quinta-feira, 6 de março de 2025

Espacialidade e Temporalidade Parte IV

Espacialidade e Temporalidade Parte IV Quando trouxemos os conceitos da Espacialidade e da Temporalidade como tema, estávamos tomando emprestado esses processos do desenvolvimento cognitivo na criança para sugerir uma reflexão sobre a perversidade que vem se alastrando nos laudos e pareceres que objetivam a defesa de agressores, que continuam sendo consagrados, socialmente. Muitas são as injustiças cometidas por profissionais que teriam a obrigação de considerar o conhecimento aprendido nos bancos universitários. São muitos os conceitos psicológicos de desenvolvimento que têm sido aviltados. Para além da precariedade da aprendizagem teórico-técnica e do raciocínio lógico, nos deparamos com essa liquidez das relações interpessoais. Não se conhece mais o compromisso com o outro, menos ainda, a responsabilidade pela consequência de uma inconsequência escrita na indução de uma sentença jurídica. E, a praxe é empurrar a criança vítima nas garras do seu algoz, intitulando a mãe de louca. Essa praxe promove prejuízos insuperáveis. Não há nenhum controle posterior ao dogmático afastamento determinado para a mãe que ousou denunciar um homem, visto sempre por juízes como “ilibado”. Essa é uma definição atribuída, com frequência, pronunciada por agentes de justiça. Mas, à luz do olhar sociológico de Bauman, para onde vão os processos de Espacialidade e de Temporalidade nessa Modernidade Líquida? Não há um avanço de velocidade ou de aproximação de distâncias com seus necessários intervalos de tempo. Há uma quebra irreversível, há o aniquilamento do Espaço e do Tempo. Um clique, sem nenhum esforço, e fomos transportados para o Museu do Louvre. É impossível para uma criança que lhe dedicam horas diárias de manuseio de um aparelho celular saber fazer a leitura das horas em um relógio de ponteiros. Assim também, lhe é penoso esperar. A aprendizagem da espera é incompatível com sua hiperatividade, diagnóstico que viralizou. Se apertar uma tecla lhe fornece, em nenhum tempo, uma resposta que já traz o próximo estímulo para que aperte de novo, o mais rápido possível a mesma tecla, não há espaço para a espera. E quando se faz necessário, torna-se, até mesmo, doloroso, insuportável. Não por acaso, temos uma legião de crianças que não sabem mais usar o espaço de seu corpo no espaço ao redor, com o espaço dos outros corpos de outras crianças, formando uma brincadeira com múltiplas sensações, tendo como resultado conclusões lógicas experimentadas de Espaço e Tempo. O objetivo e o subjetivo precarizados. Como o Tempo é intangível, e a infância é a fase do raciocínio concreto, do objetivo, da experiência de ver, pegar, a criança tem muito mais dificuldade em apreender essa Noção. Sem experimentar os intervalos, ela não consegue lidar com intervalos de tempo variados ao lado de uma aniquilação completa de Tempo. Como construir um esboço de conceito quando se tem duas impressões subjetivas, absolutamente, antagônicas? Por um lado, a inadequação de uma “aprendizagem” equivocada, que leva a criança ao erro e à, consequente, intolerância à espera, ou a qualquer esforço físico para medir o Espaço, (lembrando que o corpo é sempre usado como parâmetro). Por outro, adultos parecem ter um celular nas mãos quando desconsideram as leis do desenvolvimento e condenam crianças à convivência nociva. Sem medir Espaço e Tempo pessoais da criança, tomam o caminho da aniquilação da dignidade inscrita na Lei. Mas, desrespeitada. Considerando que, durante a infância, as aquisições, todas, são operadas por experimentação, fazendo uso do raciocínio concreto, como “esquecer” dessa lei natural e cobrir de preconceitos uma criança quando ela está relatando uma agressão que sofreu. Ressaltando que aprendemos a andar porque experimentamos, a falar porque experimentamos fazer os sons para dar nome aos pedaços de mundo que nos rodeiam, a gostar e ser gostado porque experimentamos sensações agradáveis e desagradáveis, fazendo delas nosso acervo afetivo, e, a pensar pela experiência, somente pela experiência com todo o rigor da lógica, mesmo que infantil e ainda precária. A curiosidade intrínseca, que parece nascer da necessidade de cuidar da sobrevivência, é o que nos torna seres, absolutamente, epistemofílicos. É o que nos impulsiona. Precisamos saber, saber e, saber, com consistência, com consequência, com correição.

Espacialidade e Temporalidade Parte III

Espacialidade e Temporalidade Parte III O Espaço, o objetivo, o tangível. O Tempo, o subjetivo, o intangível. Para nossa vida cotidiana precisamos dessas duas Noções muito bem adquiridas e consolidadas em experimentações repetidas. Muitas vezes nem nos damos conta que estamos usando a Espacialidade e a Temporalidade, tamanha é a presença delas em todos os momentos vividos. O fora e o dentro andam juntos, lado a lado ou misturados, eles se complementam para a composição de nós mesmos. Se o relógio de carrilhão da minha infância se tornou peça de antiqu[ario ou de museu, assim como o relógio de pulso ou de parede que marca com ponteiros, em configuração que a aprendizagem da interpretação das horas se faz necessária, as crianças atuais não são apresentadas a esse conhecimento. Não são mais alfabetizadas na leitura das horas no instrumento que concretiza o Tempo. Concretização tão necessária para seu desenvolvimento cognitivo, que só se faz pelo raciocínio concreto durante a infância. O Tempo para elas agora é digital, e contado em “fases” de joguinhos eletrônicos. Essa modalidade não substitui o percurso da aquisição por experimentação do conceito de Tempo. Ter maior rapidez diante de estímulos criados nos joguinhos através do mesmo movimento de apenas um dedo num controle eletrônico, não se faz a estimulação suficiente para o desenvolvimento das possibilidades variadas dos tempos que precisa aprender. Ou seja, um movimento, simplesmente, reativo que não é pensado, nem avaliado em alternativas, porque elas não existem, a regra é zero ou um somente, não provoca a maturação dos sistemas implicados nessa Noção, em especial, na Noção de Tempo. O único mecanismo treinado, não aprendido, é a velocidade automatizada da resposta ao mesmo estímulo, repetitivo e vazio de sentido para sua aquisição de conhecimento. Zygmunt Bauman, sociólogo e filósofo polonês da atualidade, escreveu, entre outras obras, o livro A Modernidade Líquida. O pensador nos chama a atenção para a fluidez e volatilidade das relações humanas de nosso tempo digital, em contexto de aniquilamento das leis de Espaço e de Tempo. Essa é a mágica, a do dedinho, que carrega prejuízos de desenvolvimento incalculáveis para a criança. As pessoas hoje pensam que mensuram a inteligência de uma criança pelo arrastar do seu dedinho numa tela de celular ou de similares. Lembro que os chipanzés também descobrem que a tela muda ao arrastar o dedo nela, e ficam curiosos em repetir o gesto mecânico, combinado com uma presteza também automatizada. Enquanto uma criança, ou até mesmo um bebê, que já se mantem sentado mexe na telinha só arrastado o dedinho, ele está deixando de experimentar o caminho árduo da motricidade fina, aquela que vai garantir mais tarde segurar um objeto com 3 dedos, um lápis, por exemplo, que começa a preparar a aquisição da língua escrita e, depois, percorrer a longa caminhada que pode levar à agulha da sutura, ou ao bisturi da cirurgia, ou ao pincel que produz Arte. Parece-me, no entanto, que este não é o pior dos prejuízos. A motricidade fina fica em atraso, mas pode ser recuperada, mesmo que com as repercussões psicológicas e escolares causadas. É a aniquilação do Espaço e do Tempo por um instantâneo clique que mais prejudica. Como apreender uma distância, ou um intervalo, como entender a velocidade de um veículo em um dado espaço geográfico quando se é introduzido primeiro numa mágica de instantaneidade pela aniquilação dos dois conceitos da realidade, o de Espaço e o de Tempo. As crianças têm aprendido o errado virtual e depois são obrigadas a aguentar a realidade. Não à toa temos uma proliferação de quadros de transtorno de comportamento. A hiperatividade nunca esteve tão à mostra, ocasionando dificuldades de aprendizagem. Os humanos são Epistemofílicos por excelência. A curiosidade, inicialmente movida pela necessidade de sobrevivência, transborda e promove este caminhar, cada vez mais complexo, para o conhecimento do seu entorno, sempre seguindo regras que lhe confiem conclusões, mesmo que, por vezes, ainda parcialmente equivocadas. A importância da aquisição da Espacialidade e da Temporalidade, e a perfeição do sincronismo dos processos de maturação, têm sido negligenciadas não só pelo desconhecimento dos leigos, assim como por profissionais que insistem em negar a realidade dos processos de desenvolvimento infantil. Ora, pintam a criança como um fantoche bobo na mão de uma adulta maliciosa, louca, ora, atribuem “capacidades” magicamente adquiridas, como se gênios mirabolantes fossem todas as crianças que fazem uma denúncia, atribuindo-lhes a psicopatia da mentira ardilosa, antes que tenham capacidade para mentir. Portanto, impossível. Como se uma criança dissesse que quer dar um carro de presente para a mãe porque as ações da bolsa de valores que ela comprou, renderam muito bem. Quando só poderia dizer que tem muitas moedas com douradinho no seu cofrinho e dá para comprar o carro para a mãe. A aquisição da Espacialidade e da Temporalidade segue a Natureza. Todo o desenvolvimento infantil em seus vários setores segue a lógica do raciocínio concreto, se operando por experimentações. É só estudar e ter honestidade profissional. Vamos abordar esse tema na próxima semana.

