PRICÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA
E
O PRINCIPIO DA PERVERSÃO
Como? Uma criança de 07 anos relatou para
sua mãe, com detalhes e explicações que não caberiam em seu desenvolvimento
cognitivo, os abusos sexuais que seu pai praticava nele. Foi seguida a cartilha
daquele Gardner, a guarda foi tornada compartilhada, a mãe continuou insistindo
que o menino continuava a queixar dos abusos do pai. Passou a culpa-la, para o
menino a mãe sabia, não fazia nada, e ainda o entregava na mão do pai para
ficar uma semana com ele sendo abusado. Tudo era transformado em “prova de
síndrome de alienação parental”, síndrome que não é reconhecida pela
Organização Mundial da Saúde por não ter comprovação científica de sua
existência, e logo o pai foi novamente atendido em mais uma petição com seu
pedido de afastamento da mãe.
Aqui há o nascedouro de uma coisa, no
mínimo, intrigante. Nossa cultura recursal ad eternum, desaparece como por
encanto. Em se tratando de suspeita de abuso sexual intrafamiliar, a criança é
imediatamente retirada da mãe, sem nenhuma preocupação com a criança. O que
poderia causar na criança de tão deformante, uma eventual e temporária
dificuldade justificada ou injustificada do novo modelo de convívio PA/filho,
mãe/filho? Não há estudos que apontem sequelas tão terríveis que justificassem
este corte abrupto da mãe na vida de uma criança pequena. A razão para isso
reside em outro território, a violência de gênero. Não por acaso, em geral
estes mandados de busca e apreensão, são executados na calada da noite. Como
pacotes de drogas ou material digital, a criança é arrancada, literalmente do
colo da mãe. Agarradas ao pescoço da pessoa referência, em choros desesperados,
os pacotes são levados para as garras de seu algoz. São pacotes em desespero,
que gritam seu medo, suas razões para não quererem sair da segurança da mãe e
serem novamente abusadas.
Como exercício, proponho que nos
coloquemos no lugar desta criança do vídeo, uma menina de 05 anos incompletos,
que é levada à noite por uma Oficial de Justiça, para a casa do pai, acusado
por ela, menina, de praticar abusos sexuais, que teve seu pedido atendido pelo
Juiz por alegar que a mãe era Soro+, tinha HIV. Sem precisar de nenhum
Princípio do Contraditório, tão consagrado em outras áreas do Direito, e nada
nesta área do crime continuado contra a criança, o Juiz, exibindo seu
preconceito e discriminação, ordenou a retirada da menina, em horário que
evitou até o testemunho de vizinhos. O resultado da Sorologia veio negativo
para HIV. Mas, mesmo que estivesse positivo, talvez ela, a mãe, tivesse sido
contaminada pelo ex-marido até, ser soro positivo não desqualifica a qualidade,
aqui explícita pela menina, da maternagem. O estrago já foi feito. A Oficial de Justiça tentava seduzir a menina
apavorada, aos prantos, com passear de carro, tomar sorvete, sei lá mais o que,
a menina agarrada ao pescoço da mãe gritando, pedindo para não ir, para,
finalmente, do lado de fora da casa, no escuro da noite a instrução é para a
mãe deixa-la no chão, exausta, em crise de pânico que beira o surto psicótico,
ao que a moça da Justiça segura e a leva à força. Já teve a Joanna, a Isabella,
o Bernardo, a menina de Olinda, de 01 ano de idade, o menino, 05anos, numa sala
de um fórum, os dois meninos arrancados também à noite da mãe, que gritam para
quem quiser ouvir porque não querem sair do lado da mãe,acusada de alienação
parentalporque deu voz a seu filho ou filha e buscou a Justiça. Buscou mas não encontrou.
A lista dos menores de 07 anos não acabaria. À exceção do Bernardo, 11 anos,
ele mesmo foi à Promotoria de sua cidade, e o Juiz deu uma chance ao seu pai...
