sábado, 22 de maio de 2021

A Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas cada vez mais naturalizadas Parte VIII

 

A Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas cada vez mais naturalizadas

Parte VIII

18 de Maio, Dia de Combate ao Abuso Sexual e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Nossa homenagem e respeito a todas as Crianças e Adolescentes que hoje estão nessa condição desumana.

 

     Violência Doméstica Vicária, Violência em Cyberbullying Vicária, Violência Institucional Vicária, têm em comum a ausência da verdadeira autoria, tem em comum a desresponsabilização. Além de sofrer a violência, a Criança e/ou a Mulher/Mãe, não são contemplados com a Justiça. E, pela lei de alienação parental, a inversão é estabelecida e passam a ser os culpados, se preciso até o dolo lhes é atribuído. E, ao agressor, o tapete vermelho.

     A inversão, aliás, tem sido, amplamente, usada como estratégia de defesa de delitos e crimes. São os mesmos termos, o mesmo raciocínio, mas, na contramão. Um Sofisma exitoso. É lamentável que a verdade, em todos os logradouros sociais, tenha sido tão degradada e igualada à mentira, à fraude. Vivemos uma grave crise Ética. A relativização já foi ultrapassada, é a inversão que é buscada e, tem sido garantida pela exímia manobra da contramão.

     Evidentemente, essas condutas que se alastraram atingem primeiramente os mais vulneráveis. É na vulnerabilidade que se faz o “laboratório” da conduta, e, a partir desse treinamento, avança em outras searas. Sofismas, e Sofismas. A superficialidade pega carona em algum raciocínio lógico, tomando emprestado alguma razoabilidade que é colada em cima da questão real. Ou seja, o ponto em questão é encoberto, em colagem, por manipulação de detalhes que perdem seu real propósito, e se tornam enganosos. A lei de alienação parental, por exemplo, é emblemática. Seu lobby espalhou que ela era para proteger as crianças de disputas entre pais em situação de separação e divórcio.

     No entanto, desde seu nascedouro ela tem outro propósito: proteger o genitor/a que é faltoso ou criminoso. Ela não se interessa pela criança, apesar de ter essa narrativa de proteção a ela. Mas se assim fosse não a condenaria à Privação Materna Judicial, executando contra a Mãe a alegada alienação que ela teria cometido contra o pai. Se uma Mãe faz uma denúncia de abuso sexual, de violência doméstica, de negligência, incluindo uso de álcool e drogas durante a convivência com a criança, ou de não pagamento de pensão alimentar, essa Mãe será enquadrada como “alienadora”. E assim começa uma saga que caminha, rapidamente, para a perda da guarda e seu afastamento total, passando ela a ser excluída da vida da Criança. É a inversão em toda a sua potência.

     Quem não conhece de perto pensa que “é só a mãe e a Criança serem ouvidas”, “é só apresentar as provas”, ou “Juiz não tira filho nem de prostituta”, levando assim a suspeita de que a Mãe fez algo de muito grave para perder a guarda. Não fez. Hoje, são milhares de Mães, nem podemos precisar quantas, que perderam a guarda de seus filhos porque fizeram uma denúncia contra o genitor.  

     Esta é um aglomerado de Violências diversas movidas à crueldade. Temos Mulheres vítimas de Violência Doméstica, que são espancadas cotidianamente, em ambiência de Violência Psicológica, por vezes, sexual para que experimentem o fundo da humilhação, e, quando reúnem forças para buscar a Justiça, têm as Medidas Protetivas determinadas pela Lei Maria da Penha, rasgadas pela outra também justiça, que a obriga a receber seu agressor dentro de casa para que “a criança pense que está tudo bem entre os pais” (sic). Palavras de uma desembargadora de família, “especialista” em alienação parental.

     A cadeia alimentar de ouro que se formou em torno dessa lei, é inacreditável. Há advogados, há promotores, há juízes, há psicólogas e assistentes sociais, há “cursos de especialização”, há técnicas de tratamento sendo vendidas como “solução” para as “alienadoras”. É um mundo onde os valores monetários rolam alto. E onde o despreparo e a ignorância da etiologia e do propósito de seu criador, um médico pedófilo, são desconhecidos. Síndrome proposta pelo médico Gardner, que se suicidou em segunda tentativa com estocadas para acertar a aorta, tendo sido salvo da primeira tentativa de overdose de heroína, e que defendia, abertamente, a Pedofilia, essa síndrome nunca foi aceita pelas Sociedades Médicas e de Psicologia de vários Países, não constando da Classificação Internacional das Doenças, por não possuir nenhuma cientificidade. Mesmo assim, ela é afirmada por “grandes nomes” como científica.