Espacialidade e Temporalidade Parte II

Espacialidade e Temporalidade. Parte II Continuando. Na Parte I desse Artigo, Espacialidade e Temporalidade, nos debruçamos sobre quando e como adquirimos essas duas noções, espaço e tempo. O Espaço, pelo seu caráter objetivo, e concreto, é adquirido antes do Tempo. Trouxemos a compreensão do processo de aquisição que acontece a partir do Marco Zero, o próprio corpo. É em referência à essa invariável, que o parâmetro vai sinalizando os dados externos do Espaço que vão sendo captados pelas percepções sensoriais. Um momento importante do desenvolvimento motor é o sentar. Essa capacidade de sentar vai trazer para o bebê o controle visual do ambiente, ao sentar ao chão seu corpo se torna o eixo, iniciando, assim, a representação psíquica do Espaço. Girar o corpo em 360° permite apreender o entorno, partindo da invariável, o chão e a altura dos olhos, e aprender que as percepções espaciais são confiáveis, e se tornam, assim, conhecimento. A aquisição da Noção de Espaço tem o facilitador do tangível, do concreto do entorno do bebê. O Espaço é objetivável e objetivo, faz parte da realidade. Mesmo que acompanhado de uma emoção, uma sensação que imprime algo por dentro, um sentimento, ele é captado pelos dados perceptivos, pelos sistemas sensoriais. Essa dimensão objetiva está em perfeita consonância com a fase do Desenvolvimento Cognitivo que durante toda a infância, de zero a 11 anos, é operado em raciocínio concreto. É pela experiência que a aprendizagem de todos os tipos, a cognitiva, a motora, a linguística, a afetiva, vai sendo adquirida e sedimentada. O processo é complexo e completo, executado com uma perfeição, experiência por experiência, na melhor performance possível. Se o Espaço é físico, tangível, mensurável, o Tempo é subjetivo, intangível, com medidas distintas, quase invisíveis, para sua mensuração. Para uma criança apreender o conceito temporal é algo muito difícil, pois não há em seu corpo uma referência que ele possa usar para fazer sua pesquisa científica. O único dado que ela tem é a sua idade que decora a cada aniversário. Sem saber bem o que é ter 4 anos, ou 6 anos. As primeiras idades são concretizadas nos dedinhos da mão. Mas é a primeira medida de Tempo que adquire. O Tempo é mensurado por relógios e calendários. Eram. Hoje uma criança não conhece um relógio de ponteiros. Relógio de carrilhão que tem que receber “corda” todos os dias, é uma peça de museu ou de antiquário. Tive o privilégio de passar a infância convivendo com um relógio de carrilhão que ficava em cima do piano na sala. Enquanto fazia os deveres escolares, escutava as badaladas das horas certas e os acordes dos quartos de hora. Era um tipo para anunciar os 15 minutos passados, outro tipo para os 30 minutos, outro para os 45 minutos, para finalmente ser completo e com o número de badaladas correspondente à hora inteira. À noite, depois do jantar via meu pai pegar uma chave especial que rodava nos buracos de aros dourados, que garantiam o trabalho do relógio e todos os acordes do dia seguinte. Era um ritual que se repetia todas as noites, como se o Tempo dependesse daquela tarefa. Confesso que não tenho ideia do quanto essa espécie de materialização do Tempo me auxiliou a aprender a saber das horas. Aliás, era matéria que fazia parte de provas nos primeiros anos de escola. Fazia parte da alfabetização. Aprender a ler as horas era caminhar no processo de aquisição da Noção de Tempo. O antes e o depois, o fui e o vou, não têm apoio no concreto. A Cognição avança, mas o equívoco de que tudo pode ser reversível, exemplo, abre aos pedaços um brinquedo que acabou de ganhar e depois quer que volte a ser o brinquedo ganhou, esse equívoco é desalojado por volta dos 7 anos com a construção cognitiva da Noção de Irreversibilidade. Essa Noção cognitiva surge com o início da Noção de Morte. A Morte é, por excelência, Irreversível. Ao despertar para essa essência, a criança incrementa a Temporalidade. Às vezes há uma facilitação da Irreversibilidade da Morte na construção da Noção de Tempo. Mas, há também momentos em que essa Noção de Irreversibilidade vai dificultar a aquisição da Noção da Temporalidade, quando, por exemplo, a ideia de Morte está associada a alguma figura afetiva importante. É frequente que a criança diga que a mãe dela só vai morrer com 100 anos, um número que demora muito a ser contado. Lamentável que pessoas insistam em manipular o belo, travestindo em acusações cruéis contra a criança pintada como maldosa e ardilosa, criatura ruim que promove intrigas entre adultos, como a afirmação de que a criança mente. À criança falta o filtro social, ela sofre de “sincericismo”. Alimentadas pela Modernidade Líquida, com sua volatilidade e fluidez nas relações interpessoais, definição tão bem proposta por Bauman, sociólogo e filósofo, e surfando a onda da superficialidade e da desresponsabilização com o emprego de seitas interesseiras, desamparam a criança, apesar do aparato do corolário de Leis que contemplam a vulnerabilidade, condição que necessita de Proteção Integral. É, verdadeiramente, encantador admirar e ESTUDAR os processos de desenvolvimento da Criança. Essa Grande Orquestra afinada em todos os instrumentos, das milhões de sinapses, as mais simples e as mais complexas, à repetição científica de gestos e movimentos para sedimentar uma nova aquisição motora ou cognitiva, a “Música” executada é linda. ______________ Continuaremos no próximo artigo pensando a Espacialidade e a Temporalidade no Desenvolvimento das Crianças de hoje à luz das ideias de Bauman sobre a Modernidade Líquida, a telinha do celular nas mãozinhas dos pequenos. Os efeitos, os prejuízos.

