terça-feira, 21 de novembro de 2023

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte III.

A Responsabilidade dos pais com os filhos, observando passarinhos e humanos. Parte III E os dois filhotes criaram penas e se arriscaram a pequenos voos, sob o olhar da mãe passarinha. Começaram por explorar o jardim do entorno, e, no dia seguinte, o ninho foi deixado para trás pela família. Mãe e pai, mesmo sem ter a consciência de suas responsabilidades, cumpriram com qualidade a determinação da Natureza. A mãe passarinha cuidou com compromisso dos dois ovinhos que se tornaram dois passarinhos. Voaram. A última imagem que tenho deles é em cima do aparelho de ar condicionado, o pequeno ainda ensaiando o bater as asas e a mãe ao lado. O ninho ficou vazio, mas repleto da história de dois vulneráveis que receberam um cuidado exemplar. E conquistaram a boa autonomia. A simplicidade da vida dos passarinhos é invejável. A eficiência dos cuidados maternos e da proteção paterna, também invejáveis. Somos confrontados com uma questão: por que uma dita evolução traz tanto retrocesso? Por que nós humanos temos a capacidade da crueldade com nossos filhotes? A guerra no oriente, uma das 19 guerras que acontecem atualmente, está matando com tanta perversidade Crianças. E nossa voz não é escutada. Matamos com bombas e tiros, por aqui quase todos os dias, e matamos com a fome, a sede, o desamparo, até então, inimaginável. Mas também matamos quando não conseguimos garantir uma convivência saudável dentro de nossas casas. O conceito de saudável inscrito no Artigo 227 da Constituição Federal, aqui como lá, abrange a vivência do respeito ao outro, a vivência da solidariedade, a vivência de uma organização social, para proporcionar a condição necessária à vivência afetiva. No entanto, o que encontramos é o desrespeito a regras básicas e fundamentais de convivência. Crianças não vão à guerra, não podem ser alvos de bombardeios e crimes de guerra, assim como crianças/adolescentes não podem “matar” colegas pela internet. Ninguém desconfiou que divulgar adulterar e divulgar imagens desnudas de colegas, não pode. Como nas situações de bullying, omissos se alinharam com os autores, e, não fosse, um único menino discordar e levar ao conhecimento de alguns adultos, possivelmente, essas meninas nuas estariam circulando até agora. Algumas coisas já foram faladas. O Pediatra dr. Daniel Becker se pronunciou de maneira precisa. Mas gostaria de acrescentar à sua fala, que concordo, que aponta para a necessidade dos pais fiscalizarem o uso da internet pelos seus filhos, e sugere o uso de ferramentas virtuais limitantes. Ele lembra com toda a pertinência que a responsabilização criminal recai sobre os pais dos meninos infratores. Contudo, quero me debruçar sobre os meninos infratores. Neste episódio eles evidenciaram pontos importantes e lamentáveis. Derrubaram o mito de que a pobreza ou a negritude geram infratores. Esse é um mito que, por vezes, tenta, com sucesso, obscurecer as razões mais profundas da tendência à delinquência. Nasce aqui uma pretensa “justificativa” para o uso da violência contra essas Crianças e Adolescentes. E, vale lembrar que os pais deveriam se dedicar ao convívio saudável que prevê conversas, parcerias, discussões, cuidados entre filhos e pais. E sabemos que os pais, exceto os que exercem a profissão de T.I., vão sempre ficar atrás dos filhos no novo da tecnologia. Devemos olhar mais para o antes. A fiscalização é a posteriori. Já foi. Mas, o crime de divulgação de nus de meninas mediante uso da inteligência artificial, não veio de nenhuma comunidade, não veio de um grupo em vulnerabilidade social. O grupo que praticou esse crime é um grupo em vulnerabilidade de caráter. Talvez, não possamos usar o conceito de vulnerabilidade porque vemos mais o conceito de ausência de caráter. Não há vestígio de algum código de Ética, ou código moral, ou algum traço de Empatia. Muito me preocupa um foco desse tipo em meio a uma comunidade bem desenvolvida, com boa cognição, com capacidade e curiosidade tecnológica, mas zerado de princípios. Poderíamos pensar que são adolescentes que, mesmo morando em condomínios e mansões, bem instalados, foram abandonados no ambiente intrafamiliar. Quantas vezes vemos Crianças bem pequenas que, incomodando o ambiente, ganham o celular da mãe ou do pai para brincar. E ainda são tidos como quase “gênios” porque deslizam o dedinho na tela, quando estão no tempo de desenvolver a habilidade motora da preensão do lápis pela oposição do polegar ao indicador. Essa habilidade lhe permitir segurar o lápis para a alfabetização e depois para a escrita, para segurar o pincel e produzir arte, para segurar o bisturi e a agulha para tratar uma doença. Estamos falhando enquanto sociedade. O imediatismo, que foi muito aguçado pela presteza da internet, a aparente facilidade do ponto de vista raso, todos passaram a “saber” tudo sem nenhum esforço, sem estudar, sem ler um só livro, e o conversar se evaporou. Não precisa nem comentar sobre isso. Não é raro que filhos mandem mensagens para a mãe, quando ambos estão dentro de casa. As emoções, os sentimentos, os afetos, saíram de cena porque é tudo rapidinho e superficial. Nesse esgarçamento afetivo do núcleo familiar, não cabem princípios, valores, reflexões. Durante meu desenvolvimento, minha mãe e meu pai sempre criticaram o se deixar influenciar por outra pessoa, estimulando minhas próprias posições e convicções. Não sei bem como, mas abrimos um espaço para figuras que ganharam o título de “influencers”. E fizeram dessa postura virtual uma profissão, até mesmo remunerada. Ser influenciado agora é algo aceito, naturalmente, pela sociedade. A influenciadora, e o influenciador, não precisam ter estudado, ter um conhecimento consistente. São fábricas de opiniões monetizadas. Esses meninos são responsáveis pelo que fizeram. Seus pais são responsáveis pelo que esses meninos fizeram. Mas todos nós somos responsáveis pela descoloração do conceito de verdade, pela depreciação do afeto, pela propagação da mentira com pinceladas de maquiagem. Desde quando deixamos de enxergar “o que não pode” para não ter trabalho. É mais fácil dar um celular nas mãozinhas do pequeno e se iludir falando que o filho é um gênio porque desliza um dedinho e olha as imagens corridas. A compreensão e o pensamento não importam. Vulneráveis são presas fáceis. Os meninos do colégio religioso famoso ficaram na esquina entre vítimas e algozes. Penso que estamos usando nossos vulneráveis para exalar violência em formas cada vez mais sofisticadas. A vulnerabilidade negada, é a violência naturalizada. A família de passarinhos do jardim do meu trabalho me deixou duas lições: uma sobre a importância da qualidade do cuidado com os pequenos, e outra, que podemos voar sem saber para onde, mas com suas próprias asas, sem seguir as “instruções” de um influencer.

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