     Esta é uma Violência que leva à aniquilação da Criança e da Mulher/Mãe, porque garante ao agressor sua impunidade, basta convencer que “ela é alienadora”. A coisa mais fácil por ter se tornado um dogma jurídico, que leva a outra cadeia alimentar específica de operadores de justiça. Se é alienação da mãe, está solucionado, ela é afastada/alienada, (usando o mesmo termo), o segredo de justiça e as ameaças garantem o silêncio dela. O medo, garante o silêncio da Criança, e aquele processo diminui a torre de 150 milhões de processos em curso no nosso país. E ainda, com a promessa de prêmio que pode ser reaberto em caso de novos fatos. Um novo fato tem sido o Feminicídio e o Infanticídio, assustadoramente, crescentes. Cada processo “solucionado” rende pontos para a carreira, e bônus. É curricular “solucionar” mesmo que seja com o sofrimento e as dores de Crianças.     

     Por que a Justiça e a Sociedade não querem enxergar esta realidade de perversidades e barbárie que estamos cometendo com Crianças em sua vulnerabilidade? A quem estamos servindo?

     Mas é preciso esperançar. Há Justos na Justiça, sim. Eram poucos. Raros. Contudo, esse grupo de justos lúcidos vem aumentando a cada dia. Esperançar é preciso!

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas cada vez mais naturalizadas Parte VII

 

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas cada vez mais naturalizadas

Parte VII

     São Feminicídios e Infanticídios. Intrafamiliares. Muitos. A violência é endêmica entre nós. E a violência intramuros traz uma cor sombria, um segredo inconfessável que torna obscura a verdade nas relações familiares. Essa forma de violência é cada vez mais comum, e caminha para uma naturalização. Afinal, a família é a microssociedade que possibilita, em pequena escala e com bastante garantia de cobertura, o exercício do Poder.        

     Quanto mais um indivíduo se sente impotente no seu grupo social e profissional, mais ele busca alguém mais fraco, e, se aproveitando dessa vulnerabilidade, esse indivíduo monta uma situação de supremacia, e se regozija com a dominação absoluta sobre o mais fraco. Esta é a cadeia alimentar perversa do Poder, mais frequente do que se imagina. Esta cadeia, na maioria das vezes, é invisível a olho nu.

     Como acomodar a angústia e a revolta diante da sequência de violências contra crianças e mulheres? Quando pensamos que chegamos ao ponto máximo de crueldade, somos surpreendidos por algo ainda mais atroz. A barbárie está instalada com folga. A violência de cores já desbotadas, diria mesmo, esquecida, do sumiço de 3 meninos que tinham ido jogar futebol no campinho perto de casa. Esses meninos evaporaram há 5 meses. Há muito perderam o espaço na mídia, nada se fala mais. Suas duas mães gritam e esperam por alguma notícia da investigação. Como é possível 3 Crianças serem evaporadas sem deixar nenhum rastro. Penso nesse como e surgem hipóteses bem graves para o que poderia ter acontecido.

     As ocorrências dos Feminicídios são alarmantes. Assim como são alarmantes as violências contra as crianças. E, aqui, precisamos sublinhar que só tomamos conhecimento dos casos de violência contra a Criança. Apenas os casos midiáticos são visíveis, a subnotificação é um fato sabido. Ainda mais porque o fator dito “educativo” encobre muitas violências cometidas como se corretivo fossem. Apesar da lei que proíbe o castigo físico, a tolerância com palmadas, chineladas, cintadas, tapas que marcam na cara e no corpo, socos e pontapés, são tidos como justificados quando a Criança desobedece, ou irrita o adulto.

     Há pouco tempo vimos um menino de apenas 4 anos ser assassinato em cena de severa tortura física que se repetia cotidianamente. Veio a óbito com 23 pontos de lesão grave por golpes contundentes recebidos de um adulto. Mais recentemente, um outro menino, 3 anos foi morto em circunstâncias familiares também, por espancamento. Nos dois casos, havia outras pessoas na casa, havia indícios e conhecimento da violência por essas outras pessoas da família, havia outras pessoas fora da família que tinham conhecimento das agressões, mas não havia vontade de proteger a Criança. Também não há políticas públicas que, verdadeira e efetivamente, protejam a Criança e a pessoa que denuncia. Ao contrário. Nos casos de violência familiar, o que existe é uma lei, a da alienação parental, que serve de cobertor protetor para o agressor, e motiva, inclusive a inversão de guarda, fazendo com que a Criança seja entregue ao seu agressor e passe a sofrer a Privação Materna Judicial.

