A VIOLÊNCIA CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE
Até o Séc. XVII o Infanticídio era tolerado.
O pai tinha o direito de flagelar seu filho, de prendê-lo em correntes, de
jogá-lo para ser devorado por animais ferozes. Isto muito nos horroriza hoje,
aqui. Mas não estamos longe disto, apesar d não ser mais tolerado, continua,
efetivamente, acontecendo.
O enternecimento despertado por pequenos
filhotes, gatinhos, cachorrinhos, macaquinhos e bebês humanos, é substituído,
em mentes perversas, pelo prazer da dominação, pelo prazer do poder absoluto.
Crianças passam por Hospitais em Serviços
de Urgência, passam por escolas em seus serviços psicológicos, passam por
Processos Judiciais, intermináveis, com inúmeras avaliações periciais, passam
pelo nosso olhar que prefere não ver, pelos nossos ouvidos que preferem não
escutar, e preferimos o silêncio. (lâmina de macaquinho não vê, não ouve. não
fala).
São três as formas de violência
praticadas contra a criança e o adolescente. A Física, a Psicológica, e a
Sexual. Todas causam prejuízos irreversíveis à mente, por isto devem ser
combatidas para que cesse a produção de danos, assim reduzindo suas
consequências.
Na violência física o álibi era, e
continua sendo, a educação. Batia-se nua criança para ela obedecer, para ela
ser corrigida. Curioso é que esta “educação” só acontecia enquanto havia uma
assimetria entre os tamanhos da criança e do adulto, pai u mãe. Esta assimetria
é que garantia para o adulto a sensação de Poder. É a Síndrome do Pequeno
Poder, que tanto acomete o ser humano. E como uma lei não muda um
comportamento, continuamos a ter no noticiário as vítimas, os infanticídios a
céu aberto.
Também não se enquadra a desculpa da
“educação” a bebês que choram. Os bebês são vítimas com número elevado de
entradas em P.S., a extinta Abrapia contabilizava cerca de 90% dos registros de
zero a dois anos. Pais enfurecidos arremessam bebês contra a parede, mães
irritadas sacodem seus bebês, ambas as situações para fazer o bebê parar de chorar. A síndrome
do Bebê Sacudido não é diagnosticada. Ao sacudir fortemente a cabeça do bebê
chicoteia para frente e para trás várias vezes, ocasionando micro hemorragias
cerebrais, tornando assim o bebê letárgico, que o leva a um sono profundo. A
repetição desta prática faz com que, cada vez mais, ocorram as micro
hemorragias e com que este sono seja cada vez mais profundo e demorado. Nestas
ocasiões as mães trazem o bebê no hospital, dizendo que ele tem alguma coisa
porque estava chorando muito e dormiu de repente.
A pele é a parte mais atingida na
violência física, seguida do esqueleto, e dos órgãos abdominais, a altura do
chute do adulto. As lesões intracranianas, como aconteceu com a Joana, que deu
entrada no Serviço de Urgência em estado comatoso, sendo liberada algumas horas
depois em coma, coma do qual não saiu
mais.
A verificação da pele de uma criança que
é espancada exibe hematomas, escoriações, marcas que tem colorações diversas
apontando, pela idade das impressões, para a frequência dos espancamentos. Um
olhar atento pode, e deve, detectar esta história de maus tratos escrita no
corpo da criança.
Os ossos também deixam gravadas
agressões anteriores. Fraturas e fissuras ficam inscritas e podem ser vistas
com o olhar de qualidade nas radiografias e tomografias. Fêmur é atingido por
chute, mas aparece como consequência de queda de escada, aliás, desculpa para
vários espancamentos, com direito até a abuso sexual violento.
Rompimentos de fígado e de baço,
seguidos de hemorragia, são comuns neste tipo de violência contra a criança.
O fato da criança confirmar a historinha
contada pelo adulto que a levou ao hospital não é suficiente para afastar os
indícios de agressão praticada por um adulto. As questões intrafamiliiares têm
complicadores. Compromissos, pactos de silêncio, chantagens e ameaças de mais
uma surra ainda pior, levem a criança a esconder a verdade do que ocorre. E
muitas vezes, na maioria, não lhe é perguntado sema presença do adulto ao lado.
