A
Violência contra a Mulher e a Criança. Suas diversas formas, cada vez mais
naturalizadas
Parte I
Parece que regredimos e reduzimos o
conceito de violência, contra a criança e contra a mulher, à materialidade da
violência física. Só serve o olho roxo, ou o estupro que dilacera. A ampliação
do conceito contido na Lei Maria da Penha, Lei 11.340/2006, que elencou,
tipificando 5 formas de violência, a física, a psicológica, a sexual, a
patrimonial, a moral, em contexto de violência doméstica e familiar contra a
Mulher, essa ampliação não conseguiu ser considerada em sua devida dimensão.
No entanto, para além destas 5 formas de
violência, encontramos duas outras formas que são responsáveis por estragos
permanentes em crianças. Invisíveis em sua atuação, estas duas violências fogem
da materialidade que é cada vez mais exigida quando uma vítima faz uma queixa
de uma delas.
Há algum tempo, recebi um vídeo de uma
Mulher/Mãe, em desespero, ao lhe ser negado o Registro de Ocorrência de
Violência Doméstica. Era uma Delegacia da Mulher, a vítima havia conseguido
escapar do marido que lhe ameaçava matar. Estava com seus dois filhos,
visivelmente, perturbados com a situação vivida. Medo estampado nos rostos. O
policial, que tinha treinamento para esta delegacia especializada, lhe negou o
Registro e pediu que saíssem de “sua delegacia” porque não via marcas no corpo
dela que justificassem violência doméstica. Isto ocorreu dentro de uma
Delegacia da Mulher.
Esta postura primitiva do “só acredito
vendo” reduz e viola garantias de Direito de Criança e de Mulher/Mãe, excluindo
as formas igualmente perversas de violência que não deixam marcas aparentes. Há
poucos dias, um menino deu entrada em hospital de emergência, já sem vida.
Tinha hemorragias cerebrais e dilaceração do fígado que produziu uma hemorragia
abdominal interna. Será que um espancamento desta ordem foi tão silencioso que
ninguém ouviu nada? Será que foi a primeira vez que a criança era vítima de
violência?
E o mais grave: por que a voz desta
criança não foi escutada? Ele chorava e resistia a voltar para a casa da mãe e
do padrasto, de onde saiu morto para o hospital. Quantas pessoas tinham
conhecimento do que estava acontecendo com esta criança? Mas, no meio do
caminho tem uma pedra. Tem uma pedra no meio do caminho.
A pedra se chama lei de alienação
parental. Inibe genitores protetores a denunciar violências contra seus filhos.
Aconteceu com a Juíza que foi morta com 16 facadas na noite de Natal, na
presença de suas 3 filhas de 9 e 7 anos. Ela teve medo de pedir uma Medida
Protetiva porque sabia, mais ainda como Juíza, que seria acusada de “atos
alienadores”, uma falácia sem fundamentação científica, uma armadilha usada por
agressores domésticos de vários tipos. Assim também, se o pai desse menino tivesse
feito uma denúncia de maus tratos contra seu filho, certamente, certamente,
teria sido acusado de alienação parental, e perdido a guarda da criança. Este é
o rito jurídico. Denunciou violência sexual ou violência física contra a
criança, perde a guarda e é afastado da criança. É uma manobra inacreditável. A
justificativa é que aquele genitor está praticando a tal da invenção de
alienação parental, então a justiça usa a tal da alienação e pratica alienação
judicial contra o denunciante da violência. O autor da violência física ou
sexual denunciada ganha de prêmio a criança com todos os poderes sobre ela.
Se
esses dois tipos de violência que têm indícios que podem ser verificados, e têm
a voz da criança vítima que relata, muitas vezes com riqueza de detalhes que
não fazem parte de sua etapa de desenvolvimento cognitivo, são desconsiderados,
imaginem se haveria alguma possibilidade para denúncias de violência
psicológica, por exemplo. Impossível, apesar de também causar danos
permanentes.
Em 2010, alguns dias antes da votação da
lei de alienação parental no Congresso, morria Joanna Marcenal, 5 anos, hematomas,
marcas de queimaduras, hemorragia cerebral, comatosa ao ser internada. A lei de
alienação parental nasceu suja do sangue de Joanna. A mãe tinha sido acusada de
alienação parental e proibida de ter qualquer contato por 90 dias com a
criança. Ela foi morta antes de 30 dias da Privação Materna Judicial.
Esta é a Violência Institucional que
deveria estar listada na Lei Maria da Penha. A Privação Materna Judicial como
consequência da punição dada a cada mãe denunciante de crimes contra a criança
sob a alcunha de alienação parental é aniquiladora enquanto forma de tortura de
mulher e de criança.
Continuaremos na próxima semana pensando
sobre esta violência institucional da Privação Materna Judicial, e seus
desdobramentos em torturas refinadas, e sobre outra forma de violência, a Violência
Vicária, de enorme dimensão perversa, que vem fazendo inúmeras vítimas.
Para fazer frente a essas duas formas de violência familiar, corroborada pela
violência institucional, há que se abrir espaço para uma nova postura dessas Mães/Mulheres
em proteção a seus filhos. Faz-se necessário uma atitude inusitada que precisa
ser implantada.
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