sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Vulnerabilidade na Criança Parte I

Vulnerabilidade na Criança, suas diversas formas. Parte I O termo é claro. Na nossa área, uma fragilidade que diz respeito à discrepância de “tamanhos” entre duas pessoas, deixando uma delas em flagrante desvantagem, e a outra com uma supremacia indiscutível. A vulnerabilidade nos remete, rapidamente, à menor resistência da Criança frente ao adulto ou mesmo à outra Criança que apresente diferença de 5 anos ou mais nas idades. A fragilidade física, tão nítida quando olhamos os idosos. Se, por um lado, o acúmulo dos anos traz a experiência, a paciência, e, muitas vezes, uma visão de mundo mais adequada à realidade, o idoso carece de força física, de resistência física. Esse critério é concreto e objetivo. Portanto, não há dificuldade de compreensão quanto a ele. Mas, existem outros fatores de vulnerabilidade que não têm sido muito considerados. Pela maior facilidade, preferimos continuar pensando em raciocínio concreto, como permanentes crianças em desenvolvimento. Para além do visível concreto, temos a vulnerabilidade da dependência afetiva. Antes de adentrar o campo psicológico da Criança e suas consequências, precisamos pensar que o fator de vulnerabilidade pode ser instalado em qualquer pessoa, adulta, forte, experiente, dentro de certas condições. Ela pode ser provisória, como quando fraturamos um osso, pode ser temporária, quando temos um mal estar, pode ser passageira, durante um assalto, pode ser crescente como na velhice. A vulnerabilidade é um estado subjetivo de insegurança misturada ao medo, uma sensação aguda de exposição acima do suportável. A experiência da vulnerabilidade é, quase sempre, desagradável ao adulto porque traz consigo a evidência da impotência diante de um estímulo, que é tão mal tolerada por muitos. Os idosos relutam um pouco, mas a realidade acaba por se impor ao declínio da vitalidade. Com a Criança, a impotência é bem tolerada, porquanto ela está sempre às voltas com os pedidos de ajuda de adultos diante de suas precariedades físicas e intelectuais. O que importa e sedimenta esses seguidos pedidos de ajuda é sua curiosidade cognitiva. A aquisição do conhecimento, todo conhecimento, é sua maior atração que impulsiona seu crescimento. A Criança é epistemofílica por excelência. E é esta sede de conhecimento que serve de combustível à dependência dos adultos, em especial, dos adultos mãe e pai. A Criança tem noção de que não é capaz de se prover sozinha, de produzir sua alimentação, de gerenciar seu tempo, de garantir seu abrigo, da roupa ao teto. Ela sabe que não tem autonomia, luta para conquistá-la. Mas, exatamente por isso, ela tem uma impulsão para a aprendizagem, toda aprendizagem. Justamente, é o adulto sua maior fonte de informação, de aprendizagem. Todos lembramos daquela fase dos “por ques”. Por que isso, por que aquilo, e quando você responde o primeiro por que, ela emenda com o “mas por que?” sobre a sua resposta, mostrando que ela não respondeu, satisfatoriamente. Se, é o adulto responsável que lhe garante a alimentação, o sono, a higiene, a roupa, o teto, uma rotina, uma família para pertencer, a Criança vai nutrir uma dependência por esse adulto que demonstra seu afeto por ela. Mas, essa é uma questão que tem ida e volta, tem duas faces dinâmicas que se retroalimentam, que precisa ser considerada em seus dois vetores. A Criança precisa dos cuidados de qualidade para que sua sobrevivência seja alcançada. Na ausência desse adulto cuidador, em geral, função exercida pela mãe e complementada pelo pai, ou substitutos desses dois, a Criança tenta, desesperadamente, sobreviver se cuidando como consegue. O resultado deixa muito a desejar. É fácil apreender o processo de dependência instalado na Criança. Mas, o processo de dependência pela Criança que movimenta o adulto, não é tão claro. Até porque o adulto não tem consciência dele, não admite que precisa do que chama de “trabalho” com a Criança. Pode cansar, mas lhe dá uma satisfação profunda. E, quanto mais imaturo ele é, mais dependente da dependência da Criança ele se torna. Como se não lhe rendesse nenhum prazer, nenhum proveito subjetivo, o adulto nega, até para ele mesmo, que necessita dessa sensação de Poder, de ter alguém dependente dele que lhe confere uma importância, que, certamente, ele não se auto-assegura. Quando a sensação de Poder, frente à dependência da Criança muito lhe apraz, o adulto passa a cultivar essa dependência para obter o prazer do Poder de que necessita. Esse apego à sensação de Poder faz com que o adulto dificulte o processo de aquisição de autonomia que a Criança precisa percorrer. Alimentar uma dependência para retardar competências e autonomia na Criança, não é tarefa difícil para um adulto. O que precisamos atentar é que a Criança tem, naturalmente, uma crença enorme no adulto cuidador. Romper esse processo de credibilidade e confiança traz graves consequências e sequelas. Esta Vulnerabilidade é muito séria. Falaremos no próximo artigo.

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