sexta-feira, 15 de julho de 2022

Como cresce uma Criança? Parte II

Como cresce uma Criança? Parte II Quando chamamos a atenção para determinados momentos do desenvolvimento da Criança, como o aparecimento do sorriso, a primeira brincadeira de esconder, ou o sentar que quebra de paradigmas de percepção do mundo, estamos tentando trazer as dimensões paralelas, cruzadas, compartilhadas, sequenciadas. Tudo junto e misturado num caldo de organização crescente. Nenhuma aquisição do desenvolvimento, que seja motor, cognitivo, linguístico e afetivo, poderá acontecer isoladamente. E todas as repercussões dessas aquisições derramam estímulos a todos os setores, de maneira democrática, ou seja, todos os setores usufruem desse amadurecimento. Quando a Criança está deitadinha, chorando ou se mexendo em movimentos espásticos, característicos dessa fase, braços e pernas em movimentação com a amplitude possível, por acaso, o bebê esbarra em um chocalho pendurado à sua frente. A sensação tátil e o barulho lhe chama a atenção mas ele não tem a menor ideia de como tocou em alguma coisa que produziu aquele som. Mas ele, ao continuar aquela movimentação de braços e pernas, esbarra de novo e repete a sensação tátil e o barulho. Curiosos sim, somos, essencialmente, curiosos, epistemofílicos por natureza. Temos necessidade do saber, do conhecimento, desde o mais simples que acalma a tensão que surge diante do novo, do desconhecido, do estranho. Quando o bebê sente insegurança, medo ou ameaça diante de alguma situação, se assegurado pelo afeto de estímulo à exploração daquilo que o está assustando, ele recobra a confiança e busca conhecer aquela situação que trouxe aquela instabilidade. O barulho do chocalho ao toque será buscado, incessantemente. E por ensaio e erro ele acaba por descobrir o movimento que o leva a acertar numa grande incidência. Este é o que chamamos de nascimento da inteligência. Quando a intencionalidade guia o movimento para a obtenção de um objetivo, a inteligência inicia seu processo de desenvolvimento. O nascimento da inteligência, o aparecimento da intencionalidade, toca os movimentos, a linguagem, a afetividade, provocando sempre algum nível de amadurecimento, que se espalha na mente e no corpo. A intencionalidade caracteriza o perfil humano. Todo pensamento, toda ação, tem uma hipótese e uma meta. O uso da intencionalidade desenha o comportamento humano e nos afasta, suficientemente, da conduta instintiva, mais próxima do comportamento animal. Esse primeiro movimento que busca acertar de novo o objeto que produziu um barulho, vai se tornando cada vez mais preciso, e logo pode dar lugar à introdução de um segundo objeto que alcançará o objeto desejado. Ou seja, logo o bebê descobre que poderá chegar ao objeto desejado utilizando um outro objeto que fará essa extensão. Os chipanzés chegam até aí. São capazes de usar um graveto para alcançar o mel que está dentro do caule de uma árvore, por um orifício pequeno por onde não passa a mão deles. Mas o bebê humano prossegue em sua investida, organizando o pensamento de maneira científica. Toda experiência é guardada, cuidadosamente, na memória. Os primeiros pensamentos são muito simples, pensamento binário, onde apenas uma varável é testada. Durante toda a infância a Criança tem, somente, o raciocínio concreto. Tudo que a Criança consegue aferir se passa pela experiência. O mundo, muito complicado para a Criança, lhe chega através de suas percepções. Por isso, muitas vezes, ela se equivoca porque sua percepção é equivocada pela simplicidade de seu pensamento, mas, aos 3 anos ela sabe o que é fantasia e o que é realidade, e separa bem uma da outra. Esse é um dado da Childhood Brasil. Por outro lado, ela responderá que há mais pérolas no recipiente de vidro mais estreito e mais alto, mesmo que o examinador passe as pérolas do vidro largo e baixo para o mais alto e estreito. Ela só considera a variável vertical, e, mesmo vendo o examinador versando o conteúdo de um vidro para o outro, ela não consegue multiplicar altura x largura dos dois recipientes. Essa maneira de raciocinar pode estar, por exemplo, na compreensão de uma situação traumática que não é considerada como tal porque o agressor por ser seu pai, ele é visto por ela só como bom, todo pai é bom e faz coisas certas, e não vê o outro lado dele. No entanto, se ela relata uma prática libidinosa, este relato é fruto de seu raciocínio concreto, ou seja, está relatando a vivência de uma experiência, de suas sensações perceptivas, a que foi submetida. E, assim como seu raciocínio durante a infância é concreto, sua memória é, meticulosamente, organizada pelas experiências concretas. Não procede a acusação, hoje corrente, de que relatos difíceis de serem escutados, sejam falsas memórias. Sem comprovação científica, essa alegação só serve para desqualificar sua voz. Ela usa de muito rigor no armazenamento de suas imagens mnêmicas. O exercício permanente de memorização segue métodos e regras para garantir um armazenamento correto e um resgate rápido. A Criança investe muito bem na memória porque precisa acumular conhecimento correto sobre o que experimenta do mundo. As técnicas para isso, muitas vezes são personalizadas, como é também individualizado o desenvolvimento da inteligência. As fases da cognição vão do concreto em direção ao abstrato, início aos 11 anos, se tornando cada vez mais complexas, mais uma variável é admitida, é introduzida a relativização gradual, depois aparece a tendência a colecionar porque a inteligência entra numa fase de exercitar o sequenciar. Essas duas fases têm nas coleções e álbuns de figurinhas importantes aliados, uma aprendizagem lúdica. Colecionadores parecem manter uma ligação com o prazer de reter dessa fase. É possível que os criminosos em série, entre outros fatores, tenham algum tipo de fixação nessa fase, um aprisionamento ilógico. Isto é apenas uma tentativa de compreensão dinâmica, não uma justificativa, apenas para ilustrar a rica plasticidade do desenvolvimento cognitivo. É nossa responsabilidade, família, sociedade, Estado, zelar pela saúde integral da Criança, evitando produzir obstáculos e traumas, que mutilarão sua mente.

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