PROJETO
CUIDADO COM A CRIANÇA
Gostaria de agradecer mais esta honra
de participar, dentro do “Projeto Cuidado”, de mais uma Obra escrita a várias
mãos, organizada pela Professora de Direito Especial de Criança e Adolescente,
Dra. Tânia da Silva Pereira, e pelo Professor Guilhermo Oliveira da Universidade
de Coimbra. Este novo livro será sobre “Cuidado
e Afetividade”, e, como os outros dois livros deste Projeto, “Cuidado e Vulnerabilidade” e “Cuidado e Responsabilidade”, editados
em 2009 e 2011, respectivamente, será editado e distribuído no Brasil e em
Portugal.
Escrever em várias mãos é uma
experiência riquíssima, pois permite que especialistas de olhares diversos
possam estar juntos numa mesma obra, proporcionando ao leitor e à ciência a
oportunidade de complementar, confrontar, questionar, enfim, pensar.
Participei, também, de uma obra de raro valor humanístico sobre a morte e o
morrer, “Vida, Morte e Dignidade Humana”,
onde o Direito à dignidade foi olhado por vários ângulos, por vários
especialistas de diversas áreas.
Aproveito a oportunidade para
agradecer minha participação a convite das Professoras Rosângela Zagaglia e
Tatiana Seixas, ambas do Departamento de Direito Especial da Criança e do
Adolescente da UERJ, para contribuir com um capítulo no 11º Volume da Coleção
Comemorativa dos 80 anos do Direito da UERJ. O lançamento com autógrafos, com
mesa de autoridades jurídicas, foi embalado pelo Coral desta Universidade que
abriu com canção indígena de festa da colheita da mandioca, as raízes em tão
vasta obra dos vários direitos ali ensinados.
A frustração pela extinção da
ABRAPIA, Organização Não Governamental que cuidava de todas as formas de
violação de Direitos da criança e do adolescente, castigo físico, abuso físico,
sexual, psicológico, bullying, exploração sexual, pornografia infantil, tráfico
de crianças e adolescentes, turismo sexual infanto-juvenil, trabalho infantil,
a qual eu presidi por dois mandatos, não nos fez parar. Doeu. Funcionava. É
lamentável que um bom trabalho tenha se perdido. A rede formada e bem
articulada em todo o Brasil. A estrutura de conexões abrangia Ministério
Público, Conselhos Tutelares, Polícia Federal Especializada, Casas de
Acolhimento, Centros de defesa da Criança e do Adolescente. Tudo interligado
pelo número 0800 990500, instalado pelo Ministério da Justiça na ABRAPIA, pelo
então Ministro José Gregori. Foram mais de 5 milhões de
denúncias nos anos que a ABRAPIA se responsabilizou pelo 0800, em parceria com
a Word Childhood Foundation, W.C.F., e o Ministério da Justiça. Foram refeitas
novas redes, e instituído o Disque 100 pelo Ministério da Secretaria de
Direitos Humanos, que funciona muito bem no acolhimento de denúncias de
violação de Direitos da Criança e Adolescente. Mas a judicialização das
questões intrafamiliares, tomou caminho diverso, desvirtuado, e lamentável.
A frustração da não realização do
Projeto de tratamento para crianças e adolescentes que sofreram violência
sexual, que me foi diretamente pedido pela Ministra Maria do Rosário, da
Secretaria de Direitos Humanos, que pretendia fazer política pública para
crianças e adolescentes, também doeu. A Ministra saiu da pasta. As gavetas do
Planalto guardam muitas coisas.
Na Letra da Lei somos exímios protetores
de crianças e adolescentes. Mas, na verdade, só no E.C.A. a criança tem
direitos fundamentais. Mas a efetividade do que está escrito não acontece. As
campanhas de denúncias são ilusórias porque não garantem a interrupção das
violações, e acabam por proteger o adulto violador. Têm sido invertidas as
posições de vítima e algoz, sendo penalizada e criminalizada a mãe que busca
proteção para o filho ou filha que revela, por exemplo, um abuso sexual
intrafamiliar.
Esta minha trajetória tem sido
penosa. A luta é inglória. Quando se tem um perverso, e todos que praticam a
violação e exploração do corpo de uma criança ou adolescente, com o objetivo de
saciar uma compulsão ou de ganhar dinheiro, estão no exercício de uma
perversão, é muito difícil o combate. E, facilmente, pelo horror que causa ao
outro, constatamos que Operadores de Justiça usam, amplamente, o mecanismo de
defesa do ego definido como “a identificação com o agressor”: se o inimigo é
muito forte e monstruoso, junte-se a ele. E o Princípio do Melhor Interesse da
Criança, desce em banguela.
“Cuidado
e Afetividade” já começou a ser escrito. O afeto é pouco entendido em sua
extensão e em sua responsabilidade com o desenvolvimento saudável da criança.
Muito confundido com carinho, com a própria carência do adulto que se ilude com
um comportamento gliscóide, uma pegajosidade que, muitas vezes, sufoca o bebê.
O afeto é para além do enternecimento, do aconchego, necessários e importantes,
mas não suficientes. O afeto está inscrito na responsabilidade. É da qualidade do cuidado que se conceitua o
afeto. Como bem canta a música do Peninha, “quando a gente ama é claro que a
gente cuida”.
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