Espacialidade e Temporalidade Parte I

Espacialidade e Temporalidade Parte I “Eu fui no cinema amanhã ver o Rei Leão”. “Fui” e “amanhã” se referindo à mesma experiência de uma criança de 4 anos. Se for perguntada sobre o ambiente físico do cinema, ela fornecerá alguns dados interessantes para a compreensão do processo de aquisição das noções de espaço. Certamente memorizou que a cadeira “fechava” se ela se mexesse de uma certa maneira. Citaria o escuro e o som alto. Esses são dados sensoriais obtidos na experiência do primeiro cinema. Na percepção sensorial memorizada fica a existência concretizada da luz e do som. Quando e como adquirimos essas noções de espaço e de tempo? O desenvolvimento de uma criança é uma obra de arte perfeita. As comunicações de sistemas, as sinapses neurológicas em profusão, e diria, as outras sinapses, uma espécie de “intersinapse” ou “multisinapse”, que transmitem as comunicações entre vários sistemas dentro do corpo. Trabalho contínuo, e crescente a cada segundo durante a infância. Não conseguiríamos contar quantas sinapses foram necessárias para a elaboração da frase inicial: eu fui no cinema amanhã ver o rei leão. Milhões e milhões. E se pedirmos para a criança repetir em seguida, já teriam entrado na frase mais alguns milhões de sinapses. Uma criança de 3 anos já tem um razoável esquema corporal dela mesma. Ela localiza e nomeia as partes do seu corpo, tem uma autopercepção dos acontecimentos sensoriais que ocorrem no seu corpo, e, o mais importante, é a partir desse esquema corporal que ela vai construir sua noção de espacialidade. O espaço é aferido pelo seu corpo, ele é o parâmetro para dimensionar o espaço em que está inserida e o espaço que de sua observação. Mergulhada na engrenagem do ininterrupto sistema sináptico neurológico, para construir essa noção, ela lança mão do seu acervo de cognição e de linguagem. Mas é, principalmente, pela sua motricidade que ela fará com que os dados sensoriais, suas percepções concretas, se tornem um primeiro conceito de espaço que irá se sofisticando à medida que seu desenvolvimento vais ocorrendo e se tornando cada vez mais complexo. Os gestos corroboram o espaço. E a criança tem na fase da imitação, fase do desenvolvimento cognitivo que organiza a partir das identificações aparentes das pessoas que lhe importam. A noção de espaço, portanto, nasce e vai crescendo a partir do seu corpo, que é o espaço primeiro. Completamente compatível com o seu funcionamento cognitivo, em raciocínio concreto, até os 10-11 anos. O espaço é perceptível, é palpável, é concreto. O “onde” pode não ser pronunciado corretamente numa resposta de uma criança de 3 anos, mas ela é capaz de descrever com algumas referências que estão na realidade. Mas o tempo não é tangível concretamente. A noção de tempo não se alimenta do concreto. Onde ela poderia ver o ontem, o hoje, o amanhã? Buscando na linguagem os advérbios, lembrando que ela não sabe o que é um advérbio de tempo, ela, frequentemente, se confunde com o significado dele. “Amanhã eu fui” é a comprovação dessa dificuldade de aquisição pela ausência de concretude, do fator experiencial. A criança diante dessa dificuldade tenta apelar para localizações, em geral, em auto referência. Quando o corpo dela reaparece em seu discurso: “quando eu era pequena”, “quando eu tinha 2 anos”, ou “quando eu estava na escola”, e, assim, consegue minimizar sua deficiência relativa à noção de tempo. Ela será auxiliada pelo raciocínio de seriação. Essa é a época dos álbuns de figurinhas, da aprendizagem da numeração, a experiência cognitiva das sequências. Essa fase, em torno dos 6-7 anos, é essencial para construir a noção de tempo. É o antes e o depois das figurinhas. E essa descoberta transborda e a criança inclui em suas brincadeiras o ordenamento de carrinhos, de lápis, de bichinhos ou bonecas, criando filas que obedecem a um critério de ordem que ela estabelece. Como um cientista, todas as aquisições no desenvolvimento motor, linguístico, e, principalmente, cognitivo, regados pelo afetivo, e patrocinado pelas sinapses das transmissões neuronais, a criança cresce repetindo padrões rigorosos para concluir por um novo dado. É um funcionamento científico onde a observação e a repetição de qualidade, escolhendo uma única variável, vão levá-la à verdade do mundo que a rodeia. Ela é muito séria nessas pesquisas sobre cada mistério ao seu redor, para que forme e ajuste a cada dia sua visão de mundo. Por isso seu enorme apego à verdade. Não tem filtro social, e muitas vezes fala o que, socialmente, deveria guardar, colocando os adultos em saia justa. Aprende bem pequena a dizer que “é verdade verdadeira” quando percebe que alguém não está lhe dando crédito.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

As Macro Violências Sociais contra Crianças e Mulheres. Parte III

As Macro Violências Sociais contra Mulheres e Crianças Parte III Na era pós-moderna a Psiquiatria deu um empurrão, mais um, no ódio pela Mulher. A sexualidade feminina e os primeiros sinais de reação à submissão absoluta ao Homem, entendido como o chefe e provedor único da prole, o dono da família, foram interpretados e tipificados em Patologia Mental. A leitura feita pelos psiquiatras e neurologistas da época denominou como Histeria essas manifestações femininas, arroubos do útero. Histeria vem de Hysterus, o útero. Histérica = louca. Essa denominação sequenciou a denominação de bruxa que devia ser queimada. A “bruxa” era aquela mulher que tinha conhecimento de ervas e plantas e curava doenças que médicos homens não curavam. Portanto merecia a fogueira por tamanha ousadia. Antes disso, e desde sempre, a mulher é odiada porque é ela que, segundo história religiosa, conversa com o diabo/serpente, seduzindo em seguida o pobre homem, sendo, portanto, a culpada por todo o sofrimento de todos os humanos. Portadora da maldade. Restou-lhe apenas a capacidade de gerar e de amamentar garantindo a sobrevivência dos descendentes humanos. A Maternidade, enquanto único Poder da Mulher passou a ser alvo de depredação. E seu exercício saudável é um chamariz de violência. Sua palavra no que tange essa Maternidade é desacreditada, desvalorizada, e acaba por ser alojada no canto da depreciação. Afinal, é uma histérica, uma desequilibrada, uma louca. É-lhe atribuída tamanha periculosidade que é proibida de ter qualquer contato com aquele que tentou proteger do predador incestuoso. Penso que nesse ponto, quando lhe é atribuída a definição de altíssima periculosidade, os fantasmas da mulher que conversa com o diabo sobrevoam as mentes de juízos que creem na idolatria da seita misógina. E Mulher e Criança são taxadas de mentirosas. Quantas vezes ocorre uma Violência Institucional praticada por um juiz de família que ameaçando a mãe, “você não vai mais ver seu filho na vida”, aos berros, coagindo abertamente a mãe que denunciou estupro de vulnerável perpetrado pelo genitor, obtendo uma assinatura em prantos dessa mãe. A Retratação criminosa passa a ser a única verdade, não importando mais nenhuma prova nem mesmo exame de corpo de delito atestando positividade para estupro. Talvez alguns pensem que isso é uma exceção, e que se restringirá àquela mãe e àquela criança. Não devemos ser ingênuos. Primeiro porque se tornou corriqueiro. Segundo porque há desdobramentos das consequências e sequelas tanto na mãe quanto na criança. Isso atinge a sociedade toda. Pode não parecer. O segredo de justiça não consegue apagar porque, a partir desse momento, nada será como antes. A omissão do entorno não apaga os fatos. A verdade sempre aparece, mesmo que seja depois de um estrago irreversível. Só o óbito de mãe e criança pode cessar a violência que prossegue. Mas os óbitos falam por si só. Mas eles não serão contabilizados como tendo sido causados por erro jurisdicional. Já aconteceu de se tornar peça de defesa do Criminoso pela alegação de que o pobre homem perdeu a cabeça e matou a mãe, ou a criança, ou as duas, porque estava sofrendo alienação parental por parte da mãe. É inacreditável a inversão perversa. Se temos a Lei Maria da Penha que se propõe a combater 5 tipos de violência contra a mulher, sua implementação não avança. Quando precisamos intervir numa Delegacia de Mulher, dita especializada para acolher essas denúncias, porque o inspetor se nega a fazer o BO porque ele, (ELE) não está vendo os hematomas do espancamento que uma mulher sofreu do marido, desesperada em choro, está relatando, e temos que entrar com nossa palavra branca, não nos damos conta que em pele negra os hematomas são, dificilmente, enxergados. Nosso parâmetro é de marcas em pele branca. Os hematomas da alma que estavam, claramente, expostos por aquela mulher, não importam. São loucas, mentirosas, histéricas. A OMS divulgou que mais de 2 milhões de pessoas morrem por ano por Erro Médico. Nós engrossamos essa soma. Mas já demos a solução. Criatividade não falta. Ficou abolido o termo “Erro Médico” no Brasil. Agora vamos chama-lo de: “Situação Adversa da Saúde”. Pronto. Não tem mais erro médico por aqui. Substituindo o termo, mata-se o fato. Assim vem sendo feito com o Estupro de Vulnerável Intrafamiliar, a forma mais frequente. É alienação parental da mãe. Não importa se esse termo não tem cientificidade, não tem fundamentação teórica. Já foi montada até uma Escala de Alienação Parental, que se diz “científica”, sem expor os critérios científicos, as pesquisas rigorosas. Um check list que contraria toda a Ciência da Psicologia. Mas, como no caso do Erro Médico, que vai ser extinto em breve, para dar lugar à Situação Adversa da Saúde, não existe mais abuso sexual intrafamiliar de Criança. Tudo é alienação parental de mãe louca. São Macro Violências Sociais contra Mulheres e Crianças.

