terça-feira, 7 de janeiro de 2025
Papai Noel! Parte I
Papai Noel!
Parte I
Daremos essa pausa no tema da abundância das mentiras, incluindo as institucionais, para pensar um pouco sobre essa figura que faz parte da infância de todos, e que continua habitando a mente dos adultos.
O fascínio por esta lenda, fantasia, desejo, é universal. Todos conhecemos a história do bom velhinho que passa o ano todo fabricando brinquedos para as crianças, e na noite da véspera do Natal, sai de sua casa nas longínquas montanhas nevadas, e pilotando seu veículo puxado por renas imponentes e dispostas, voadoras, vai entregando os brinquedos, invadindo docemente as casas pela chaminé, sem sujar nunca sua roupa, nem sua longa barba de um branco impecável. Não importa se moramos em apartamentos, se moramos em zonas tropicais onde inexistem as chaminés de lareiras, não importa se nunca vimos uma rena. A ideia do Papai Noel nos envolve em encantamento.
Uma música indaga: “como é que Papai Noel não se esquece de ninguém, seja rico seja pobre o velhinho sempre vem”. Não é verdade. Essa figura existe para todas as crianças, mas muitas não ganham presente dele. Muitas. A desigualdade se encarrega de excluir da lista do bom velhinho milhares, milhões de crianças. Algumas ações sociais tentam amenizar essa frustração, promovendo distribuições que seguem outros critérios. As famosas cartinhas para o Papai Noel, que fazem parte do ritual para que os pais conheçam o brinquedo desejado, em sua forma de adoção, as cartinhas endereçadas aos Correios, vêm nos surpreendendo com o pedido. Além da boneca, da bicicleta, começam a aparecer pedidos que contrariam o vetor de ser criança e pedem o remédio que a mãe precisa tomar, ou a peruca para a mãe cobrir a queda total de cabelos após uma quimioterapia, ou outra “tia” para substituir aquela que toma conta dele e o maltrata. Pedidos que denunciam nosso fracasso como sociedade em se tratando de Direitos Fundamentais. A injustiça vivida precocemente.
Mas, hoje, quero me debruçar sobre a figura imaginária do Papai Noel. Entendo que opiniões divergem sobre benefícios e malefícios. Dizem alguns que é contar uma mentira para a criança, desconsiderando que os contos de fada e historinhas de heróis infantis, fazem parte da infância de um jeito ou de outro. Faz-se necessário pensar que alimentar o imaginário da criança é fundamental para seu pleno desenvolvimento afetivo, cognitivo e social. Todas as figuras imaginárias, as antigas, as culturais e as regionais, as atuais, elas abrem o campo das possibilidades, em fantasia, de perigo, de conquista, de competitividade saudável, de amizade, de proteção, passam ensinamentos que a linguagem verbal de regras não consegue alcançar a mesma dimensão. É um constante aprendizado. Vale ressaltar que esse alimento do imaginário é responsável pela criatividade e pela resolução de problemas na vida adulta.
Descobrir que Papai Noel não existe, que é o pai ou a mãe, uma avó ou um avô, que colocam escondido aquele presente desejado na árvore de Natal, não se constitui fato traumático. A Criança vive essa descoberta como uma conquista, como ganhando um jogo entre ela e seus pais, e se orgulha de sua descoberta. Não há mágoa nem rancor, não se sente lesado. Ao contrário, se sente mais próximo do mundo dos adultos, crescendo.
Gostaria de compartilhar um pouco de minhas lembranças afetivas do Natal. Em Recife, havia uma grande loja de departamento, acho que Souza Leal, que tinha um andar de brinquedos. E um Papai Noel recebendo as crianças e suas cartinhas. Não tinha sessão de fotos, as fotos, nítidas até hoje, estão na minha memória. Ainda não sabia escrever muita coisa, e menos ainda meus irmãos menores. Por isso pedíamos a ajuda da nossa mãe. Só minha irmã, 6 anos mais velha, que não queria nunca escrever. Um dia perto do Natal íamos levar as cartinhas para ele. Na véspera de Natal, crianças de roupa nova especial para a ocasião, íamos cedo da noite ver a decoração do centro de Recife. Cortada por dois rios, a cidade fazia pequenas árvores de luzes coloridas simples que boiavam nos rios e podiam ser vistas das pontes em sua multiplicação de luzes refletidas, era lindo! Sempre perguntava, às vezes à minha mãe, às vezes ao meu pai, como o moço que colocou as lâmpadas não tomou um choque. Ouvia a explicação, mas no ano seguinte repetia a pergunta.
Mas antes da pergunta e do encantamento pelo espetáculo, era um verdadeiro espetáculo para mim, todos os anos, quando estávamos no portão da casa, minha mãe pedia para meu pai verificar se a janela de um dos quartos tinha ficado aberta, e meu pai entrava sozinho na casa por alguns minutos. Voltava dizendo que estava tudo certo.
Uma dessas noites, ali, esperando, me dei conta que havia um combinado nessa tal janela aberta, igual todos os anos. E descobri, em silêncio, que meu pai entrava para colocar nossos presentes na árvore. Tenho nítido também esse momento, como uma fotografia de alta resolução. No ano seguinte não quis mais escrever a cartinha. Pedi diretamente para o meu Papai Noel.
Feliz Natal a todos! Em especial às crianças que não têm Papai Noel, só o veem ao longe nas decorações e nas publicidades de consumo. Esta é uma inclusão necessária. E vida longa para o Papai Noel!
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