precisão maior com a aquisição da noção do tempo, o ontem e o amanhã do desenvolvimento cognitivo, que acontece, concomitantemente. A riqueza da linguagem vem com os detalhes, com as nuances. Os detalhes contam histórias completas. Os eletrônicos não ajudaram no desenvolvimento da linguagem, ou talvez, tenham ajudado um pouco com os mais velhos que descobriram como usufruir da presteza do Tio Google, nem sempre confiável. A aprendizagem da língua falada, da leitura e da escrita seguirá rigores semelhantes aos critérios científicos. É preciso repetir e afinar a pronúncia, reproduzir o “desenho” das letras que correspondem ao desenho de uma uva, buscando copiar o mais fiel possível. Letras e algarismos são “rabiscos” convencionados, mas que partiram de uma concepção aleatória. Coordenar esses signos com os objetos a que correspondem e os sons ao serem falados, é tarefa muito complexa. Por isso, seguindo a determinação do raciocínio que rege o pensamento na infância, o raciocínio concreto, é preciso que a alfabetização se dê sobre palavras concretas, passíveis da experiência vivida pela Criança. Ou seja, a Criança só conseguirá perfazer o processo de aquisição da língua se as palavras faladas e depois, escritas e lidas, fizerem parte de seu mundo real. Para adquirir uma nova competência, a Criança precisa aprimorar um sistema de armazenamento e resgate, a memória. É da precisão do arquivamento que dependerá a disponibilidade e a presteza dos dados, quando isso se fizer necessário. Portanto, uma imagem mnêmica, qualquer que seja sua ordem, só será bem guardada e bem recuperada se corresponder ao acervo concreto da Criança. E, é por isso que as situações traumáticas vividas pela Criança, não são esquecidas. Podem ser recalcadas, sair das luzes, mas continuam fermentando como pequenos ou grandes vulcões afetivos. Mas, como a precisão da palavra saiu de moda, a verdade foi relativizada e apareceu a invenção da “pós-verdade”, acrescida de uma diplomação da mentira, a internet foi matriculada muitas escolas, acentuando mais ainda a desigualdade de oportunidades. A entrada da internet na Escola se tornou um ponto de políticos e políticas, ou a ausência delas, formatando uma espécie de discriminação que passou a ser atribuída às escolas que não possuem computadores. Com a Pandemia da Covid19, este ponto, a escola à distância com a exigência da conectividade da computação, expôs as vísceras apartadas de uma sociedade cenográfica. A escolaridade já era de faz de conta, foi sonegada por dois anos de numeroso grupo de Crianças da sociedade partida. Um prejuízo que ceifou anos, talvez décadas de toda uma geração.