As Macro Violências Sociais contra Crianças e Mulheres Parte II

As Macro Violências Sociais contra Crianças e Mulheres. Parte II Liberar armas afrouxando as leis que fiscalizam e rastreiam seus caminhos em mãos que, sob o falso título de caçadores e colecionadores, apertam o gatilho com rapidez e sob um motivo irracional, é uma violência contra mulheres e crianças. São as mulheres/mães que choram e vão carregar para sempre uma dor insuportável pela perda do filho. Sabemos que é um calo repetir que aquele filho era trabalhador e ótima pessoa. Todas as mães assim os descrevem. Para cada mãe, cada filho seu é ótimo quando ele é atacado de alguma maneira. Mais ainda quando a filha ou o filho fuzilado é uma criança. Na guerra urbana que vivemos todos os dias, em especial no Rio de Janeiro e em São Paulo, as crianças, como as da Guerra do Oriente Médio, as Crianças de Gaza, as Crianças Israelitas feitas reféns, as Crianças da Ucrânia, as Crianças Sírias, as Crianças Ianomamis, (nem se fala mais), as Crianças dos países africanos, as que matamos de fome e as que matamos de tiros e mísseis, todas elas são mártires sociais. Nós subtraímos a vida delas em seu início. Poderíamos acrescentar as crianças que estão morrendo de cânceres plantados nos seus corpinhos por agrotóxicos venenosos, garantidos em uso pela ganância econômica de um pequeno grupo. Seria um cego projeto de necropolítica? Quando liberamos armas de tiro ou venenos agrícolas, não podemos precisar quais crianças vão ter a vida ceifada. Também a violência doméstica em sua forma de estupro de vulnerável, quando é minimizado e impune, não temos ideia da reverberação daquele crime. A criança violada que não é protegida pela Justiça, pode vir a casar e ter filhos com os filhos ou netos do juiz que inocentou quem a violou. A possibilidade é bem grande. Não porque, como já se pensou outrora, “abusado hoje, abusador amanhã”, mas porque a experiência de opressão e submissão ao juiz na infância, alimenta o desejo inconsciente de se acercar sempre do Poder, das pessoas Poderosas. A opressão é uma via estreita de mão única, dividida em alternância entre opressor e oprimido. O instinto de humilhar é insaciável. Chamar de instinto pode parecer exagerado, mas é seu caráter permanente que contempla melhor essa conduta que não é tratável. Assim, precisamos pensar esse comportamento de perversidades, muitas inimagináveis para as pessoas comuns, com a infinitude peculiar. Cada vez que você toma conhecimento de um novo caso de estupro de vulnerável, você é surpreendido pela descrição bizarra, bestial, asquerosa, de atos de lascívia que superam qualquer Maquiavel. Vindo do microcosmo da família, que insistem em chamar de “família de bem”, ou de “lugar seguro”, esses comportamentos, extremamente, aberrantes se desdobram em macro violências sociais porquanto a impunidade é cada vez mais estrutural, no desprezo às leis de Proteção Integral à Criança. Fazendo jus ao bom propósito do Princípio do Melhor Interesse da Criança, o ECA contém a excelência da justa legislação. Mas não é obedecido. Uma única lei do ECA impede a Proteção da Criança. Retomando a hipótese de haver um projeto de necropolítica em curso, dirigido a crianças e mulheres, pensamos que no exercício desse Poder de determinar quem morre e quem tem direito à vida, os vulneráveis, agora nomeados com o acréscimo das pessoas LGBTQIAP+, e os indígenas, sem nenhum constrangimento ou subterfúgio, escancara-se uma espécie de licença para matar. Morte por cancelamento virtual da terra sem lei, tão defendida como tal; Morte psicológica pela desqualificação da Voz da Criança, levando-a ao enlouquecimento da Retratação, judicialmente, obrigatória; Morte por tiro de fuzil no quarto dormindo, no escorrega do parquinho, na calçada de casa, no banco de um transporte; todas, Mortes por Violência Social. Leis, existem. E como pode uma menina que gritava, gritos ouvidos pelos vizinhos, foi morta pelo padrasto, hematomas, lacerações de órgãos e abusos sexuais, em repetição similar ao caso de Joanna (2010) e Henry (2021), entre tantos outros. Parece que nada muda. Parece? Assassinatos que todos nós praticamos por ação ou omissão.

As Macro Violências Sociais contra C rianças e Mulheres Parte I

As Macro Violências Sociais contra Crianças e Mulheres Parte I Temos nos dedicado à observação da inundação de violência intrafamiliar contra a Criança e a Mulher. Os índices são estarrecedores. E crescentes. Parece que caminhamos rumo à banalização, apesar de termos boas leis de Proteção. Este é um primeiro ponto muito interessante para uma reflexão. Se temos uma boa lei que combate 5 tipos de violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha, lei 11.230/2006, elogiada e copiada por vários países como de excelência, por que será que ocorrem 4 Feminicídios a cada 24 horas? Por que Crianças continuam na cena do crime, assistindo e acompanhando toda a escalada da violência contra suas mães? Onde se esconde o ECA? E o que diríamos da mortandade de Crianças e Adolescentes, assassinados pelas “balas achadas”, nos combates de guerras entre facções, entre facções e milicianos, entre forças policiais e milicianos e facções. É uma espécie de tabuleiro de xadrez, mas com a diferença que é altamente letal. Mas, se tem tanta bala para todos esses exércitos das diversas organizações criminosas, aliás muito bem organizadas, verdadeiros conglomerados produtores de horrores hediondos, não tem lei para esta guerra urbana? Leis de controle e rastreamento de armamento foram afrouxadas. Uma curiosidade de difícil compreensão é a definição para a permissão de compra de armas variadas pelos “CACs”. “Caçadores” quando a caça é proibida. Como é isso? São caçadores de quem? E “colecionadores” que têm permissão para comprar os últimos modelitos de metralhadoras, fuzis, e lança foguetes. Colecionadores, de qualquer tipo de objeto, garimpam as antiguidades, as raridades perdidas e esquecidas nos baús. Uma arma .50 não é um objeto de colecionador. Mas qualquer pessoa com pouquíssima, ou nenhuma dificuldade adquire um fuzil, o matador, por exemplo, precisa só se definir como “CAC”. No entanto, para além da enorme periculosidade dessa arma, alguém que seja preso com um exemplar, só responderá por porte de arma, com pena máxima de 1 ano, lembrando que só vale um sexto disso, não havendo conexão com a penalização de organização criminosa. É avulso. Por que será? Quantas Crianças e Adolescentes já foram assassinados por um tiro de fuzil? Quantos? Nem sabemos. Há um acréscimo de dificuldade na responsabilização desses crimes. Eles ocorrem, principalmente, nas comunidades, na região do apartheid das cidades brasileiras. Essa macro violência fica a cargo de todos nós, mesmo que não tenham sido nossos dedos que apertaram esses gatilhos. Um congresso, o legislador que consegue noticiar que o Senado aprovou uma lei que dá direito à pensão especial para as Crianças e Adolescentes, de baixa renda, que ficaram órfãos por feminicídio de suas mães, lei 14.717/2023. Proteção para esses órfãos que além da miséria afetiva de restar sem mãe, assassinada pelo pai/padrasto, caem em maior miséria financeira. Pelo menos, garantir um alimento para o estômago. O alimento psíquico, nem pensar. E, será que vai ser efetivada a lei 14.717/23? Ou será mais uma “bandeira’ de algum parlamentar para uma próxima candidatura à reeleição? Se temos a Lei Maria da Penha que combate a violência contra a Mulher, protegendo por extensão a Maternidade, é, no mínimo, incongruente que uma apresentadora, pessoa pública, tenha sido condenada a pagar uma pensão de 15 mil reais ao seu ex, genitor de seu filho, por ter denunciado por violência doméstica, com concessão de Medida Protetiva, prerrogativa da Lei Maria da Penha. Os agentes judiciais não percebem que essa é uma comunicação coletiva de que não vale a pena denunciar violência doméstica? Um detalhe desse caso, que é muito frequente, é que o ex usou, como de praxe, a acusação de alienação parental praticada pela mãe. Não raro encontramos sentenças de “guarda compartilhada” em desfavor de bebês recém nascidos. A mãe no puerpério, com as mamas entumecidas de leite porque o juiz determinou que o genitor, que tinha histórico de violência doméstica, deveria ficar com o bebezinho todas as tardes, das 12 às 18hs. À mãe cabia as manhãs e as dores do leite empedrado durante as tardes. Qual a lógica de uma decisão desse tipo? E o bom senso não existe mais? Não é difícil perceber como a legislação é manipulada e serve a pequenos grupos que detém o Poder, e fazem “representantes” em bancadas da bala, da bíblia, do agro, funcionando em lobbies. Mas não existe uma bancada da Criança. Certamente porque criança não vota.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Mentiras em abundância, Escrúpulos em escassez. Parte II