     Já é possível observar uma diminuição da necessária e indispensável denúncia. As mães, apavoradas com a terapia da ameaça, proposta por Gardner, o inventor do termo, e que é praticada nas audiências e até pelos próprios advogados que representam a Criança, estão recuando pelo medo acenado e afirmado em intimidações de perda total do convívio materno com o filho/filha.

     Somos surpreendidos por atrocidades que não faziam parte de nossa história. Um também menino de 19 anos, entra numa creche e mata com faca e adaga 3 bebês, e 2 professoras que tentaram proteger as Crianças. Eram 3 bebês! Esses assassinatos fogem, completamente, de qualquer pingo de razoabilidade. Total barbarismo. Não há motivo, as vítimas não oferecem nenhuma resistência ou capacidade de defesa. E a arma branca e os chutes e pontapés implicam na proximidade física com a vítima, implicam na repetição dos golpes, implicam na deformação e desmonte da vítima, implicam em intervalos de tempo que poderiam trazer sua interrupção, um retorno a alguma lucidez.

     A violência institucional bárbara, que em nome de cumprir a lei, pelo menos é a justificativa alegada, aperta gatilhos de fuzis dentro de quarto de Criança, que presencia a morte sangrenta de um desconhecido que estaria tentando fugir da instituição de Segurança Pública. Para combater o aliciamento de Crianças e Adolescentes pelo crime estruturado, alegando os Artigos do ECA que rezam Proteção. Mas será protetivo executar alguém sentado na caminha de uma menina de 8 anos, que a tudo assistia? Para coibir violações, pratica-se violação. No último Natal, 3 meninas de 8 e 6 anos, assistiram o pai executar a mãe com 16 facadas. Quantas Crianças assistem a cenas de violência doméstica dentro de suas casas? Mas a dificuldade de crédito da Voz que denuncia é muito grande e cruel.

     A Violência Vicária perpetrada pelo Estado, uma forma de Violência Institucional, além de trazer a desresponsabilização, torna a mãe o instrumento de tortura contra a Criança, pela sua avidez de maternagem que é sonegada na Privação Materna Judicial, deformando para a Criança a noção de certo e errado, a noção de Ética, a noção de afeto honesto. Assim, como saída para o subjugo do processo de Feminicídio que se inicia bem antes de seu desfecho, em formato disfarçado de crime de stalking, crime de perseguição institucional, estamos trazendo a reflexão sobre uma atitude legítima e saudável da mãe ao Registrar em Juízo, e em Ata Notarial, seu rompimento com este pacto perverso ao se retirar dos processos que brotam, incessantemente, ao longo de anos.               

Caso Alessandra Borba x Estado Brasileiro - P-822-21 - CIDH / OEA

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Violência contra a Mulher e a Criança. As várias formas cada vez mais naturalizadas. - Parte VI

 

Violência contra a Mulher e a Criança

Parte VI

 

     Talvez não tenha sido, suficientemente, clara no último artigo. Nenhuma mãe deve ser obrigada a torturar seu filho ou filha através de Violência Vicária determinada pelo Estado, em troca de uma “migalha de filho”, de uma ilusão de cumprimento de cuidado materno. Mas, uma vez que uma mulher/mãe faz uma denúncia de abuso sexual intrafamiliar ou de violência doméstica, o rito jurídico a encaixa num calvário, com punições já, amplamente, conhecidas, que levam à perda da guarda e à Privação Materna Judicial. Para efetivar o afastamento materno, regra estrita para aplicar a punição à ousadia de uma mulher fazer uma denúncia contra um homem, a violência da terapia da ameaça, proposta por Gardner, surge ativando o medo em caldo de opressão.

