segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Estragos Permanentes da Privação Materna Judicial pela acusação de alienação parental - Parte VI

 

Estragos Permanentes da Privação Materna Judicial pela acusação de alienação parental

                                                                                                        Parte VI

     O estudo da Teoria do Apego, que foi por mim utilizada como veículo didático para uma melhor compreensão da dimensão dos estragos causados pelo rito jurídico da acusação de alienação parental, nos proporciona uma visão da importância do alimento afeto para a sobrevivência e o desenvolvimento saudável dos bebês humanos. Para nossa sobrevivência biopsicossocial nós necessitamos dos cuidados maternos, executados pela mãe, ou por uma substituta estável. Bebês que têm suas necessidades de nutrição e higiene satisfeitas, mas que ficam sujeitos a um rodízio de cuidadores, e afastados da mãe, foram estudados por R. Spitz que descreveu o quadro psicopatológico do Hospitalismo, quadro que levou, algumas à morte.

     Este pediatra, que se tornou um teórico em Psicanálise do Desenvolvimento, observou que crianças que eram separadas de suas mães, por necessidade de internação por doença somática, entravam num processo de regressão das aquisições. Mesmo sendo bem assistidas, estas crianças desistem de viver por causa da falta que sentem da mãe.

     O Apego, os processos de construção de vínculos, e os Cuidados Maternos, fazem o alicerce da afetividade. Considerando que o vínculo materno é um vínculo visceral, pelo longo período que antecede o nascimento fisiológico, a intimidade entre mãe e filho/a é facilitadora da sintonia, do entendimento da linguagem pré-verbal do bebê. As alterações, instabilidades, intermitências, e /ou rompimentos deste processo de apego, são, fácil e imediatamente, captadas pelo sistema ainda rudimentar de segurança afetiva do bebê.   

     Portanto, a Privação Materna Judicial imprime um quadro de rompimento na construção das relações com os demais adultos, ou seja, a criança, bebê, só se aventura em direção a outras relações quando está satisfeito do alimento afeto que a mãe lhe assegura. Se temos falhas neste processo de abastecimento, temos um recuo e um retraimento para evitar a exposição à vulnerabilidade. Os bebês são imaturos, mas não são tolos quanto a qualquer ameaça à sua sobrevivência. A perda dos Cuidados Maternos é vivida como uma ameaça à continuidade da vida. Ele não sabe explicar, mas, sabe sentir.

     Assim, a Privação Materna Judicial, patrocinada pela lei de alienação parental, é, extremamente, danosa ao desenvolvimento da Criança. O Rito Jurídico que, atendendo ao Sofisma que conclui que, se houve uma denúncia de abuso sexual intrafamiliar que não foi provado materialmente, “então”, é alienação parental, usa o mesmo objeto da defesa do suspeito, supondo que ele está sendo “alienado”, passa a ser o objeto da punição: a mãe é afastada. Como se fosse de alta periculosidade, esta mãe fica, completamente, impedida de se aproximar da criança. Para ela, a mãe o abandonou.

     Mas agora ela não tem “tempos” com o pai e “tempos” com a mãe. Ela foi entregue para o pai a quem ela relatou ou confirmou que abusa dela. Esta combinação de Privação Materna Judicial com Abuso Sexual Continuado, fazem uma mistura de nocividade ímpar. O abuso sexual incestuoso é classificado entre os diversos tipos de violência, como o Impacto do Extremo Estresse. Apenas as duas formas de violência contra a Criança, a violência Física e a violência sexual, fazem parte deste conceito de Impacto do Extremo Estresse, porquanto são as 2 formas que trazem para a Criança a dimensão da maior intensidade de impotência que ela pode experimentar.

     Não é difícil raciocinar que, nesta perspectiva do Impacto de Extremo Estresse, a Criança está na condição de desenvolvimento. Sabemos que o filhote dos humanos completa seu desenvolvimento ao longo de alguns anos. Daí a importância das boas condições da 1ª Infância. E, o sistema neurológico é um dos sistemas que se completam pós-nascimento.