Mentiras em abundância, Escrúpulos em escassez. Parte II Retomando nosso tema começado há 3 semanas, convido a todos para nadar nesse mar. De mentiras. Em contrapartida, os escrúpulos parecem um rio que secou e deixou à mostra aquele solo rachado. Código de Ética? É uma falsa memória implantada por uma ideologia que transpira um ódio estrutural pela Mulher/Mãe, e despreza a Criança, para defender os agressores intrafamiliares. Em nome de um processo de naturalização dos atos de lascívia incestuosos, processo que já está em curso, com vistas à legalização do abuso sexual incestuoso contra a Criança, a defesa de criminosos é garantida. Para isso ser bem sucedido, necessário se faz acusar e condenar Mãe e Criança que trazem a denúncia de crime praticado por um homem. É preciso lembrar que há também mulheres que praticam abusos sexuais em crianças, mas esta incidência recai em número que varia entre 0,1% a 1,0%, pertencendo a mulheres acometidas por patologias outras, distintas da questão que move os homens. É equivocado, como já falamos, pensar que sendo este crime praticado no campo da sexualidade no corpo da criança, esse predador seria hipersexualizado. O prazer pela sensação de Poder absoluto é o gozo do predador sexual de crianças e Mulheres. Por isso sua similitude com a violação de animais e a violação de mortos. Os 3 grupos, Crianças, Animais e Defuntos, por sua vulnerabilidade essencial, não são capazes de dizer “não”, o que exacerba a sensação de Poder opressor. Há uma campanha permanente de divulgação de artigos que espalham mentiras e induzem a posturas, diria mesmo, autoritárias. Transparece o quase delírio de Poder de um saber sem sustentação. Encontramos afirmações que da mesma maneira que treinamos as crianças, os pais devem ser treinados também. “Treinados”? Isso parece ser a reedição da teoria de Pavlov que treinava cães para salivarem quando uma buzina tocava. A experiência se dava para que ocorrendo a associação de uma buzina ao receber uma porção de carne, o cachorro salivava, e continuava salivando quando era enganado e só a buzina tocava, sem a carne. Os laboratórios humanos nos campos de concentração por ocasião do Holocausto também treinavam para “fabricar” diversos efeitos na resposta a um estímulo. A maternidade e a paternidade devem ser “treinadas”? E por pessoas que seguem teorias e ideologias hegemônicas, seletivas segundo a interpretação de quem detém um Poder momentâneo, em detrimento da decisão responsável, como é uma denúncia? E todas, Mulheres/Mães e Crianças, estão mentindo? Por que então tantas campanhas pressionando para que se faça denúncia? É incoerente. Ou melhor, é uma armadilha para destilar o ódio pela Mulher, aquela que conversou com o demônio, e que ao curar doenças com folhas e ervas, era condenada como bruxa e queimada viva. A Mulher, lamentavelmente, continua a ser olhada como a amiguinha do diabo e como a bruxa que deve ser queimada. Aliás, essa saga da lei emboscada é uma fogueira social da bruxa que se insurgiu contra o ilibado homem que abusa de filhos. Nesta enxurrada de artigos em defesa da condenação de Mulheres e Crianças, parece até que o abuso sexual incestuoso acabou porque tudo é alienação parental, o que não combina com as estatísticas que evidenciam números de casos alarmantes, 1 criança é abusada a cada 8 minutos. Sim. A Childhood afirma que 85% dos abusos são cometidos por conhecidos da criança, pai, padrasto, avô, tio, são os principais, e na maioria dos casos acontece dentro de casa. Os bebês que protagonizam os vídeos pornográficos comercializados na internet, sem muita reserva, evidenciam duas questões fundamentais dessa campanha que visa confundir e naturalizar um crime. Primeiro, bebês não apresentam nenhum item de provocação erótica, não são sensuais, como é alegado quando a vítima é uma menina e tem 9,10, 11 anos. A culpa é dela que provocou o pobrezinho do genitor. Os bebês também não se relacionam com aliciadores pelas redes sociais. Eles são explorados sexualmente dentro de casa, por pessoa que ali mora. Segundo, essa exploração do trabalho sexual infantil não entra nas compilações de casos, sendo um fator forte da subnotificação. É estarrecedor ver que profissionais, que deveriam exercer sua função no aparelho judiciário, seguem espalhando o “copiar/colar” retirado dos estudos científicos de sequelas causadas pelo abuso sexual. Tudo copiado. Nenhuma pesquisa, nenhuma honestidade em espalhar que alienação parental causa as mesmas sequelas estudadas e acompanhadas em crianças abusadas. A “play liste” é completa. A cegueira não é da figura da Justiça personificada em estátua, é de profissionais que não têm compromisso com a verdade nem, minimamente, com a saúde mental da Criança, e, depois deitam a cabeça no travesseiro sem remorso. A cópia dos sintomas e sequelas, que foram plagiadas de estudos consagrados de vítimas de abuso incestuoso, despreza o bom senso e adere ao absurdo. Propõe que um conflito entre os genitores terá repercussão corporal na Criança. É o sentimento de repulsa pelo corpo violado, sentido como sujo, errado, que produz os sintomas corporais, desde a alteração da autoestima até os distúrbios de autoagressão e suicídio. Esta é uma mentira que tem como objetivo despertar o fantasma da morte auto infligida. Nenhuma criança ou adolescente vai se matar porque a mãe fala mal do pai. Falta escrúpulo nessa afirmação sem eira nem beira. Nessa obsessão de oprimir Mulher/Mãe e Criança, com violência embutida em desqualificações a quem denuncia, a meta é promover por “programação pavloviana” o desmentido dos atos abusivos relatados. É de tal ordem essa obsessão por inocentar o agressor que a defesa do regime de guarda compartilhada é uma intransigência, mesmo que hajam provas dos atos libidinosos. E, diante da alcunha de “alienadora”, é ferrenha a exigência da guarda unilateral com afastamento total da Mãe, com se criminosa de alta periculosidade fosse. O genitor abusador não pode ser afastado do convívio, como é recomendado por profissionais sérios e honestos. Um estuprador, essa é a tipificação que deveria ser prevista na Lei, não é benéfico para o desenvolvimento de sua vítima. Mas esse lobby prescreve a atrocidade de manter a convivência, argumentando erradamente, que pai é pai, e que ele não vai mais fazer nada com a criança. Outra mentira. Faz e até mata. No entanto, o afastamento total da mãe é sempre sentenciado. Porque ela é “alienadora”. É a Privação Materna Judicial, tão estudada em psicopatologia infantil. Mas para esse grupo de profissionais, que se agregam em verdadeiras milícias intelectuais, usam pseudo conceitos embalados em ameaças executadas do alto de um Poder em autofagia. Genitor, mesmo predador, não pode ser afastado pela saúde mental da criança, não se sabe onde isto está escrito, mas a mãe, porque acreditou no que a criança contou, deve ser, totalmente, isolada. Se tomássemos essa terminologia, que não é científica, nem tem comprovação, diríamos que o pai não pode ser alienado, mas a mãe pode ser alienada pela justiça e pela sociedade que acata essa perversidade. Mentiras muitas, Escrúpulos nada.

terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Papai Noel e o Ano Novo Parte II