     O “segredo de justiça” garante a ocultação dessa sequência de violência. Isolada, a mulher/mãe passa a ser intimidada pelos operadores de justiça, todos, começando pelo seu próprio advogado. “Não pode falar isso”, “não fala nada”, “aceita esse acordo que amanhã eu entro com recurso”, e o advogado não atende o telefone até que o prazo para o recurso se esgota. O acordo infame segue valendo, a mãe assinou na confiança de que seria contestado. E a violência, e as violências, se desdobram. O entorno, incluindo a família, começa a se afastar porque as críticas e a culpabilização apontam a mulher/mãe. A família e os amigos abandonam mãe e Criança. Os outros, os conhecidos, emitem “juízos de valor” em preconceitos. “Se foi afastada do filho, alguma coisa grave fez, juiz não tira filho nem de prostituta”. Sendo cada vez mais amordaçada, seu mecanismo de adaptação ganha grande dimensão. De ponto em ponto, ela vai alcançando uma acomodação à situação de crescente perversidade. Nada muda o rumo. Não há razoabilidade. Mas, está baseada numa lei. Assim, a tortura da mãe, com repercussão direta na Criança, vai sendo aprofundada. Sozinha. Invisibilizada.

     Mas isso não é suficiente. Mesmo com o silêncio garantido pelo medo e pelas ameaças terroríficas, a sede das perversidades contra mulheres e crianças é insaciável. Os requintes de crueldade vão se sofisticando. O fato de ser estabelecida a Guarda Compartilhada, que desconsidera até Medida Protetiva por Violência Doméstica constatada, não satisfaz.

     Um ponto importante a se pensar é o momento em que a Guarda compartilhada com o descumprimento da Medida Protetiva da Lei Maria da Penha, e todo o sofrimento que advém da exposição ao agressor, é transformada em Guarda Unilateral, com o afastamento materno. Para tal, é muito frequente, majoritariamente, que o denunciado como abusador ou violento requisite a “Busca e Apreensão”, que deveria se chamar “busca e prisão da Criança”. Explico: o pedido é imediatamente atendido, muitas vezes feito no Plantão Judiciário, quando só uma alegação de “alienação parental”, sem prova, nem leitura dos autos, é o suficiente para uma operação jurídico-policial de grande aparato.

     Parece uma operação de guerra. Sempre à noite, ou no amanhecer. Fuzis. Muitos fuzis. Carregados por policiais militares fardados, 8, 10 policiais armados, entram na casa da Criança, com autorização para arrombamento, que, muitas vezes, justifica o famoso “pé na porta”. Uma mulher e uma Criança, assustadas, são surpreendidas e amedrontadas. E a Criança é presa no colo de um policial armado. Um ou dois Oficiais de Justiça, que deveriam cumprir os Artigos do ECA que rezam Direitos à Proteção e à Dignidade. Em lugar dessa garantia de Direitos, a violação.

     Essa sessão de violações dessa cena, onde a Criança é tratada como um computador de um suspeito, é uma violência para mãe e filho. Gritos, choros, desespero são assistidos, friamente, pelo denunciado. O Relatório do Oficial de Justiça, nunca descreve o sofrimento da Criança, que deveria ser guiado pelo Princípio do Melhor Interesse da Criança.

     Após um período de afastamento total entre mãe e Criança, aparece um conta-gotas de convivência, com vigilância para cercear a “alienadora”, como é a alcunha da mãe que acreditou na justiça e fez uma denúncia. A esta altura, ela já responde a vários processos criminais que selam seu silêncio, arrasam sua possibilidade financeira, e retiram seu Direito de Comunicação em Redes Sociais, de qualquer tipo, e seu Direito de Ir e Vir, em condenações criminais que exigem apresentação em Juízo a cada semana, sem possibilidade de viagem. Censura e Controle da mãe que ousa denunciar.

     Este conta-gotas é maléfico para a Criança. Afinal, ela tomou coragem, revelou o que sofria do seu abusador, confiou na mãe, acreditou que a mãe iria restituir sua tranquilidade e dignidade, e saiu preso, foi entregue a seu agressor, e a mãe, depois de ter sumido por um tempo, variável, às vezes nunca mais, reaparece em migalhas, compactuando com aquele que o agride. Por isso, a saída dos processos, com a devida entrega em Registro ao Juízo, e Registro em Ata Notarial, com a responsabilização legítima do Estado, se faz necessária. Romper este pacto silencioso perverso.

     Urge parar de torturar o filho ou filha como instrumento do Estado, nessa Violência Vicária Institucional.                       

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas, cada vez mais naturalizadas. Parte V.

 

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas, cada vez mais naturalizadas.

   Parte V.

