Violência
contra a Mulher e a Criança
Parte VI
Talvez não tenha sido, suficientemente,
clara no último artigo. Nenhuma mãe deve ser obrigada a torturar seu
filho ou filha através de Violência Vicária determinada pelo Estado, em troca
de uma “migalha de filho”, de uma ilusão de cumprimento de cuidado materno. Mas,
uma vez que uma mulher/mãe faz uma denúncia de abuso sexual intrafamiliar ou de
violência doméstica, o rito jurídico a encaixa num calvário, com punições já,
amplamente, conhecidas, que levam à perda da guarda e à Privação Materna
Judicial. Para efetivar o afastamento materno, regra estrita para aplicar a
punição à ousadia de uma mulher fazer uma denúncia contra um homem, a violência
da terapia da ameaça, proposta por Gardner, surge ativando o medo em caldo de
opressão.
O “segredo de justiça” garante a ocultação
dessa sequência de violência. Isolada, a mulher/mãe passa a ser intimidada
pelos operadores de justiça, todos, começando pelo seu próprio advogado. “Não
pode falar isso”, “não fala nada”, “aceita esse acordo que amanhã eu entro com
recurso”, e o advogado não atende o telefone até que o prazo para o recurso se
esgota. O acordo infame segue valendo, a mãe assinou na confiança de que seria
contestado. E a violência, e as violências, se desdobram. O entorno, incluindo
a família, começa a se afastar porque as críticas e a culpabilização apontam a
mulher/mãe. A família e os amigos abandonam mãe e Criança. Os outros, os
conhecidos, emitem “juízos de valor” em preconceitos. “Se foi afastada do
filho, alguma coisa grave fez, juiz não tira filho nem de prostituta”. Sendo
cada vez mais amordaçada, seu mecanismo de adaptação ganha grande dimensão. De
ponto em ponto, ela vai alcançando uma acomodação à situação de crescente
perversidade. Nada muda o rumo. Não há razoabilidade. Mas, está baseada numa
lei. Assim, a tortura da mãe, com repercussão direta na Criança, vai sendo
aprofundada. Sozinha. Invisibilizada.
Mas isso não é suficiente. Mesmo com o
silêncio garantido pelo medo e pelas ameaças terroríficas, a sede das
perversidades contra mulheres e crianças é insaciável. Os requintes de
crueldade vão se sofisticando. O fato de ser estabelecida a Guarda
Compartilhada, que desconsidera até Medida Protetiva por Violência Doméstica
constatada, não satisfaz.
Um ponto importante a se pensar é o
momento em que a Guarda compartilhada com o descumprimento da Medida Protetiva
da Lei Maria da Penha, e todo o sofrimento que advém da exposição ao agressor,
é transformada em Guarda Unilateral, com o afastamento materno. Para tal, é
muito frequente, majoritariamente, que o denunciado como abusador ou violento requisite
a “Busca e Apreensão”, que deveria se chamar “busca e prisão da Criança”.
Explico: o pedido é imediatamente atendido, muitas vezes feito no Plantão Judiciário,
quando só uma alegação de “alienação parental”, sem prova, nem leitura dos
autos, é o suficiente para uma operação jurídico-policial de grande aparato.
Parece uma operação de guerra. Sempre à
noite, ou no amanhecer. Fuzis. Muitos fuzis. Carregados por policiais militares
fardados, 8, 10 policiais armados, entram na casa da Criança, com autorização
para arrombamento, que, muitas vezes, justifica o famoso “pé na porta”. Uma
mulher e uma Criança, assustadas, são surpreendidas e amedrontadas. E a Criança
é presa no colo de um policial armado. Um ou dois Oficiais de Justiça, que
deveriam cumprir os Artigos do ECA que rezam Direitos à Proteção e à Dignidade.
Em lugar dessa garantia de Direitos, a violação.
Essa sessão de violações dessa cena, onde
a Criança é tratada como um computador de um suspeito, é uma violência para mãe
e filho. Gritos, choros, desespero são assistidos, friamente, pelo denunciado.
O Relatório do Oficial de Justiça, nunca descreve o sofrimento da Criança, que
deveria ser guiado pelo Princípio do Melhor Interesse da Criança.
Após um período de afastamento total entre
mãe e Criança, aparece um conta-gotas de convivência, com vigilância para
cercear a “alienadora”, como é a alcunha da mãe que acreditou na justiça e fez uma
denúncia. A esta altura, ela já responde a vários processos criminais que selam
seu silêncio, arrasam sua possibilidade financeira, e retiram seu Direito de
Comunicação em Redes Sociais, de qualquer tipo, e seu Direito de Ir e Vir, em
condenações criminais que exigem apresentação em Juízo a cada semana, sem
possibilidade de viagem. Censura e Controle da mãe que ousa denunciar.
Este conta-gotas é maléfico para a
Criança. Afinal, ela tomou coragem, revelou o que sofria do seu abusador,
confiou na mãe, acreditou que a mãe iria restituir sua tranquilidade e
dignidade, e saiu preso, foi entregue a seu agressor, e a mãe, depois de ter
sumido por um tempo, variável, às vezes nunca mais, reaparece em migalhas,
compactuando com aquele que o agride. Por isso, a saída dos processos, com a
devida entrega em Registro ao Juízo, e Registro em Ata Notarial, com a
responsabilização legítima do Estado, se faz necessária. Romper este pacto
silencioso perverso.
Urge parar de torturar o filho ou filha
como instrumento do Estado, nessa Violência Vicária Institucional.
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