Papai Noel e o Ano Novo Parte II O Papai Noel acumula expectativa intensa nas Crianças. Durante um tempo da infância, ao se aproximar a data, pelo que apreendem nas publicidades, no que ouvem dos adultos, principalmente, no uso “educativo disciplinar” onde o bom comportamento se relaciona com o presente do Papai Noel, em discurso de merecimento, elas perguntam todos os dias se está chegando o Natal. Em contrapartida, pelo lado dos adultos, a tensão vai requentando antigas mágoas, ressentimentos, e, por vezes, desentendimentos ruidosos que ocorreram em outros Natais. Desde o sentimento infantil de que o presente do outro foi maior, até a disputa pela atenção da mamãe, já idosa e já necessitando de cuidados especiais, esquecendo muitas coisas, as queixas advêm de detalhes ou de restos afetivos que azedaram. Afinal, a vida em família é um caldeirão, em fogo baixinho, repleto de pedaços de emoções e sentimentos, os mais variados. Se para as Crianças a vontade é que chegue logo o Natal, a visita do Papai Noel, para os adultos, para muitos, o desejo é que fosse possível pular esse encontro da grande família. Ter que engolir a vontade de brigar com aquele irmão, ou aquele cunhado chatinho, a tia inconveniente, requer uma preparação de controle. O clima vai aquecendo com todas as comemorações de confraternização do encerramento do ano, que exigem o “estar feliz”. E o Papai Noel? Ele existe na infância de uma boa parte das Crianças. As religiões não cristãs não celebram o Natal, e a pobreza, e extrema pobreza, que somam um considerável contingente, excluem essa celebração por razões óbvias, por vezes tornando esse um ponto de revolta e sentimento de injustiça pela desigualdade vivida. Mas ele continua habitando o imaginário pela vida afora dos adultos. E não à toa, esta é uma necessidade psíquica para a manutenção da saúde mental. Nosso aparelho psíquico precisa desse recanto de fantasia para aliviar um pouco a dureza da realidade, além de ser o alimento para a criatividade que está tanto nas Artes quanto nas soluções de problemas matemáticos. O imaginário é o investidor maior dos sonhos, os factíveis e os impossíveis que embalam devaneios. Também necessários. O Papai Noel, o Super Homem, a Bruxa de João e Maria e a da Branca de Neve, o Homem Aranha, a Princesa Branca de Neve, a Mulher Maravilha, e, mais recentemente, os heróis e heroínas dos jogos eletrônicos, são figuras humanas, guardam sua humanicidade que convive com poderes sobre humanos. Esses heróis e heroínas, de bondade ou de bravura, são todos imersos em enredos de batalhas pelo certo, e levam todos, sem exceção, ao final feliz. Essa garantia do final feliz é responsável por grande parte do alívio buscado, o desejo fantasiado. A frustração e a impotência são insuportáveis em determinados momentos. É quando a mente traz uma dessas personas para aguentar as dores da frustração e da impotência diante de injustiças afetivas. O final feliz está intrínseco. Com essas figuras que habitam aquele recanto da infância, podemos lançar mão desses humanos com poderes, que anunciam uma proteção e satisfação de desejo idealizadas, e assim ter um tempo para sair do momento crítico da frustração. Esse mecanismo de defesa contra a exposição continuada e dura, que causa dor psíquica, é de grande valia para a manutenção da saúde psíquica. A capacidade de devaneio deve ser considerada como recurso constitutivo do perfil de cada um. Evidentemente, que como todos os itens psíquicos, está sujeita a critério quantitativo, ou seja, à porção que não atrapalhe a vida laboral, social e escolar. Este recurso aparece em ajuda e não como principal estado. Desde a infância, período em que não há um cerceamento muito rígido para a invasão do imaginário, esse escape para a fantasia tem uma medida que divide o razoável do patológico. Precisamos desse recanto do imaginário de final feliz, mas sob nossa administração saudável, sempre. Se o Papai Noel preenche a liste de desejo de brinquedos para as Crianças, ao Natal se segue a expectativa de final de ano que invade a mente dos adultos. A indução ao balanço do ano que termina, e aos planos de conserto geral no ano que vai se iniciar, acrescida da obrigatoriedade de um “estar feliz”, ocupa a mente neste período. É uma magia similar à figura do Papai Noel. Esse estado transitório de tensão provocada por avaliação do ano que está terminando e planos idealizados para o ano que se segue, muitas vezes leva a colapsos neste período. Faz-se necessário pensar que, para além de uma mudança de calendário, é despertado o incômodo do pensar a finitude, reflexão que é sempre evitada. Ter que expressar alegria e felicidade ao mesmo tempo que o tempo que passa e a finitude se impõem.

Papai Noel! Parte I

Papai Noel! Parte I Daremos essa pausa no tema da abundância das mentiras, incluindo as institucionais, para pensar um pouco sobre essa figura que faz parte da infância de todos, e que continua habitando a mente dos adultos. O fascínio por esta lenda, fantasia, desejo, é universal. Todos conhecemos a história do bom velhinho que passa o ano todo fabricando brinquedos para as crianças, e na noite da véspera do Natal, sai de sua casa nas longínquas montanhas nevadas, e pilotando seu veículo puxado por renas imponentes e dispostas, voadoras, vai entregando os brinquedos, invadindo docemente as casas pela chaminé, sem sujar nunca sua roupa, nem sua longa barba de um branco impecável. Não importa se moramos em apartamentos, se moramos em zonas tropicais onde inexistem as chaminés de lareiras, não importa se nunca vimos uma rena. A ideia do Papai Noel nos envolve em encantamento. Uma música indaga: “como é que Papai Noel não se esquece de ninguém, seja rico seja pobre o velhinho sempre vem”. Não é verdade. Essa figura existe para todas as crianças, mas muitas não ganham presente dele. Muitas. A desigualdade se encarrega de excluir da lista do bom velhinho milhares, milhões de crianças. Algumas ações sociais tentam amenizar essa frustração, promovendo distribuições que seguem outros critérios. As famosas cartinhas para o Papai Noel, que fazem parte do ritual para que os pais conheçam o brinquedo desejado, em sua forma de adoção, as cartinhas endereçadas aos Correios, vêm nos surpreendendo com o pedido. Além da boneca, da bicicleta, começam a aparecer pedidos que contrariam o vetor de ser criança e pedem o remédio que a mãe precisa tomar, ou a peruca para a mãe cobrir a queda total de cabelos após uma quimioterapia, ou outra “tia” para substituir aquela que toma conta dele e o maltrata. Pedidos que denunciam nosso fracasso como sociedade em se tratando de Direitos Fundamentais. A injustiça vivida precocemente. Mas, hoje, quero me debruçar sobre a figura imaginária do Papai Noel. Entendo que opiniões divergem sobre benefícios e malefícios. Dizem alguns que é contar uma mentira para a criança, desconsiderando que os contos de fada e historinhas de heróis infantis, fazem parte da infância de um jeito ou de outro. Faz-se necessário pensar que alimentar o imaginário da criança é fundamental para seu pleno desenvolvimento afetivo, cognitivo e social. Todas as figuras imaginárias, as antigas, as culturais e as regionais, as atuais, elas abrem o campo das possibilidades, em fantasia, de perigo, de conquista, de competitividade saudável, de amizade, de proteção, passam ensinamentos que a linguagem verbal de regras não consegue alcançar a mesma dimensão. É um constante aprendizado. Vale ressaltar que esse alimento do imaginário é responsável pela criatividade e pela resolução de problemas na vida adulta. Descobrir que Papai Noel não existe, que é o pai ou a mãe, uma avó ou um avô, que colocam escondido aquele presente desejado na árvore de Natal, não se constitui fato traumático. A Criança vive essa descoberta como uma conquista, como ganhando um jogo entre ela e seus pais, e se orgulha de sua descoberta. Não há mágoa nem rancor, não se sente lesado. Ao contrário, se sente mais próximo do mundo dos adultos, crescendo. Gostaria de compartilhar um pouco de minhas lembranças afetivas do Natal. Em Recife, havia uma grande loja de departamento, acho que Souza Leal, que tinha um andar de brinquedos. E um Papai Noel recebendo as crianças e suas cartinhas. Não tinha sessão de fotos, as fotos, nítidas até hoje, estão na minha memória. Ainda não sabia escrever muita coisa, e menos ainda meus irmãos menores. Por isso pedíamos a ajuda da nossa mãe. Só minha irmã, 6 anos mais velha, que não queria nunca escrever. Um dia perto do Natal íamos levar as cartinhas para ele. Na véspera de Natal, crianças de roupa nova especial para a ocasião, íamos cedo da noite ver a decoração do centro de Recife. Cortada por dois rios, a cidade fazia pequenas árvores de luzes coloridas simples que boiavam nos rios e podiam ser vistas das pontes em sua multiplicação de luzes refletidas, era lindo! Sempre perguntava, às vezes à minha mãe, às vezes ao meu pai, como o moço que colocou as lâmpadas não tomou um choque. Ouvia a explicação, mas no ano seguinte repetia a pergunta. Mas antes da pergunta e do encantamento pelo espetáculo, era um verdadeiro espetáculo para mim, todos os anos, quando estávamos no portão da casa, minha mãe pedia para meu pai verificar se a janela de um dos quartos tinha ficado aberta, e meu pai entrava sozinho na casa por alguns minutos. Voltava dizendo que estava tudo certo. Uma dessas noites, ali, esperando, me dei conta que havia um combinado nessa tal janela aberta, igual todos os anos. E descobri, em silêncio, que meu pai entrava para colocar nossos presentes na árvore. Tenho nítido também esse momento, como uma fotografia de alta resolução. No ano seguinte não quis mais escrever a cartinha. Pedi diretamente para o meu Papai Noel. Feliz Natal a todos! Em especial às crianças que não têm Papai Noel, só o veem ao longe nas decorações e nas publicidades de consumo. Esta é uma inclusão necessária. E vida longa para o Papai Noel!

