O abuso sexual de criança também ocorre em
Público
Temos a equivocada impressão de que o
abuso sexual só acontece na calada da noite, em ambiente fechado. O abuso
sexual de crianças e adolescentes acontece de noite e de dia, no cantinho
privado ou em meio às pessoas da família, no banho de mar, disfarçado por baixo
de um determinado edredon na sala de televisão, ou explícito e público.
Era verão, um final de tarde de domingo.
No ponto carioca apelidado de “baixo-bebê”, em meio àquela multidão de bebês,
crianças, mães, pais, babás, avós, uma família se preparava para voltar para casa.
A mãe se ocupava do bebê recém-nascido, um pouco mais de 1 ano de idade. Este
pai, ali no calçadão em meio a todos, a despeito de trocar a menina, tirou seu
biquíni e colocou-a escanchada na sua barriga, também nua. O roçar de sua
genitália na barriga e nos pelos da barriga do pai produziram uma resposta
imediata: uma sensação prazerosa. O alheamento da menina fez-se visível, o pai
parecia se orgulhar de estar como “o dono”, também se satisfazia com o contato
de intimidade excitante pele-mucosa, pele dele, mucosa genital dela, por ele
estabelecido, a mãe não querendo ou não podendo ver, ficava com o
recém-nascido. Quando alertada, preferiu continuar não vendo. O pai, então,
atravessou a extensa faixa de areia, levou a menina até a água, e, depois de
alguns minutos, voltou com a pequena menina extasiada, como que paralisada na
mesma posição. Uma cena de masturbação pública de uma menina quase bebê.
A atitude desinibida e confiante do
abusador opera uma inversão na sensação de dúvida nas pessoas em torno. É tão
explícito que, rápida e facilmente, afastamos a percepção que estamos tendo,
desviamos nosso olhar, não estamos mais vendo o que estam0os vendo. E, muitas
vezes, ainda nos culpamos por termos tido aquele pensamento, aquela mente suja
passa a ser a nossa.
“Ele
entrou no mar com o fulaninho no colo, chorando sem querer ir, passou o quebra
mar, ficou no fundo com o filho no colo por algum tempo. Quando saíram, o
menino não chorava mais, e ele estava com ereção. Fiquei chocado e imobilizado,
não fiz nada, não sabia o que fazer, desviei o olhar achando que estava vendo
“coisas”. Só hoje sei o que aconteceu.” (Relato de um tio do menino, 4
anos, abusado pelo pai.)
Sair do mar com uma criança no colo e
evidência de ereção compõem uma cena tão repugnante que muitas vezes nos damos
explicações mudas, preferindo, como aquela mãe citada, não ver o que vimos,
porque esta aberração, como se nada fosse, não cabe na nossa mente.
A criança abusada, frequentemente, é
mantida pelo abusador em seu colo em lugares públicos, em festas familiares,
até em festas de aniversário de outra criança. Esse comportamento está relacionado
a 3 fatores: o primeiro refere-se à compulsão do abuso, ao prazerzinho da
pequena excitação ou ereção do abusador; o segundo ao prazer da onipotência
delerante do “ninguém me pega, faço na frente de todo mundo e ninguém vê”; o
terceiro refere-se ao medo de ser denunciado pela criança neste tipo de
situação de mais difícil controle sobre sua vítima. Este a mais de adrenalina
que tanto aprecia.
“Mãe,
aqui nesta foto tinha uma coisa dura embaixo de mim, era no colo do pai, e ele
me segurava, eu queria ir brincar com meus primos e ele me apertava.”
(Menino de 7 anos, abusado pelo pai, vendo uma foto do aniversário do irmão
menor.)
Outra situação de abuso público, muito
frequente, se passa na festinha da menina de 6-7 anos. A música que divide
radicalmente opiniões, mas para parecer “estar por dentro da moda”, a festinha
passa a tocar, as meninas se põem a dançar até o chão com poses sensuais
explícitas, logo rodeadas pelos adultos a filmar e fotografar, mas, sobretudo,
a olhar. Tios, avôs, outros pais, olham com interesse masculino adulto, com
fantasias sexuais. É uma sessão de voyeurismo público compartilhado por todos
que, babando, parece se divertir muito, com o exibicionismo, atendido pelas
meninas ainda muito pequenas para saber qual o tipo de satisfação que estão
provocando naqueles homens adultos.
“Vamos
parar de dançar porque você me deixou de pau duro”. (Disse o tio-padrinho à
aniversariante em seus 15 anos, no meio do salão cheio de pessoas, familiares e
amigos.)
Este é um capítulo de meu livro “Abuso
sexual, uma tatuagem na alma de meninos e meninas”. São muitas as formas de
abusar de uma criança, inclusive na presença de muitas pessoas.
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