O protocolo manda que em casos suspeitos, assim como nos confirmados, deve-se
manter a criança internada para que as instituições devidas façam uma primeira
apuração.
Os bebês espancados, muitas vezes com
fratura de base de crânio, podem passar pelos serviços médicos sem que se
levante suspeita, a justificativa da mãe é sempre a mesma, “caiu da cama”, mas
é preciso olhar com cuidado e ouvir com atenção porque bebês de 02 meses não
caem da cama porque ainda não se viram, mas a frase dita é a mesma.
A Violência Psicológica raramente chega
ao hospital, só quando se instala um quadro psicossomático decorrente dela, de
tal ordem que começa a afetar a saúde da criança. Mas ela permeia as outras
formas de violência, a física e a sexual. O comportamento da criança muitas
vezes deixa à mostra o sofrimento psicológico que ela está vivendo.
Retraimento, tristeza visível, desalento, autonegligência, comportamento de
alto risco, são expressões desta violência psicológica.
A Violência Sexual é a mais devastadora
das violências. Ela inclui uma violação ao corpo, mesmo quando ele não é,
sequer, tocado, e uma invasão à mente. A desobediência à interdição do incesto,
marco civilizatório do processo de humanização, abrange em torno de 85% dos
casos de abuso sexual, representados aqui por pai/padrasto, 75%, e 10% por avô,
irmão e tio consanguíneo. O restante dos casos cabe ao não parente mas em sua
maioria, professores, padrinhos, padres, pastores, pessoas que tem papel de
autoridade conhecida da criança. Portanto, o abusador é quase, quase sempre uma
pessoa que a criança ama e obedece.
O Abuso Sexual Intrafamiliar é uma
tatuagem na alma de meninos e meninas. Papéis são invertidos, a lei é
transgredida sob o comando do adulto, o pacto do segredo obtido por sedução,
chantagem, ou ameaça, sendo a mais comum a frase ”se você contar para alguém eu
mato a sua mãe”, empurra a criança para o lugar de protetor do abusador para
proteger a mãe. Por sua vez, o abusador sexual é pessoa acima de qualquer
suspeita. O horror de imaginar um pai abusando de um filho ou de uma filha é
tão repugnante que a mente rejeita por defesa esta possibilidade. Porque é um
comportamento sub animal.
É considerado abuso sexual qualquer ato
entre uma criança ou adolescente e um adulto ou mais velho o5 anos ou mais que
a vítima. E, quando da alteração do E.C.A. em 2010, até então não havia
nenhuma referência escrita, nenhuma tipificação do crime de abuso, ficou
estabelecida a denominação de estupro de
vulnerável para qualquer ato libidinoso, com ou sem penetração digital ou
peniana, esta rara, só em torno de 5% de ocorrência, porque o pedófilo não
quer deixar rastro. É um crime às
escuras.
O abusador não tem no prazer sexual o
seu objetivo. Um bebê de alguns meses, uma menina de 02, 03, 04 anos, um menino
de 03, 06 anos, não possuem atributos eróticos nem respostas eróticas que
contemplem um desejo sexual de um adulto. Desprovidos de caracteres sexuais
secundários, estes meninos e meninas não tem eroticidade capaz de atrair
sexualmente um adulto. É a perversão que comanda a prática da pedofilia, muito
semelhante, em vários aspectos, à necrofilia.
As consequências da violência são
nefastas. A violência física produz ao longo do desenvolvimento uma
identificação da criança com o agressor. Aprender a mentir, e o gostinho de
falsificação que se alastra por todas as relações afetivas e interpessoais, e
principalmente as relações afetivas, durante toda a vida. Podemos observar que
nos casos de Bullying na escola, há uma reprodução da cena de violência
intrafamiliar. A criança que é espancada pode repetir a posição de humilhação e
submissão, e ser invadida pelo medo inscrito nas agressões sofridas em casa, se
tornando assim o aluno alvo, a vítima de novo, no Bullying. Pode acontecer
também que a criança que é agredida se torne agressor, aluno autor, e, se
colocando no lugar do pai ou da mãe, reproduza a violência com um mais fraco.
A consequência mais danosa é o padrão
psicológico que se forma, de medo, de submissão, de falsificação, de violência,
que acaba sendo banalizada para se tornar suportável. A autoestima fica, severamente,
comprometida em todas as formas de violência.
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