Mentiras em abundância, Escrúpulos em escassez. Parte I

Mentiras em abundância, Escrúpulos em escassez. Parte I Poderíamos trocar Mentiras por Inverdades, ou por Desinformação, termo que entrou no vocabulário do nosso cotidiano. Mas, a mim me parece que, além de suavizar semanticamente, suaviza em sua intensidade proposital. São Mentiras. Apelidos que têm na confusão seu veículo de acobertamento de crimes contra a Criança. Sem nenhum escrúpulo são exibidos ditos que não possuem nem mesmo o senso comum, o conhecimento popular, quiçá algum conhecimento científico. Esse, passa muito longe quando são presumidas afirmações infundadas. Como sabemos, a mentira é a grande estrela de nosso tempo. Então vemos profissionais se infiltrarem em área de conhecimento que não tem conhecimento, sem, sequer, a autoridade necessária. Facilmente, escorregam com distorções transformando presunções em afirmações dogmáticas sem nenhuma fundamentação científica. Há alguns dias encontrei uma publicação de profissionais da área da saúde mental, que deviam prezar pela SAÚDE MENTAL, afirmando doenças mentais “femininas”. Como pode? Os páthos não têm gênero. Excetuando-se, é claro, o aparelho sexual e reprodutor, todas as situações de adoecimento de algum órgão ou sistema, não seguem o gênero do portador, portanto não devem estar submetidos à misoginia. Então encontramos afirmações que misturam sem critério alterações por reação emocional e doenças mentais, o quadro psicopatológico borderline, atribuídos, falsamente, à mulher para fazer um link com um perfil feminino perverso e vingativo contra o pobre ex que é inocentado até quando há materialidade de seus crimes. Assim também espalham que crianças são todas mentirosas, ou robôs bobos, dominados pela mente perversa de uma mãe taxada de “alienadora”, termo que não tem fundamento científico. Essa é uma mentira que também se espalhou, desprovida de escrúpulos técnico e teórico, sem nenhum constrangimento ético cabível. Se a criança sofre da falta de filtro social, se ela expõe a verdade em qualquer momento, ou lugar, e quanto menor, mais “sincerismo” explícito fala, como pode que ela tenha suas lembranças mnêmicas manipuladas para fabricar uma falsificação, aliás nunca provada cientificamente? E o Poder dessa mãe é tão poderoso, (pleonasmo proposital da autora), que essa criança fala verbalmente, com detalhes que não tem capacidade cognitiva de arquivar, fala pelos desenhos, fala pela brincadeira com bonecos. Mas nada disso é considerado. E a indução aos agentes de justiça é a desqualificação de suas lembranças mnêmicas de dores e sofrimentos que são atropelados e esmagados para que um criminoso seja acobertado e legitimado no cometimento dos crimes contra a criança. Ele ainda ganha de brinde a criança, e a mãe é subtraída de sua vida, taxada de alta periculosidade. Para os lobistas dessa ideologia, que formam uma espécie de milícia técnica psicológica, o negacionismo garante falsas soluções que promovem a Privação Materna Judicial com todas as suas sequelas permanentes, uma equação do abandono materno, desastre humano tão conhecido, e que causa tanta repulsa em todos nós. Mas a “alienadora” é obrigada pelo Estado a praticar o abandono do filho, da filha, que pediu sua proteção ao denunciar o genitor criminoso. Quanto ódio à mulher. Quanto ódio à maternidade. Não por acaso temos um aumento vertiginoso dos números de Feminicídio. Medidas Protetivas, estão em grande parte das histórias de homens que não se conformaram com o término do relacionamento. E matam. O maior percentual dos Feminicídios é cometido na frente das crianças, filhas daquele assassino. Mas temos que conviver com posturas jurídicas que defendem agressores dizendo que aquele homem que espanca a mulher pode ser um mau marido, mas é um bom pai. Não conseguimos realizar essa mágica. Espancar a mãe dos filhos, na presença física ou observada dos filhos. O Feminicídio não começa por ele. Começa pelas agressões psicológicas, passa para os empurrões e tapas, depois para o olho roxo e as costelas quebradas. Mas quando a Mulher vai buscar a proteção prometida pela lei, ela tem, sistematicamente, negada a Medida Protetiva para os filhos, e muitas vezes negada para ela também. Não podemos esquecer que a Medida Protetiva não protege. Outra mentira. Se a mãe vai ser obrigada a aceitar até o ex em sua casa para cumprir a tal guarda compartilhada, com a guilhotina armada da alegação de praticar atos alienadores, e ter a inversão da guarda para unilateral beneficiando o genitor. Além disso, a Medida Protetiva não é obedecida por muitos e muitos homens, e o cansaço produzido por processos sequenciados contra ela, associado ao medo de ser taxada de alienadora, faz com que ela não recorra às Instituições que deveriam promover a Lei. E o Parlamento espalha mentiras também. O PL votado que foi alardeado como uma punição a pedófilos, uma castração química é ouro de tolo. Parte de uma ilusão de que o pedófilo é alguém hiperssexualizado. Mentira. Essa é uma conduta que busca o Prazer do Poder absoluto. O Prazer sexual para o pedófilo é pouco importante para ele. Enquanto ficarmos promovendo enganações, estaremos aumentando a área de atuação desses criminosos. A castração química, que tem sua execução inconstitucional, serviria de álibi para os criminosos porque não soluciona a pedofilia. A menos que fosse acompanhada de uma série de amputações, começando pela lobotomia. Método de violência mais do que fascista. Enfim, sobram mentiras, faltam escrúpulos.

