quarta-feira, 12 de maio de 2021

Violência contra a Mulher e a Criança. As várias formas cada vez mais naturalizadas. - Parte VI

 

Violência contra a Mulher e a Criança

Parte VI

 

     Talvez não tenha sido, suficientemente, clara no último artigo. Nenhuma mãe deve ser obrigada a torturar seu filho ou filha através de Violência Vicária determinada pelo Estado, em troca de uma “migalha de filho”, de uma ilusão de cumprimento de cuidado materno. Mas, uma vez que uma mulher/mãe faz uma denúncia de abuso sexual intrafamiliar ou de violência doméstica, o rito jurídico a encaixa num calvário, com punições já, amplamente, conhecidas, que levam à perda da guarda e à Privação Materna Judicial. Para efetivar o afastamento materno, regra estrita para aplicar a punição à ousadia de uma mulher fazer uma denúncia contra um homem, a violência da terapia da ameaça, proposta por Gardner, surge ativando o medo em caldo de opressão.

     O “segredo de justiça” garante a ocultação dessa sequência de violência. Isolada, a mulher/mãe passa a ser intimidada pelos operadores de justiça, todos, começando pelo seu próprio advogado. “Não pode falar isso”, “não fala nada”, “aceita esse acordo que amanhã eu entro com recurso”, e o advogado não atende o telefone até que o prazo para o recurso se esgota. O acordo infame segue valendo, a mãe assinou na confiança de que seria contestado. E a violência, e as violências, se desdobram. O entorno, incluindo a família, começa a se afastar porque as críticas e a culpabilização apontam a mulher/mãe. A família e os amigos abandonam mãe e Criança. Os outros, os conhecidos, emitem “juízos de valor” em preconceitos. “Se foi afastada do filho, alguma coisa grave fez, juiz não tira filho nem de prostituta”. Sendo cada vez mais amordaçada, seu mecanismo de adaptação ganha grande dimensão. De ponto em ponto, ela vai alcançando uma acomodação à situação de crescente perversidade. Nada muda o rumo. Não há razoabilidade. Mas, está baseada numa lei. Assim, a tortura da mãe, com repercussão direta na Criança, vai sendo aprofundada. Sozinha. Invisibilizada.

     Mas isso não é suficiente. Mesmo com o silêncio garantido pelo medo e pelas ameaças terroríficas, a sede das perversidades contra mulheres e crianças é insaciável. Os requintes de crueldade vão se sofisticando. O fato de ser estabelecida a Guarda Compartilhada, que desconsidera até Medida Protetiva por Violência Doméstica constatada, não satisfaz.

     Um ponto importante a se pensar é o momento em que a Guarda compartilhada com o descumprimento da Medida Protetiva da Lei Maria da Penha, e todo o sofrimento que advém da exposição ao agressor, é transformada em Guarda Unilateral, com o afastamento materno. Para tal, é muito frequente, majoritariamente, que o denunciado como abusador ou violento requisite a “Busca e Apreensão”, que deveria se chamar “busca e prisão da Criança”. Explico: o pedido é imediatamente atendido, muitas vezes feito no Plantão Judiciário, quando só uma alegação de “alienação parental”, sem prova, nem leitura dos autos, é o suficiente para uma operação jurídico-policial de grande aparato.

     Parece uma operação de guerra. Sempre à noite, ou no amanhecer. Fuzis. Muitos fuzis. Carregados por policiais militares fardados, 8, 10 policiais armados, entram na casa da Criança, com autorização para arrombamento, que, muitas vezes, justifica o famoso “pé na porta”. Uma mulher e uma Criança, assustadas, são surpreendidas e amedrontadas. E a Criança é presa no colo de um policial armado. Um ou dois Oficiais de Justiça, que deveriam cumprir os Artigos do ECA que rezam Direitos à Proteção e à Dignidade. Em lugar dessa garantia de Direitos, a violação.

     Essa sessão de violações dessa cena, onde a Criança é tratada como um computador de um suspeito, é uma violência para mãe e filho. Gritos, choros, desespero são assistidos, friamente, pelo denunciado. O Relatório do Oficial de Justiça, nunca descreve o sofrimento da Criança, que deveria ser guiado pelo Princípio do Melhor Interesse da Criança.

     Após um período de afastamento total entre mãe e Criança, aparece um conta-gotas de convivência, com vigilância para cercear a “alienadora”, como é a alcunha da mãe que acreditou na justiça e fez uma denúncia. A esta altura, ela já responde a vários processos criminais que selam seu silêncio, arrasam sua possibilidade financeira, e retiram seu Direito de Comunicação em Redes Sociais, de qualquer tipo, e seu Direito de Ir e Vir, em condenações criminais que exigem apresentação em Juízo a cada semana, sem possibilidade de viagem. Censura e Controle da mãe que ousa denunciar.

     Este conta-gotas é maléfico para a Criança. Afinal, ela tomou coragem, revelou o que sofria do seu abusador, confiou na mãe, acreditou que a mãe iria restituir sua tranquilidade e dignidade, e saiu preso, foi entregue a seu agressor, e a mãe, depois de ter sumido por um tempo, variável, às vezes nunca mais, reaparece em migalhas, compactuando com aquele que o agride. Por isso, a saída dos processos, com a devida entrega em Registro ao Juízo, e Registro em Ata Notarial, com a responsabilização legítima do Estado, se faz necessária. Romper este pacto silencioso perverso.

     Urge parar de torturar o filho ou filha como instrumento do Estado, nessa Violência Vicária Institucional.                       

Nenhum comentário:

Postar um comentário