     Os estudos feitos em adultos que foram vítimas de violência física E/OU Sexual na infância, apontam para sequelas que até então eram reduzidas às sequelas psicológicas. Temos correlação de Exposição ao Impacto de Extremo Estresse na infância com uma prevalência de Epilepsias de Lobo Temporal, com distúrbios de Instabilidade de Humor, com Distúrbios Alimentares, que levam a Disforias, com Ideação e Tentativas de Suicídio, com as Automutilações.

     Estas pesquisas, realizadas por Professores e suas Equipes da Escola de Medicina da Universidade de Harvard, da Escola de Medicina da Universidade de Yale, da Universidade de San Diego da California, da Universidade de Pittsburg, da Universidade de Stanford, da Universidade Rockfeller, da Universidade de Tulane, da Universidade de Wisconsin-Madison, do Alberta Mental Health Board do Canadá, através do Estudo de Eletroencefalogramas (EEGs) e do Estudo de Imagem de Ressonância Magnética, levantaram evidências de atrofias de estruturas cerebrais e de alteração de função destas estruturas. Atrofias e disfunções neurológicas foram constatadas em adultos que tinham sido vítimas de violência física E/OU sexual continuada na infância, que se fazem imagens. Vale acrescentar que há repercussões no desenvolvimento de outros sistemas. Voltaremos a este ponto na próxima semana.

     Não é difícil pensar que, se há um aumento de vulnerabilidade pela ausência de Cuidados Maternos que se junta à Exposição ao Impacto do Extremo Estresse, mostradas pela correlação com as imagens de atrofias de estruturas neurológicas e as alterações de funcionamento destas estruturas, impostas pela violência a que são submetidas, estas Crianças são marcadas com sequelas que são patrocinadas pela insistência de uma crença em uma falsa síndrome de alienação parental.          

Estragos Permanentes da Privação Materna Judicial pela acusação de Alienação Parental

 

Estragos Permanentes da Privação Materna Judicial

pela acusação de Alienação Parental   -    Parte V

     São os mais variados os estragos da Privação Materna Judicial. O rompimento abrupto do convívio com a mãe, em especial na primeira infância, promove um enorme e danoso desamparo. Conhecemos e reconhecemos as sequelas do rompimento da ligação mãe-bebê, sem dificuldade. Para a Criança, a vivência é de abandono materno. A questão principal está, exatamente, na imposição compulsória da Privação Materna Judicial.

     Sabemos por inúmeros estudos científicos que a Privação Materna por abandono da mãe, causa sequelas irreversíveis. Bolwby, psicanalista que se dedicou ao estudo dos estragos causados pela ausência materna. Ele afirma que as crianças que são submetidas a separações difíceis estarão marcadas neste item inevitável da vida. Entende-se aqui como separações difíceis, os fatores de separações que se referem à idade, à duração do afastamento, ao tipo de vínculo com o cuidador principal, fatores que apontam para padrões de relacionamento afetivo da vida adulta, construídos na experiência do primeiro apego.

     Quando há abandono, a ruptura é traumática, danifica, em permanência, a capacidade de criar vínculos quaisquer, constitui-se numa obstrução ao processo de confiança no outro. Todos precisamos nutrir um quantum de dependência no outro, porquanto somos seres sociais. Mas o abandono materno destrói a possibilidade relacional daquele indivíduo.  

    Os psicanalistas Hazan, C., e Shaver, P., identificaram padrões de vínculos nas relações românticas entre adultos que copiam o padrão de vínculo entre a criança e a cuidadora inicial. O tipo de cuidado um com o outro e o desejo mútuo de estar perto um do outro. Eles agruparam estes padrões sob 4 rúbricas: o Apego Seguro, o Apego Evitante, o Apego Ambivalente e o Apego Desorganizado.

     Pessoas que tiveram a experiência relacional primeira acolhedora, na intimidade e na independência, e que viveram afastamentos gradativos, de tamanhos suportáveis, terão um olhar de naturalidade sobre a separação, com opiniões positivas sobre si mesmo e o outro. Esta é a experiência saudável de apego que se desdobrará em relacionamentos adultos.