Deveríamos estar comemorando o Estatuto
da Primeira Infância, o cuidado, o afeto alçado a instituto jurídico, os 1000 primeiros
dias de proteção e atenção. Ainda que este fosse um caso isolado, não é
possível comemorar um avanço que parece pisar na lama seca de minério que
engana, não é chão, é areia movediça. Mariana, o maior desastre ambiental que
produzimos destruiu vidas, histórias, identidades, pessoas. Hoje vemos a
crueldade da perversão humana: as vítimas são as culpadas porque estão como
sanguessugas arrasando a mineradora, coitadinha, por receber um aluguel social
e uma ajuda de um salário mínimo. É fácil fomentar a inveja por alguém que está
sendo, minimamente, ressarcido, na morte de sua vida até o momento da lama.
Somos muito complacentes com o crime. É
igual quando se trata de abuso sexual intrafamiliar. Assim como também acontece
com a questão do caixa 2. Talvez o argumento de que “vai pegar todo mundo” de que
não tinham ainda tipificado o crime, e mais um monte de argumentos que defendem
o crime, o criminoso e a impunidade, brotem como limo onde não bate a luz do
sol. Já tivemos a luta pela anistia à perseguição de portadores ideias, hoje,
estamos assistindo a manobras na calada da noite para anistiar um crime de Lesa
Pátria? Que vergonha! Elio Gaspari, jornalista, anuncia a festa da anistia do
Caixa 2.
“O trauma nosso de cada dia”, título de
excelente artigo do colega Miguel Calmon, que dividiu a página com o outro
excelente artigo “Aqui, como na Síria”, do meu amigo Zuenir Ventura,
compartilhavam espaço de pensadores da tragédia humana que insistimos em
continuar na nossa cegueira deliberada em nosso faz de conta de nossa sociedade
cenográfica.
O psicanalista explica o trauma
cumulativo, aquele que não lhe foi dado o tempo de ter tempo de regeneração do
tecido psíquico, o imortal nos mostra números maiores de mortes violentas aqui
que na guerra da Síria. Lá as crianças de 07 anos sendo violentadas pelos
monstros do Estado Islâmico, aqui,
crianças de 03, 05, 07 anos sendo violentadas por pais, padrastos, avôs, tios,
dentro da família, sob o manto da Justiça enganada. Ambos os autores chamam a
nossa atenção para a falha na solidariedade, na seriedade. E nossas crianças
seguem sem que tenhamos a responsabilidade empática com o sofrimento delas.
Para o Presidente da Associação de
Magistrados, o juiz João Ricardo dos Santos Costa há, em curso, uma intenção de
esvaziar as funções do sistema judicial, há posturas “no Congresso que põem em
sério risco nosso sistema de Justiça”. Ele está se referindo à corrupção
sistêmica, banalizada e, mais do que, tolerada. Ouso acrescentar que não
sofremos apenas de corrupção financeira. Sofremos de corrupção intelectual,
mais difícil ainda de ser investigada. A troca de favores, o não compromisso
com a criança, a pouca leitura de autos que, propositalmente, são inchados por
perversos para aumentar mais ainda a preguiça de ler e de pensar nas 2, 3, 5
mil páginas de um só processo que inclui abuso sexual intrafamiliar. Até
receita de pamonha já foi colocada para provar uma suspeita. Já bem afirmado
pelo Desembargador Daltoé, o despreparo de Varas que entraram nas famílias com
ranços antigos, em crime às escuras, e que exige provas materiais, de
preferência vídeo do abuso, autorizado pelo Juiz, e, portanto, do conhecimento
do suspeito, que não se detém diante de nada. Laudos são feitos, por indicação
de despotismo oculto, ditas, avaliações da criança em acareação, transformando
este delicado momento revitimizante em tortura para a criança. São produzidos
parágrafos de achismos onde é proibido afirmar que houve abuso, mas é
corriqueiro afirmar que não houve abuso sexual intrafamiliar contra a criança. Quantos
crimes com cadáveres concretos não são provados? Então eles nunca aconteceram? A
voz da criança não é respeitada. A Escuta
Protegida, método científico comprovado como fidedigno, cuidadoso e
qualificado como a melhor possibilidade de executar o Princípio do Melhor
Interesse da Criança, com pessoal gabaritado para tal, sala que segue padrões
simples, mas adequados, Protocolo e Registro audiovisual, esta técnica é rechaçada
como bobagem. O despreparo de Operadores de Justiça foi protagonizado por