     Quando pensamos em violência logo surge a ideia desejosa de saber sobre a autoria, e o impulso de atribuir a culpa. E nesse momento, parece que a violência assume vestimentas de gênero. O fato de 69% dos pais das crianças que nasceram com microcefalia pelo Zika Vírus, terem abandonado essas crianças e suas mães, passa incólume. Os procedimentos de imputação criminal são apenas para o gênero feminino. Talvez seja porque o volume de abandonos paternos, mesmo com a subnotificação, seja impossível para a mínima resolução, haja vista que temos o registro de 57 milhões de mães solo no Brasil, pelo último censo. Assim, fica restrito ao gênero feminino a criminalização pelo abandono de Criança, e fica também restrito às mulheres a responsabilidade do sustento dessas Crianças abandonadas pelos pais.

     Talvez também por este motivo, o volume de abandonos paternos, a justiça é tão encantada pela frase falada por alguns pais que pedem a guarda porque “amam muito’ aquele filho ou filha. Em meio a tantos homens que deixam para trás seus filhos, aqueles que exigem convivência e guarda unilateral parecem ser tratados com tapete vermelho. Todas as honrarias, todos os direitos, mesmo os que ferem o ECA e a Constituição, na garantia do Direito ao convívio saudável com pai e mãe, família extensa paterna e materna. E aqui cabe a pergunta: qual a justificativa de se afastar uma mãe, sonegar os cuidados maternos à Criança, que sabemos de suma importância? Por que, usando uma alegação de falácia tendenciosa, com cálculo futurista infundado, cientificamente, uma previsão sem comprovação de estudos longitudinais, é, imediatamente, estabelecida a tortura da Privação Materna Judicial? Em que argumento, que siga o Princípio Constitucional da Razoabilidade, se pretende judicializar e controlar afetos e emoções da relação mãe-filho/a?   

     Faz-se necessário observar que a intervenção da justiça promovendo a pretensa “alienação”, praticada pela mãe contra o pai, que foi objeto de condenação à mãe denunciante, torna-se então benéfica quando é a mãe que é, totalmente, suspensa pelo Estado, do convívio com a criança. Gardner, o inventor desse termo, também afirmou ser benéfica a pedofilia para a Criança. Ambos  “benefícios” seguem se mostrando triunfantes e intimidadores.

     Vemos que “acompanhantes” judiciais para a tortura da revitimização de visitação materna à conta-gotas, cruel modalidade de contato, tanto para a Criança quanto para a mãe, determinando quanto de abraço e beijo é permitido à mãe. E, se “interpreta” que a mãe desobedeceu a sua ordem de menos proximidade física entre uma mãe e sua filha de 5 anos, o relatório é escrito apontando para o juiz que a mãe continua praticando atos de alienação parental e sugere que as visitas devem ser reduzidas. Não importa se essa menininha foi arrancada pelo pai em ação de busca e apreensão, sempre acompanhado de força policial, onde é possível ver o desespero da criança que tenta se agarrar aos gritos ao corpo da mãe, chegando a fazer xixi na roupa, sofrimento observável nas imagens do registro áudio visual. Assim também, temos registrado o desespero de um menino, 12 anos, diante da visita virtual do seu pai que abusou dele durante toda sua infância, e só de ver a figura do seu abusador, ele não contém o xixi e molha tudo, roupa e cadeira. Perde o controle esfincteriano aos 12 anos. Mas, para o operador de justiça, o direito do pai de convivência é sagrado, acima do mal-estar do menino, que relata há 3 anos os abusos sofridos, cotidianamente. Medo. Descrédito. Desespero. O laudo da dita “perita”, feito a partir da acareação da criança com o seu abusador, afirma que não houve abuso, que é alienação parental da mãe. E, durante a acareação, a psicóloga fala para o menino quando ele relata os abusos, que esses comportamentos de abusos anais são coisas que acontecem entre homens. Normal.

     Como lidar com as ordens judiciais que violam a Criança? E a sequência prossegue. A determinação do afastamento materno parcial ou total, sob ameaças de mais punição de interdição do Direito à Maternidade que aponta para a aniquilação dessa mãe. E, sob o seriado de ameaças de mais perda, que vêm dos órgãos do sistema judiciário, e do próprio advogado contratado por ela, essa mãe vai se adaptando até se conformar com a migalha que lhe é permitida, sempre debaixo de condições draconianas. Assim ela não percebe que está sendo o instrumento refinado e perverso da violência que está sendo perpetrada contra seu filho ou filha. A adaptação de uma mãe para manter um fiapo de contato com a Criança é incalculável.

