sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Criança e Feminicídio


CRIANÇA e FEMINICÍDIO
     O Dia de Enfrentamento da Violência contra a Mulher é marcado no 25 de novembro. Há a Marcha das Mariposas, em referência às duas irmãs na República Dominicana que foram torturadas até a morte por ordem do ditador da época porque combatiam a violência contra as mulheres. É um tempo de Ativismo. Muitos números, muita expectativa de Políticas Públicas efetivas. O desejo e a esperança de mudança deste comportamento de opressão contra as mulheres. E, por conseguinte, contra crianças.
     Não estou aqui romanciando o amor de mãe, a bela maternidade. Mas o fato da mulher/mãe se profissionalizar, se tornar indivíduo na sociedade civil, não quer dizer que ela passe a ser igualada ao homem/pai. São funções distintas, ambas necessárias para o bom desenvolvimento da criança. O vínculo afetivo materno é visceral. O vínculo afetivo paterno é construído, sendo iniciado pela mediação da mãe. Vínculo não deve ser confundido com convivência. Vínculo é afeto sentido que se acumula a cada dia, por cuidados responsáveis recebidos. Não se “esquece” um vínculo. Ele só adormece se não é alimentado nem à distância.
     É possível haver substituições parciais, temporárias ou permanentes, tanto da função materna quanto da função paterna. Função também é distinta de título, de papel. A função, portanto, pode e, é, exercida por outras pessoas mesmo quando aquele não se afastou. Os professores e professoras são, frequentemente, colocados na função paterna e materna. A mãe também pode exercer a função paterna. Um avô também pode exercer esta função. E assim as pessoas são liberadas até para morrer. Erro pensar que um pai biológico tem o direito à visita quando ele rasgou sua função de pai ao agredir a mãe ou a própria criança. E que este “direito” é indispensável para a criança. Muito pelo contrário. A criança necessita de um período para que sua mente busque se regenerar de um ferimento de presença numa violência física contra sua mãe ou de uma violência sexual contra ela mesma.
     O 25 de novembro trouxe um número alarmante. Refiro-me ao possível verdadeiro número. Como se não bastasse que nos últimos 5 dias foram noticiados 5 feminicídios, temos mais 1.230.000, um milhão duzentos e trinta mil, ocorrências de mulheres vítimas de violência, atendidas pelo SUS. Só pelo SUS.
     - Considerando que a subnotificação é em torno de 1 ou 2 para cada 10 casos, temos um número alarmante,  
     - Considerando que 2/3, em torno de 66,66% das mulheres/mães tem entre 2 e 3 filhos,
     - Considerando que em 90% dos casos o agressor é um ex, ou atual, (assim se auto-define),
     - Considerando que, como é tipificado, doméstico, estes crimes ocorrem no cenário interno dos lares,
     - Considerando a existência das 2 Leis, a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio,
URGE A IMPLANTAÇÃO EFETIVA, EFICAZ E PERMANENTE DE UMA POLÍTICA PÚBLICA DE EDUCAÇÃO, QUE TRAGA O RESPEITO À LEI COMO CULTURA.
     Não podemos nos enganar com dia disso ou dia daquilo. Não podemos nos enganar com promessas de caça a votos. Não podemos nos enganar com campanhas pontuais só para embaçar os olhos de todos. Não podemos permitir que o Estado sonegue os Relatórios Trimestrais para as Instituições Internacionais, como tem ocorrido. Não se calar é fundamental, mas não tem sido suficiente. Há conivências com crimes para todo lado. Ignorância, preguiça, insensibilidade, intencionalidade, troca de favores, e recebimento de dinheiro, alimentam esta cadeia de perversidade.
     A violência contra a mulher/mãe, que tem caminhos seculares, assume várias formas. Mas, as mais perniciosas são 6. Você sabe quais são? Sugiro que tente fazer este exercício. Tente responder quais são estas 6 formas.
     Números: mais de 500 mulheres agredidas por HORA no Brasil. De 122 Feminicídios apenas 5 mulheres haviam feito BO anterior ao seu assassinato, (4%). Entre janeiro e agosto de 2018, no RJ, foram 15.000 pedidos de medidas protetivas de emergência, e até dezembro do mesmo ano foram 71 Feminicídios, em torno de 6 por mês.
     O Feminicídio ocorre, em sua grande maioria, na presença das crianças, filhos do ex/atual casal. Tomando o número das violências físicas registrado no SUS, e fazendo uma conta simples, tomando por base a indicação de 2 ou 3 filhos, chegamos ao número que estaria entre 1.623.600 – um milhão seiscentos e vinte e três mil e seiscentos crianças – e 2.435.400 – dois milhões quatrocentos e trinta e cinco mil e quatrocentos crianças – que presenciaram, com os olhos e ouvidos da sequência continuada da violência lenta e letal da mãe. O que podemos esperar destes milhões de crianças? Estamos falando apenas do número registrado nos atendimentos do SUS para violência física. E, se somássemos o número total de olho roxo embaixo dos óculos escuros dentro de casa, a dor da costela quebrada sem tratamento, os hematomas escondidos pelas roupas de mangas em pleno verão, as incontáveis quedas da escada, a que número chegaríamos?  
     “Tinha 7 anos, eu lembro todos os dias do meu pai arrastando minha mãe pelo corredor depois que ele deu 5 tiros nela”.
     “Meu sobrinho tinha 10 anos e naquela gritaria e sangue perguntava, chorando, para o pai por que ele tinha matado a mãe dele, enquanto o pai continuava a atirar nas mulheres da família da mãe, até que o pai apontou a arma para ele e atirou. Depois se matou.”
     “Eu pedia chorando para ele não atirar mais na minha mãe, me pendurava no braço que estava o revólver, tentando segurar, e ele me empurrava na parede e continuava. Depois foi embora correndo e me deixou ali. Só eu e minha mãe cheia de sangue.”
     Quando crianças houvesse, deveria se chamar maternicídio/infanticídio, ou melhor, Familicídio. É a família que é assassinada.
P.S. A física, a sexual, a psicológica, a moral, a patrimonial e a institucional. Ah! a violência institucional. 
Artigo publicado no Jornal Fatos &Notícias - Edição 327.   

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