aquele Promotor. Acompanhado pelo silêncio que autorizava da Juíza, ele
humilhou e ameaçou a adolescente que tinha ficado grávida do próprio pai,
acusando-a de ter mentido esquecendo até que já havia um exame de DNA no embrião
que comprovava a paternidade do avô. Encontramos a sentença de absolvição por um
Juiz Criminal baseada na crença em seu olhômetro no momento da resposta à
pergunta “o senhor fez isso com seu filho/a?”, ao que o suspeito, honrando a
resposta de todo criminoso, até quando são flagrados de arma na mão e o
assassinado estendido no chão, nega. A negação peremptória faz parte, aliás, de
indicadores de autoria. Mas os juízes e psicólogas não o sabem e usam o mesmo
advérbio, peremptoriamente, para afirmar que não houve abuso. Sentenças são
dadas descrevendo o pai abusador como pessoa ilibada, de retidão de caráter, a
partir desta observação do olhômetro, desconsiderando o Exame de Corpo de
Delito positivo para conjunção carnal diversa, termo técnico para indício de abuso
sexual em Medicina Legal, considerando apenas a negação peremptória do
suspeito, crendo ser possível detectar um psicopata, crendo que ele use da
verdade, crendo que ele tivesse escrúpulos, crendo que ele tivesse medo de
alguma autoridade. Com sua frieza de afeto, sua capacidade de manipulação, com seu
comportamento, milimetricamente, controlado para enganar, o Juiz empreende a tarefa,
se utilizando de critérios nada
fundamentados. E, nada traz o princípio do contraditório nestes processos,
porque tudo se transforma, magicamente, em prova contra a criança e a mãe. O
abuso sexual intrafamiliar é um crime de violência de gênero, perversão em
eleger o corpo de uma criança como objeto de desejo sexual, buscado a qualquer
custo para atingir a mãe e destruindo-a em sua única capacidade intangível pelo
homem, a maternidade.
Violar os artigos do E.C.A., do Estatuto
da Primeira Infância, o Art. 227 da Constituição Federal, e de todas as
Convenções de Direito Fundamental da Criança que o Brasil é signatário, não tem
sido levado a sério. A nossa sociedade de faz de conta não está dimensionando o
prejuízo humano, do campo afetivo ao campo econômico/produtivo,
que teremos dentro de algum tempo. São “danos que a ciência equipara ao
estresse pós-traumático sofrido pelas vítimas do Holocausto, e dos veteranos de
guerra, de tortura”, fato ressaltado pelos autores Daniel Goleman em “Inteligência Emocional”, e Maria Clara Sottomayor, em “Temas de Direito das Crianças”. Crescidas em imersão de
transgressão, da frieza, do desrespeito, do isolamento, do medo, da
intimidação, estas crianças são mais susceptíveis à depressão, à psicose, e, à
psicopatia, tornando-se, portanto, inválidas sociais. São muitas, e severas, as
sequelas dos sobreviventes do incesto. No jogo das identificações e contra
identificações, o saldo é a culpa que carregam para sempre.
Com o advento da internet, surgiram os
grupos de adolescentes que praticam a automutilação. Crianças do incesto que
nem a família nem o Estado se responsabilizaram. Solidão do segredo que protege
um adulto a quem ama e obedece. O corpo
odiado por ser sede de vergonha, nojo e culpa, passa a ser punido como se fora
o culpado. O ritual e a sensação de ser
acompanhado por outros que se solidarizam, virtualmente, o que lhes é mais
confortável, não confiam no contato com o outro, preenche o deserto vazio,
escaldante e gelado de tanta dor continuada. O sangue surge como vida que vem
de dentro, morte que vem de fora, em riscados que chegam a ser artísticos. Braços,
pernas, são partes que iniciam este ritual. Mas, nem sempre, este confronto
vida/morte dura muito. A desesperança, a vontade de se livrar da dor
insuportável, já reconhecida como equivalente à dor neoplásica, tem ceifado a
vida destas crianças. O suicídio. A música o anuncia. Todas as noites. É a tal
da perigosa justiça com as próprias mãos, que vem no vácuo institucional. Nossa
responsabilidade. O choro de desespero tem que despertar a vontade política, a
pública e a de cada um de nós. Urge uma postura política de todos com consistência, consequência
e persistência.,
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