     A frase repetida à exaustão é: “não vou desistir nunca!” Aqui também há uma manipulação em que é levada a pensar que, a não aceitação total das perversidades impostas, passa a ser um sinal de desistência, perde o único adjetivo que está agarrada como uma prova de que é uma verdadeira mãe. Repetir que não vai desistir como um mantra, faz parte do autoconvencimento que lhe tira a clareza da racionalidade. Não consegue enxergar que está sendo usada como instrumento de violência contra seu filho ou filha, que ela está, também, praticando a tortura a que ele, ou ela, foi condenado judicialmente, abuso sexual e/ou violência física.

     Esta é uma atitude inusitada e, provavelmente, pouco compreendida. Certamente, alvo de mais uma manipulação contra a mãe, classificando-a mais uma vez como louca, como desnaturada, como péssima mãe para corroborar a acusação de alienadora. É um ato de amor materno não aceitar ser objeto que tortura o filho, a filha. É quebrar a armadilha da garantia da desresponsabilização. Aliás, este ato cívico deve ser acompanhado de Registro nos Autos, e em Ata Notarial como sendo o Retirar-se por não concordar em perpetuar a tortura contra a Criança, entregando, devidamente, por escrito, a Responsabilidade da Integridade da Criança ao Estado, posto que está instituindo a Privação Materna Judicial.

     Dizer NÃO, claro, é difícil, mas é legítimo e legal. Quando não há racionalidade nem razoabilidade, resta, apenas, a desobediência civil para restabelecer o bom senso. Ninguém pode obrigar uma mãe a torturar seu filho. Isto não recai na areia movediça do Segredo de Justiça, que amordaça. Dizer NÃO a esta prática é diferenciar o desistir do não compactuar ser instrumento da Violência Vicária do Estado.

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas, cada vez mais naturalizadas - Parte IV

 

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas várias formas, cada vez mais naturalizadas

Parte IV

     Continuando a buscar reflexões para esse tema, e trazendo os fatos que vêm ocorrendo, parece-me que a Privação Materna Judicial, de tão claras consequências, deveria ser, no mínimo cogitada no momento da sentença e, mais ainda, quando acompanhada da Ordem Judicial de Busca e Apreensão de uma Criança, enquanto violação de Direitos e fonte de patologias diversas. É chocante como a Criança é evaporada nesses Processos que deveriam ter o Princípio do Melhor Interesse da Criança como norteador e finalidade. É o direito de convivência do genitor que impera, não importando a qualidade dessa convivência.

     São conhecidas as manobras de má fé que são executadas pelos pais, em geral aqueles em que pesam denúncias de abuso sexual e de violência doméstica, que instruídos por advogados, hoje “especializados” em alienação parental na cadeia alimentar do ouro, toda a cadeia é muito lucrativa, enchendo os autos de “Petições” fraudadas nesse malabarismo. Assim, o processo vai se tornando portador de obesidade mórbida. São 8 volumes, 10 volumes, 5,000 páginas, 7.000 mil páginas. Trocam-se Juízes, por férias ou nova distribuição. A leitura? Só a frase do estagiário: é uma mãe disputando a guarda do filho, é alienação parental. E o preconceito estrutural do descrédito na mulher/mãe e a desimportância de uma Criança, já se instalam.

     A cata de migalhas de filhos, as mães vão se adaptando, caladas, absolutamente amordaçadas, e se adaptando. São dadas determinações judiciais de contatos a cada 15 dias, sob vigilância severa, como se a mãe fosse destroçar em pedacinhos a Criança e engolir todos os pedacinhos. Vemos vigias de mães alcunhadas como “alienadoras”, que não permitem que a mãe abrace mais de uma vez a Criança, que não permitem que a mãe beije mais a Criança, que não permitem que a mãe se afaste dos ouvidos dela vigia, dos olhos, nem pensar! Todos esses comportamentos são relatados ao Juiz ou, Juíza, muitas vezes, afirmando que a mãe continua a “praticar atos de alienação”. E essa Violência dessa profissional, muitas vezes psicólogas que ferem com isso o Código de Ética e as Resoluções do Conselho Federal de Psicologia, é acatada.

     Nesse campo vale tudo. Essas monitoras de visitas das mães, não raro, são pagas pelo genitor/abusador que obteve a guarda da Criança, ferindo frontalmente o que deveria ser a isenção de hierarquia. Não tem importância. A reclamação da mãe é sempre interpretada como mais uma prova de alienação parental, e, portanto, não é apreciada.