Quando começamos a pensar sobre a morte? Parte III

Quando começamos a pensar sobre a morte? Parte III Nenhum desenho animado, nenhum joguinho de matança, nenhum relato verbal de um adulto, é capaz de imprimir o impacto traumático de ver a morte ser executada ao vivo, aos gritos, e a cores. Estou me referindo à presença da criança na cena do crime. O processo de aquisição da Noção de Irreversibilidade é gradativo e passa por várias “provas”, como se um experimento científico fosse. O desenvolvimento cognitivo se processa com rigores de regras científicas, na observância de muitas repetições para que as deduções do raciocínio sejam confiáveis para a criança. E tudo dentro de ambiência, totalmente, concreto, tudo experiencial. Assim também a Noção de Irreversibilidade que é o cerne da Noção de Morte por excelência, porquanto a morte é o único fenômeno irreversível, por completo e essência. A morte é a única certeza que temos na vida, e que, mesmo assim, permanece desconhecida. A angústia gerada por ela é insolúvel, e nos acompanha ao longo da vida até que ela chegue. Mas, raramente, ela tem espaço psíquico na mente de uma criança. Por isso, quando ela acontece diante da criança, ela assume seu traço de concretude e causa grande estrago. Quando fizemos a manifestação nas areias de Copacabana, em março, por ocasião do Dia Internacional da Mulher e a repetimos, recentemente, durante o G20, quisemos comunicar a violência por assassinato de Mulheres/Mães e de Crianças, dentro do contexto definido como “familiar”. Homenagear vítimas da fúria, quase sempre impune, do que é uma vergonha, um comportamento sub-animal, mas cada vez mais banal. E as Medidas Protetivas, previstas na Lei Maria da Penha, são cada vez mais negadas com justificações pífias do judiciário. As Medidas Protetivas para as Crianças são mais raras ainda, sob a alegação de que “o pai tem Direito”. E o Direito da criança à vida? As penúltimas estatísticas apontavam para 4 Feminicídios por dia no nosso país. No entanto, o último Relatório da ONU sobre esse tema, fala de 1 mulher a cada 10 minutos sendo assassinada. Voltando para nosso quadrado, cerca de 70% desses Feminicídios acomete mães, e ocorre dentro de casa, ou no ambiente familiar. Ou seja, os filhos crianças assistem o genitor assassinar a mãe. Escutam os gritos dela, constatam a fúria daquele “pai”, veem o sangue da mãe, até que ela fica inerte. Foi assim com o João Vitor na chacina de Campinas, num Reveillon, foi assim com as 3 filhas da Juíza Viviane Amaral no Natal. João Vitor foi obrigado pelo genitor, que matou 9 mulheres da família da ex-mulher, a assistir a morte da mãe, e depois foi morto também. A Juíza Viviane estava entregando as 3 filhas por exigência do genitor, fora da data de visitação, por medo de ser acusada de ser mais uma “alienadora”, essa emboscada sem saída, e o genitor das meninas desferiu 16 facadas ali mesmo na entrega das crianças. Qual a dimensão do trauma causado por essa vivência, não sabemos. Como se inscreve essa crueza na mente de crianças, não temos conhecimento, posto que caem em segredo de justiça. Justiça que não tem compromisso em acompanhar, em proteger crianças que passam por esse tipo de violência. Podemos apenas levantar hipóteses sobre os danos irreversíveis, assim como a morte, que precisavam ser estudados para que fossem evitados. Essas não são situação pontuais, ou de exceção, como negacionistas da responsabilidade tentam se esquivar. Existem também os assassinatos de crianças para “matar” a mãe. Quantos meninos e meninas já foram mortos com requintes de crueldade, violência endereçada à mãe. Os irmãos Lucas e Mariah, Joanna Marcenal, os 4 irmãos Antares, são algumas vítimas dessa barbárie, que fica impune. Os processos não evoluem, nem as investigações iniciais vão adiante. Existe genitor que 14 anos depois ainda não foi a julgamento. Acrescente-se a essa conivência de todos, todos, o calvário que muitas crianças percorrem por anos, sendo vistas em serviços médicos, tendo alguém que denuncia no Conselho Tutelar e outros órgãos que deveriam cuidar da Proteção Integral da Criança, e que são negligentes, irresponsáveis, chegando a inverter o que está sendo denunciado para terminar laudos fraudulentos com uma convicção, que não se sabe de onde foi tirada, que é mentira da mãe, é mentira da criança. Paloma, 7 meses, morreu na 9ª entrada em serviço de emergência pediátrica com traumatismo craniano, já tinha fraturado costelas e braço. Sophia, 2 anos fez 31 entradas em emergência pediátrica, tinha sinais evidentes de espancamento e de abuso sexual. Henry, passou por Hospital Pediátrico 2 meses antes de ser morto por espancamento. Joanna, também, foi atendida em Hospital, por um estudante de 1º período de medicina, com letargia e várias marcas pelo corpo e nem foi examinada, vindo a óbito alguns dias depois. A grade de disciplinas nas Faculdades de Medicina não inclui o conhecimento da identificação de sinais e evidências de que a criança está sofrendo violência física ou sexual. Limitam-se a dar noções superficiais e viciadas em torno da presença do hímen, como se isso fosse o único ponto a ser observado, e fica restrito à Medicina Legal. As crianças abusadas e espancadas passam em mãos médicas que nada reparam. E a noção de morte chega para um grande número de crianças com uma concretude insuportável para elas. A morte sentida em toda a sua amplitude. Não pensada. O segredo de justiça protege o predador e a criança que denuncia o genitor será punida, garantindo a invisibilidade delas vitimadas pela violência pela pedofilia, pela barbárie. Numerosos Feminicídios são vividos brutalmente. A morte entra em sua mente de maneira traumática, quando assistem a mãe ser morta pelo “pai”.

Quando começamos a pensar sobre a morte? Parte II

Quando começamos a pensar sobre a morte? Parte II É um cemitério! E logo completou: cemitério de crianças porque tem balões. Era um menino de 8 ou 9 anos, curioso, foi ali na areia e chegou perto das cruzes, leu alguns nomes e correu até a mãe que ficou mais de longe. Noticiando para ela o que apurou, foi embora. Impressionante como entendeu, tão rapidamente, nossa manifestação. Buscávamos denunciar os infanticídios motivados pela violência doméstica, e os consequentes feminicídios. O garoto se concentrou na morte das crianças e não reparou que havia mulheres também entre as cruzes. Talvez porque, para a criança, adultos “podem” morrer. Estávamos sujando a paisagem. Estávamos melando o clima quase carnavalesco que reinava no calçadão de Copacabana, em frente ao Hotel mais tradicional, bonito e famoso. Mas aquelas crianças, violadas em seus corpinhos, tinham sido assassinadas, com requintes de crueldade, pelos seus genitores. Já haviam sujado a sociedade. Não fomos nós. Mas as criptomnésias do Estado e de seus agentes tratam de ocultar, de fraudar a realidade. Quanta turbulência! Quanta animação! A cidade pulsando como em dias das grandes festas comunitárias! O G-20, composto por 20 países de economias pujantes, e que se tornou 21, informalmente, com o aceite de mais um país da África, se propôs a discutir questões muito importantes. Os Chefes de Estado pautaram a fome, as mudanças climáticas, a economia, a preservação do ambiente, etc, temas que dizem respeito à sobrevivência da humanidade. No “Comuniquê”, entregue ao Presidente da República, um único item sobre a necessidade de Proteção da criança. Parece-me muito pouco. Se ainda somos uma sociedade que mata mulheres, 1 a cada 6 horas, e crianças, não sabemos quantas por dia, um único quesito é muito pouco. Na última semana tentamos expor como funciona nosso aparelho cognitivo, a aquisição da noção de irreversibilidade para que possamos começar a pensar sobre a única certeza que temos, a morte. Não queremos nunca pensar nela, como se fôssemos acometidos da fantasia de que se pensarmos, e pior, se falarmos dela, ela virá. Para a criança o pensar a morte vem sempre envolto em tentativas de garantias. A irreversibilidade é dolorosa. Até então tudo podia ser “desfeito”, voltar ao estado anterior. Não poder consertar, encarar o fim de alguma coisa muito querida é muito difícil para a criança. Por isso ela vai fazendo arranjos na tentativa de não se submeter ao finito. Entre essas tentativas, a criança se consola pensando que a mãe, o pai, que são as figuras mais importantes para ela, só vão morrer quando estiverem bem velhinhos, só com 100 anos! Nessas tentativas de amenizar a dor da finitude, não cabe a morte de criança, uma pessoa como ela, porque isso traz para ela a finitude tão temida. Para a criança, criança não morre. Não há espaço mental para pensar isso. Aquele menino entendeu que eram crianças mortas. Talvez não tenha alcançado que tinham sido assassinadas pelos seus pais, é muito demais. Mas capturou a mensagem. As cruzes juntas formavam um cemitério. É para onde vão os mortos, já aprendeu. E os balões presos às cruzes, balões são imagens de aniversário das crianças, então os mortos eram crianças. Nossas crianças têm sido obrigadas a conviver com as mortes de outras crianças em volume insuportável para elas. As crianças perdem colegas da escola, vizinhos de casas ao lado, primos dentro de casa, e até dentro do quarto, e amigos da escolinha de futebol, que são achados pelas balas perdidas dos fuzis. A morte brutal com ferimento sangrento vem sendo banalizada a cada dia. Para a criança, pensar a morte precisa ser distante para que seja saudável e ajude no crescimento cognitivo, no processo de aceitação da finitude, da irreversibilidade. Ou seja, é necessário que essa aquisição se faça com uma morte que envolva pouco afeto. De preferência. E que seja alguém que já viveu muitos anos, muita coisa. Quando a mente da criança é invadida por uma morte de muito afeto, de muita proximidade, ela não está, minimamente, preparada para a perda. Frequentemente, isso se constitui como traumático, um excesso de emoção que não tem lugar psíquico para se alojar. E assim passa a ser uma “martelada” que vai provocar comportamentos de fuga, de negação, embebidos em muito medo, nem sempre aparente. O medo da morte é a ponta da angústia da impotência que nos acompanha pela vida toda. Contra ela, nada podemos, nada sabemos.