     No entanto, se foram submetidas ao afastamento muito precocemente, quando ainda não tinham estrutura emocional suficiente, porque ainda estavam em fase de dependência absoluta ou relativa com pouca experiência positiva de autonomia e independência afetiva, ou se o afastamento foi duradouro para a fase de desenvolvimento, não tendo recursos suficientes para suportá-lo, ou a boa qualidade do vínculo com a cuidadora era muito importante e diferenciado, estas crianças terão uma impossibilidade de estabelecer vínculos, terão a ilusória sensação de independência total para impedir que um vínculo se aprofunde. Evitar a formação de vínculos afetivos ou permanecer com vínculos rasos é a atitude instalada. Evitar sempre uma nova dor, evitando o aprofundamento dos vínculos porque não precisa dos outros, e se ilude com uma sensação de independência.

     Além deste modelo de reprodução do vínculo frustrante, a ausência de satisfação da situação afetiva inicial pode trazer uma obsessão pela intimidade afetiva nunca alcançada, que se expressa na busca de altos níveis de afeto que resulta numa dependência extrema do parceiro, que a descrença em si mesmo impede a construção de um vínculo saudável. A insegurança e a autodesvalorização acompanham esta saga.

     Em consequência de vínculo materno cortado há ainda o padrão de apego que é desorganizado, que sente a intimidade afetiva como assustadora, intimidadora, desejam esta proximidade, mas não acreditam nas intenções do outro, e assim não estabelecem vínculos profundos. Tendem a fazer movimentos contínuos de aproximação e repulsa do outro, em contradições continuadas que não permitem uma compreensão pelo outro de seus reais afetos.

     Todos estes padrões de comportamento são encontrados naqueles que sofreram afastamento precoce e severo dos cuidados maternos. A supressão da proximidade materna e/ou a instabilidade, deixam marcas que vão modelar a afetividade da criança em desenvolvimento. Temos facilidade em localizar esta falha quando vemos aquela imagem da mãe que deixa uma sacola na caçamba de lixo, contendo um recém-nascido, por vezes, ainda com o cordão umbilical. Todos nos revoltamos com a insensibilidade malvada da mãe.

     No entanto, não nos sensibilizamos com o abandono obrigatório executado pelas sentenças, às centenas e milhares, que impõem a Privação Materna Judicial sob a alegação da falsa síndrome de alienação parental, amparada pela lei de alienação parental. Crianças na 1ª Infância, Bebês Lactentes, mamando no seio materno, Crianças na 2ª Infância, todas são condenadas à orfandade de mãe viva, com a “desculpa” de que a mãe está falando mal do pai e dificultando a convivência. Gostaria que alguém me respondesse se o Direito de visita do adulto se sobrepõe ao direito de parar de ser abusado de uma criança. E, ainda, se uma mãe toma conhecimento de práticas de abuso sexual de um filho, se ela se sentirá confortável e tranquila entregando a criança pequena e indefesa para pernoites e visitas com este pai/abusador. Você entregaria?

     Quando o Estado assume este lugar de árbitro da vida da criança, comprometendo o seu desenvolvimento afetivo saudável com a perversidade da Privação Materna Judicial em ampla escala, quem se responsabilizará pelos indivíduos incapazes ao afeto?

     E na sequência da escalada do Feminicídio, praticado na frente das crianças, muitas vezes para calar, definitivamente, aquela mãe em relação à possível denúncia de abuso de criança, assassinatos programados, com requintes de crueldade, que já vem ocorrendo e não estão sendo vistos como a expressão da mordaça da Mulher/Mãe que busca proteger um/a filho/a, ou mais de um/a, quando serão olhados como Maternicídios? Quem serão estas crianças daqui a alguns anos? A se considerar a Teoria do Apego, teremos pessoas mutiladas e com necessidades especiais de afeto. Certamente, irrecuperáveis. 

     Tinha programado que falaria hoje sobre as sequelas neurológicas. Retorno a estas sequelas, porque preciso pensar que a Privação Materna combinada com o abuso sexual destas crianças, implode a criança. Mas, a avalanche de feminicídios do Natal, que deixaram várias crianças órfãs de mães mortas, me chamou mais alto. O apego materno que tem sido ceifado, judicialmente, está alicerçando deformações de dimensões, dificilmente, imagináveis.