     A ordem judicial de busca e apreensão evidencia a desimportância e objetivação da Criança. Em geral, ela se dá no Plantão Judiciário, por razões que nem preciso explicar. O plantonista lê que a mãe é alienadora e não entregou a Criança para uma visita do pai, não precisa provar nada, então, é dada a busca e prisão. É assim que a Criança vivencia, sendo presa por um PM, diante da mãe que não impede. A Criança se sente traída pela mãe, é uma vivência de abandono materno.

      A inversão de guarda tornando Guarda Unilateral do pai, com essas visitas controladas da mãe, se constituem em revitimização. Não é nem um pouco razoável para uma Criança que sua mãe, a quem contou direta ou indiretamente abusos de qualquer ordem praticados pelo pai, que a mãe deixe que ela seja entregue a este agressor. E depois, ela ainda vai visitá-la, não fala nada sobre isso, como se não tivesse acreditado, e mesmo que ela peça e implore para ir embora com a mãe, é a mãe que a abandona, novamente, nos braços de seu agressor.

     Entendo que para uma mãe que perdeu seu filho ou filha, perdeu tudo do exercício da maternidade, os cuidados, a responsabilidade, o espaço afetivo, seja atraente pensar que vai ter uma gotinha desse filho/a e não querer abrir mão disso. Dentro do ditado “melhor do que nada”, que é acenado todo tempo nas audiências, seguindo a terapia da ameaça, instruída por Gardner, o inventor do termo alienação parental. O terrorismo da ameaça de perder tudo completamente, é muito eficaz e garante a paralização dessa mãe. É a mumificação da mãe e da Criança, que passa a fazer o processo de adaptação ao abuso, que vai levá-la à retratação, quando ela vai se desdizer para ela mesma. De graves consequências em sua formação, a Retratação abre espaço para o aniquilamento da autoconfiança: aquilo não aconteceu, eu não posso confiar nas minhas percepções. A autoestima é atingida, e é incrementado o processo de dependência do outro, que vai ditar sobre suas percepções, quando o caminho deveria se alargar para a independência e a autonomia. Esses prejuízos são resultado da Violência Institucional que descredita sua voz.

     O que a mãe de conta-gotas não sabe é que ela está praticando por vicariato, a Violência Institucional em seu filho. Ou seja, a cada vez que ela sorve aquela gotinha de filho, ela pratica o abandono de entregá-lo mais uma vez ao seu algoz. Ela está a serviço do Estado que violenta. E nesse ponto, quero trazer uma reflexão dura e de difícil compreensão. É legítimo que essas mães coloquem um limite e parem de se prestar a praticar por procuração a Violência Vicária Institucional. Não falo de desistência, longe disso, falo de não se prestar a perpetuar a violência da violação de direitos da Criança. Toda Criança tem Direito à Mãe. Penso que esta é uma atitude de garantia verdadeira de Direitos, com Registro, escrito nos Autos, de próprio punho, da Responsabilização do Estado pela determinação de Privação Materna Judicial. Uma atitude de amor, de cuidado materno. É difícil, mas é legítimo e afetivo.  

Continuaremos na próxima semana.               

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas diversas formas cada vez mais naturalizadas - Parte III

 

Violência contra a Mulher e a Criança. Suas diversas formas cada vez mais naturalizadas

Parte III

     O Sofisma que dá sustentação à alegação da falácia de alienação parental, é ainda revestido de algum toque de Ciência, quando usa o raciocínio dedutivo. O Silogismo é uma figura do pensamento científico que, partindo de uma premissa maior, seguida de uma premissa menor, leva à conclusão, por uma dedução lógica. Ocorre que o termo alienação parental surge como conclusão de duas premissas de abuso sexual, ou seja:

1-     Premissa Maior: houve uma denúncia de abuso sexual contra uma criança,

2-     Premissa Menos: não se logrou prova material suficiente,

3-     Conclusão: Logo, é alienação parental.

     Temos, portanto um esboço de Silogismo que tenta trazer lógica para o ilógico. Mas, é o Sofisma que induz ao erro, cumprindo sua função essencial, levar o ilógico à uma ambiência ilusória de lógica, de verdade. Não ter a materialidade em casos de abuso sexual intrafamiliar, não pode transformar uma denúncia de violência contra a criança em tema de conflito dos pais. E, aquilo que era o objeto da alegação, alienação parental, o dificultar a convivência com o pai, se torna a punição do Estado contra a mãe, e a criança, claro, obrigando mãe e filho/a a viverem afastados completamente. É determinada pelo Estado a Privação Materna Judicial. Onde ficou a lógica nesta inversão de fatos?

          Esta é a Violência Institucional que deveria estar listada na Lei Maria da Penha. A Privação Materna Judicial como consequência da punição dada a cada mãe denunciante de crimes contra a criança sob a alcunha de alienação parental, é aniquiladora enquanto forma refinada de tortura de mulher e de criança. É invisível. O segredo de justiça garante. Não aparece o sangue concreto. A alma sangra transparente, aos pouquinhos, até escorrer a última gota de esperança e dignidade.

     Essa Violência Institucional tem todos os ingredientes de desastre social dentro de alguns anos. Essas crianças crescem. E, mesmo esmagadas pela injustiça e pela dor da perda da mãe, obrigadas à convivência continuada com o seu algoz, elas podem vir a ser um peso social pelo padrão de submissão absoluta a um predador, ou ao contrário, podem vir a permitir que a revolta que tiveram que sufocar, saia e faça estragos.

     A tortura feminina por excelência durante o Holocausto que teve esse título da maior eficácia, acontecia, exatamente, assim como acontece com a aplicação da lei de alienação parental. Nos campos de concentração, eram arrancadas as crianças dos braços de suas mães. Como é feito hoje, entre nós, as “buscas e prisões”, (o termo técnico é apreensões, mas são prisões de crianças), pelos PMs que invadem casas e arrancam crianças aos gritos desesperados, como se fossem uma TV que a mãe ficou devendo a prestação na loja. Interessante que “busca e apreensão” é uma figura aplicada a objetos, computadores, celulares HDs, e crianças. Algo está errado.

     Em caso recente que ainda goza de espaço na mídia pelas torturas e pelos horrores praticados contra uma criança em sua vulnerabilidade, além de muito frágil, constatamos que o Poder de alguns mantem a Lei dentro da mão em punho ameaçador. Eficácia também para quem detém esse Poder. Como explicar o silêncio conivente de várias pessoas, mãe, babá, cozinheira, avó, tia, vizinhos. Muitos vizinhos. Pai também atingido pelo medo e ameaça de alegação de alienação parental. E como explicar o ato Institucional de silenciar uma denúncia anterior de Violência Doméstica, quando esse crime é incondicional? De Domínio Público, o crime de Violência Doméstica segue, independente de ser retirada a queixa ou não. Ele pertence ao Ministério Público. Mas o que houve para ser arquivado, como tantos e tantos outros, sem o término da investigação e a sentença de um juiz?

     A Violência Vicária, do latim vicarius, que quer dizer substituto, suplente, que faz o trabalho de outra coisa ou pessoa, que teve o poder outorgado por procuração. “Eu não preciso lhe matar, você vai se suicidar.” “Vou só levar você ao seu suicídio, mas não vou tocar em você”. Talvez essa seja a forma de violência mais eficaz para a garantia da desresponsabilização. A mãe do Bernardo pode ter sido induzida ao suicídio, por Violência Vicária. Outras mães alcunhadas de “alienadoras” que foram submetidas à PMJ, Privação Materna Judicial, sucumbiram ao suicídio. Não vamos citar nomes por uma questão de respeito a elas e a suas crianças.

     Violência Vicária: “Não toco em você. Eu lhe atinjo onde dói mais em você”. “Eu vou bater onde mais lhe dói”. O filho. A filha. “E, então, você enlouquece, falei que você era louca!” E retornamos, de maneira camuflada e legalizada, à classificação de melhor tortura feminina, resultado de pesquisas nos laboratórios humanos do Holocausto. Aqui também a morte é seca. Não derrama sangue visível. É o sangue da alma que se esvai. 

     A nova Lei 14.132/2021, recentemente sancionada, de combate ao crime de perseguição, “stalking”, comportamento que pode estar a serviço da uma versão da Violência Vicária. Uma perseguição que enlouquece, corroborando aquele preconceito de que sendo mulher, é louca. Não sei como essa nova lei vai se fazer valer, se marcas roxas, fraturas e estupros, não são considerados, e seguem conhecidos e impunes. 

     O que precisamos pensar é que a combinação da Violência “por procuração”, invisível a olhos nus e despreparados, com a lei de alienação parental constitui um lastro para a violência institucional de dimensões que comprometem toda uma sociedade, já bastante precarizada pela Cultura da Misoginia. Faz-se necessário pensar uma maneira de dizer não à utilização vicária da mulher/mãe. Dizer não à ordem judicial de torturar o filho, a filha, como capanga de alguém inconformado e submerso em perversidade.